FACULDADE DE TEOLOGIA
TESTEMUNHAS HOJE
CURSO LIVRE
O
nosso assunto é o estudo introdutório e auxiliar das Sagradas Escrituras, para
sua melhor compreensão. É também chamado Isagoge nos cursos superiores de Teologia.
Este estudo auxilia grandemente a compreensão dos fatos da Bíblia. Um ponto
saliente nele é a história de como a Bíblia chegou até nós. A necessidade desse
estudo é que, sendo a Bíblia um livro divino, veio a nós por canais humanos,
tornando-se, assim, divino-humano, como também o é a Palavra Viva: Cristo, que
se tornou também divino-humano (Jo 1.1; Ap 19.13).
Através
da Bíblia, Deus se revela em linguagem humana, para que o homem possa
entendê-lo. Por essa razão, a Bíblia faz alusão a tudo que é terreno e humano.
Ela menciona países, montanhas, rios, desertos, mares, climas, solos, estradas,
plantas, produtos, minérios, comércio, dinheiro, línguas, raças, usos,
costumes, culturas etc. Isto é, Deus, para fazer-se compreender, vestiu a
Bíblia da nossa linguagem, adaptando-a ao modo humano de perceber as coisas.
A
Bíblia é, sem dúvida, um dos mais apreciados legados literários da humanidade.
Contudo o seu valor não se firma de maneira substancial no fato literário. A
riqueza da Bíblia consiste no caráter essencialmente religioso da sua mensagem,
que a transforma no livro sagrado por excelência, tanto para o povo de Israel
quanto para a Igreja cristã. Nessa coleção de livros, a Lei se apresenta como
uma ordenação divina (Êx 20; Sl 119), os Profetas têm a consciência de serem
portadores de mensagens da parte de
Deus (Is 6; Jr 1.2; Ez 2-3) os Escritos ensinam que a verdadeira
sabedoria encontra em Deus a sua origem (Pv 8.22-31).
Esses
valores religiosos aparecem não só no título de Sagradas Escrituras, mas também
na forma que Jesus e, em geral, os autores do Novo Testamento se referem ao
Antigo, isto é, aos textos bíblicos escritos em épocas precedentes. Isso
ocorre, por exemplo, quando lemos que Deus fala por meio dos profetas ou por
meio de algum dos outros livros (Mt 1.22; 2.15; Rm 1.2; 1Co 9.9) ou quando os
profetas aparecem como aquelas pessoas mediante as quais “se diz” algo ou “se
anuncia” algum acontecimento, forma hebraica de expressar que é o próprio Deus
quem diz ou anuncia (Mt 2.17; 3.3; 4.14); também quando se afirma a permanente
autoridade das Escrituras (Mt 5.17-18; Jo 10.35; At 23.5), ou quando as
relaciona especialmente com a ação do Espírito Santo (At 1.16; 28.25). Formas
magistrais de expressar a convicção comum a todos os cristãos em relação ao
valor das Escrituras são encontradas em passagens como 2Tm 3.15-17 e 2Pe
1.19-21.
A
Igreja cristã, desde as suas origens, tem descoberto na mensagem do evangelho o
mesmo valor da palavra de Deus e a mesma autoridade do Antigo Testamento (Mc
16.15-16; Lc 1.1-4; Jo 20.31; 1Ts 2.13), por isso, em 2Pe 3.16, se equiparam as
epístolas de “nosso amado irmão Paulo” (v.15) às “demais Escrituras”.
Gradativamente, a partir do século II d.C., foram sendo reconhecidos os 27
livros que formam o Novo Testamento a sua categoria de livros sagrados e, em
conseqüência, a plenitude da sua autoridade definitiva e o seu valor religioso.
Tal
reconhecimento, que implica o próprio tempo da presença, direção e inspiração
do Espírito Santo na formação das Escrituras, não descarta, em absoluto, a
atividade física e criativa das pessoas que redigiram os textos. Elas mesmas se
referem a essa atividade em diversas ocasiões (Ec 1.13; Lc 1.1-4; 1Co
15.1-3,11; Gl 6.11). A presença de numerosos autores materiais é, precisamente,
a causa da extraordinária riqueza de línguas, estilos, gêneros literários,
conceitos culturais o reflexões teológicas que caracterizam a Bíblia.
A
expressão “a palavra de Deus” (também “a palavra do Senhor”, ou simplesmente “a
palavra”) possui várias aplicações na Bíblia. Obviamente, refere-se, em
primeiro lugar, a tudo quanto Deus tem falado diretamente. Quando Deus falou a
Adão e Eva (Gn 2.16,17; Gn 3.9-19), o que Ele lhes disse era, de fato, a
palavra de Deus. De modo semelhante, Ele se dirigiu a Abraão (Gn 12.1-3), a
Isaque (Gn 26.1-5), a Jacó (Gn 28.13-15) e a Moisés (Êx 3-4). Deus também falou
à totalidade da nação de Israel, no monte Sinai, ao proclamar-lhe os dez
mandamentos (Êx 20.1-19). As palavras que os israelitas ouviram eram palavras
de Deus.
Além
da fala direta, Deus ainda falou através dos profetas. Quando eles se dirigiam
ao povo de Deus, assim introduziam as suas declarações: “Assim diz o Senhor”,
ou “Veio a mim a palavra do Senhor”. Quando, portanto, os israelitas ouviam as
palavras do profeta, ouviam, na verdade, a palavra de Deus.
A
mesma coisa pode ser dita a respeito do que os apóstolos falaram no Novo
Testamento. Embora não introduzissem suas palavras com a expressão “assim diz o
Senhor”, o que falavam e proclamavam era, verdadeiramente, a palavra de Deus. O
sermão de Paulo ao povo de Antioquia da Pisídia (At 13.14-41), por exemplo,
criou tamanha comoção que, “no sábado seguinte, ajuntou-se quase toda a cidade
a ouvir a palavra de Deus” (At 13.44). O próprio Paulo assegurou aos Tessalonicenses
que, “havendo recebido de nós a palavra da pregação de Deus, a recebestes, não
como palavra de homens, mas (segundo é, na verdade) como palavra de Deus” (1Ts
2.13; At 8.25).
Além
disso, tudo quanto Jesus falava era palavra de Deus, pois Ele, antes de tudo, é
Deus (Jo 1.1,18; 10.30; 1Jo 5.20). Lucas, escritor do terceiro
evangelho, declara explicitamente
que, quando as pessoas ouviam a Jesus, ouviam na verdade a palavra de Deus (Lc
5.1). Note como, em contraste com os profetas do ANTIGO TESTAMENTO, Jesus
introduzia seus ditos: Eu “vos digo...” (Mt 5.18, 20, 22, 23, 32, 39; 11.22,
24; Mc 9.1; 10.15; Lc 10.12; 12.4; Jo 5.19; 6.26; 8.34). Noutras palavras, Ele
tinha dentro de si mesmo a autoridade divina para falar a palavra de Deus. É
tão importante ouvir as palavras de Jesus, pois “quem ouve a minha palavra e
crê naquele que me enviou tem a vida eterna e não entrará em condenação” (Jo
5.24). Jesus, na realidade, está tão estreitamente identificado com a palavra
de Deus que é chamado “o Verbo” [“a Palavra”] (Jo 1.1,14; 1Jo 1.1; Ap 19.13-16;
Jo 1.1). A palavra de Deus é o registro do que os profetas, apóstolos e Jesus
falaram, isto é, a própria Bíblia. No Novo Testamento, quer um escritor usasse
a expressão “Moisés disse”, “Davi disse”, “o Espírito Santo diz”, ou “Deus
diz”, nenhuma diferença fazia (At 3.22; Rm 10.5, 19; Hb 3.7; 4.7); pois o que
estava escrito na Bíblia era, sem dúvida alguma, a palavra de Deus.
Mesmo
não estando no mesmo nível das Escrituras, a proclamação feita pelos autênticos
pregadores ou profetas, na igreja de hoje, pode ser chamada a palavra de Deus.
Pedro indicou que, a palavra que seus leitores recebiam mediante a pregação,
era palavra de Deus (1Pe 1.25), e Paulo mandou Timóteo “pregar a Palavra” (2Tm
4.2). A pregação, porém, não pode existir independentemente da Palavra de Deus.
Na realidade, o teste para se determinar se a palavra de Deus está sendo
proclamada num sermão, ou mensagem, é se ela corresponde exatamente à Palavra
de Deus escrita.
O
que se diz de uma pessoa que recebe uma profecia, ou revelação, no âmbito do
culto de adoração (1Co 14.26-32)? Ela está recebendo, ou não, a palavra de
Deus? A resposta é um “sim”. Paulo assevera que semelhantes mensagens estão
sujeitas à avaliação por outros profetas. Todavia, há a possibilidade de tais
profecias não serem palavra de Deus (1Co 14.29 “E falem dois ou três profetas,
e os outros julguem”). É somente em sentido secundário que os profetas, hoje,
falam sob a inspiração do Espírito Santo; sua revelação jamais deve ser elevada
à categoria da inerrância (1Co 14.3).
1 - A BÍBLIA - ORIGEM E VOCÁBULOS
1.1
Origem da Escrita
Tem sido difícil determinar
com exatidão, onde, como e quando a escrita teve a sua origem. A escrita se
originou quando o ser humano sentiu a necessidade de guardar seus feitos para
que a posteridade os conhecesse. A escrita primitiva foi pictográfica onde
figuras representavam objetos. Logo a seguir aparece a ideográfica, assim
chamada pelo fato das figuras representarem idéias. Num terceiro estágio
aparece o fonograma – figuras representando sons. Dos povos antigos, os dois
que mais se destacaram, no desenvolvimento da escrita, foram os babilônicos e
os egípcios. Cada um destes teve a sua destacada e particular escrita: os
babilônicos criaram a escrita cuneiforme, assim denominada por consistir de
pequenas cunhas, feitas especialmente em pedras; enquanto os egípcios usavam
pequenas figuras para representar objetos e idéias, os famosos hieróglifos. A
história nos relata que a decifração dessas escritas exigiu muito esforço e
concentração. A escrita cuneiforme foi decifrada pelo oficial inglês Henrique
Rawlinson, após 18 anos de labores intensos. Quanto à escrita hieroglífica,
todos sabem, que foi Champollion, o notável egiptólogo francês, o primeiro a
desvendar-lhe os mistérios.
1.1.1
A Escrita Cuneiforme
A princípio, certa espécie
de marca representava uma palavra inteira, ou uma combinação de palavras.
Desenvolvendo-se a arte de escrever, passou a haver 'marcas' que representavam
partes de palavras, ou sílabas. Era este o gênero de escrita em uso na
Babilônia no alvorecer do período histórico. Havia mais de 500 marcas
diferentes, com umas 30.000 combinações. Geralmente, essas marcas se faziam em
tijolos ou placas de barro macio (úmido), medindo de 2 a 50 centímetros de
comprimento, uns dois terços de largura, e escritos de ambos os lados; depois
eram secados ao sol ou cozidos no forno. Por meio dessas inscrições
cuneiformes, em placas de barro, é que chegou até nós a vasta literatura dos
primitivos babilônios.
1.1.2
Origem do Alfabeto
Tem sido um assunto bastante
controvertido a origem do alfabeto. Em geral se aceita que o alfabeto de 22
letras foi inventado pelos fenícios e por eles levado aos gregos e depois aos
latinos. Até há pouco afirmava-se que a descoberta do alfabeto tinha sido pelos
séculos XII ou XI a.C., sendo este argumento apresentado para provar que Moisés
não podia ter escrito o Pentateuco, visto que em seu tempo não tinham ainda
inventado a arte de escrever.
Ira M. Price no livro The
Ancestry of Our English Bible, p. 13, escreveu: "A escrita é muito antiga
na Palestina [...] O trabalho dos arqueólogos nos mostra muitos exemplos de
escrita antes de Moisés". Escavações arqueológicas em Ur têm provado que
Abraão era cidadão de uma metrópole altamente civilizada. Nas escolas de Ur os
meninos aprendiam leitura, escrita, aritmética e geografia.
Três alfabetos foram
descobertos: junto do Sinai, em Biblos e em Ras Shamra , que são bem
anteriores ao tempo de Moisés (1.500
a .C.). Estudiosos modernos, baseados em evidências
irrefutáveis, sustentam que Moisés escolheu a escrita fonética para escrever o
Pentateuco. O arqueólogo W. F. Albright datou esta escrita de início do século
XV a.C. (tempo de Moisés). Interessante é notar que esta escrita foi encontrada
no lugar onde Moisés recebeu a incumbência de escrever seus livros. Em Êxodo
17.14 encontramos a ordem divina para que Moisés escrevesse num livro.
Note-se ainda a frase de
Merril Unger sobre a escrita do Antigo Testamento: "A coisa importante é
que Deus tinha uma língua alfabética simples, pronta para registrar a divina
revelação, em vez do difícil e incômodo cuneiforme de Babilônia e Assíria, ou o
complexo hieróglifo do Egito". Sobre o problema de Moisés ter escrito ou
não seus livros vale acrescentar o que escreveu o Dr. Renato Oberg: "Os
primeiros livros da Bíblia a serem escritos foram os que compõem o Pentateuco e
o de Jó, sendo a autoria deles atribuída a Moisés pela tradição judaica que,
por sua vez, é aceita sem contestação por grande número de cristãos. O Talmude
Babilônico afirma que 'Moisés escreveu o seu próprio livro e as passagens e
respeito de Balaão e Jó' (SDABC, vol. III, p. 493).
Como vimos, nem todos
aceitam Moisés como sendo o real autor destes livros, especialmente o de Jó. Os
que o fazem, dão Jó como tendo sido o primeiro dos livros escritos, e Moisés o
teria feito quando pastoreava os rebanhos do seu sogro nas campinas de Midiã,
após ter fugido do Egito. Os cinco livros que compõem o Pentateuco foram escritos
posteriormente. Os que não aceitam esta tese, já escreveram muito a respeito do
assunto, procurando arrazoar com argumentos os mais variados, inclusive a
diferença de estilo entre os livros e até dentro de cada um deles.
Um dos argumentos mais
fortes, porém senão o mais forte de todos, foi o que começou a dominar desde o
fim do último quartel do século passado, quando Wellhausen, professor da
Universidade de Greifswald, chegou a afirmar que se fosse tão-somente possível
saber que Moisés pudesse escrever, seria ridículo não aceitá-lo.
Evidentemente, segundo tudo o que se
conhecia até então, quando as primeiras grandes descobertas arqueológicas
começaram a empolgar o mundo e quando se dizia que tudo tem de ser decidido
pela razão, tinha-se como certo que a invenção do nosso alfabeto se devia aos
fenícios que o tinham criado no afã de facilitar suas transações comerciais
pelo mundo todo. Foi então que a decifração dos hieróglifos feita por
Champollion revelou o conteúdo de uma série enorme de documentos com sinais
tidos por muitos como decoração e misticismo religioso, e cujo conteúdo era,
até então, desconhecido completamente. Ora sendo o alfabeto inventado pelos
fenícios, cuja existência foi bem posterior à de Moisés, e se as escritas
anteriores, hieróglifos e cuneiformes, foram apenas decifradas no século
passado, como poderia Moisés ter escrito aqueles livros? Se o tivesse feito, só
o poderia fazer em hieróglifos, língua na qual a própria Bíblia diz que Moisés
era perito (Atos 7.22) e, neste caso ela, a Bíblia do Velho Testamento, teria
ficado desconhecida por nós até Champollion! Daí a frase de Wellhausen.
Acontece, porém, que no
princípio do século XX ou, mais precisamente, nos anos de 1904 e 1905, Sir
Flinders Petrie, fazendo escavações na Península do Sinai, patrocinadas pela
Escola Britânica de Arqueologia no Egito, descobriu algumas inscrições muito
diferentes do cuneiforme mas, embora aparentassem alguma semelhança com o
hieróglifo, não o eram, em
absoluto. O caso despertou enorme interesse entre os que
cuidavam do assunto, especialmente quando começaram a aparecer mais vasos e
óstracos (cacos de vasos com inscrições) portadores de sinais idênticos, em
outros lugares na Palestina. Para encurtar a história, os estudos que
arqueólogos famosos como, inclusive, W. F. Allbright fizeram, elucidaram
completamente o caso e hoje se sabe perfeitamente que os sinais descobertos por
Flinders Petrie pertencem à escrita chamada de proto-fenícia, proto-sinaítica
ou cananita e [...] era alfabética! Com esta descoberta, a origem do nosso
alfabeto se transportava da época dos fenícios para a dos seus antecessores,
séculos antes, os cananitas que viveram no tempo de Moisés e antes dele. Foram
estes antepassados dos Fenícios que simplificaram a escrita, passando a usar o alfabeto
em lugar dos hieróglifos, isto é, sinais que representam sons ao invés de
sinais que representam idéias. Para nós, porém, assume importância igualmente
grande o fato de estes cananitas, inventores da escrita alfabética, serem
justamente os da região onde Moisés pastoreava as ovelhas do seu sogro. Convém,
portanto que os conheçamos um pouco mais.
A partir da XII dinastia, os
egípcios começaram a explorar as minas de cobre e turquesa da região do Sinai,
e uma das maiores delas ficava em Serabitel-Khaden, acerca de oitenta
quilômetros do tradicional Monte Sinai, onde foram dados os Dez Mandamentos. Em
termos de jornada, esta região distava cerca de três dias de viagem do Egito.
Neste local trabalhavam para os egípcios muitos semitas que praticavam uma religião
muito semelhante à dos israelitas, tal como pôde ser observado pelos restos
deixados por eles e descobertos pelos arqueólogos. Esta região era a mesma
naquele tempo conhecida também pelo nome de 'Terra de Midiã', para onde Moisés
fugiu da presença de Deus (Êx 2.15). Com estas descobertas, perderam sua razão
de ser muitos dos argumentos contrários à Bíblia feitos pela Crítica Histórica,
porque se verificou que a história bíblica daquele período passou a ser
perfeitamente compreensível dentro dos costumes da época, inclusive a boa
convivência de Moisés com o sacerdote Jetro, cujas religiões eram
fundamentalmente as mesmas.
Ora vivendo Moisés quarenta
anos nesta região, é óbvio que tomou contato com a escrita rude daquele povo,
viu nela a escrita do futuro e passou a usá-la por duas grandes razões que
teria julgado decisivas: a primeira foi a impressão grandiosa que teve de usar
uma língua alfabética para seus escritos e que se compunha apenas de vinte e
dois sinais bastante simples comparados com os ideográficos que aprendera nas
Escolas do Egito; a outra teria sido o fato de compreender que estava
escrevendo para seu próprio povo, cuja origem era semita como a dos habitantes
da terra onde vivia, tendo estes uma religião idêntica à dos primeiros, ambas,
porém, deturpadas pelas influências pagãs e oriundas do pecado; seus leitores
seriam homens e mulheres, moços e moças do povo, especialmente israelitas que,
não sendo versados em hieróglifos por causa da sua posição de escravos no
Egito, aprenderam com muito mais facilidade os poucos e simples sinais
alfabéticos que representavam sons do que os inúmeros e complicados hieróglifos
que representavam idéias.
1.2
Materiais Usados para
Escrever
1.2.1
Manuscritos
Vulgarmente os dicionários
registram MANUSCRITO como "escrito à mão". Em sentido técnico, esse
nome refere-se à volumosa bagagem de rolos ou fragmentos escritos à mão com
textos das Escrituras Sagradas. Em um sentido mais particular, alude aos
escritos do Antigo e Novo Testamentos, desde os tempos patriarcais até à
invenção da imprensa, na metade do século XV.
De
conformidade com o Prof. Antonio Gilberto (1996, p.74,75), “desde os tempos
mais remotos o homem tem usado vários materiais e técnicas sobre as quais
tentava de alguma forma passar idéias, fatos de geração a geração”, alguns dos
materiais usados foram:
a)Pedra.
Os caracteres eram gravados nas colunas dos templos, como os de Lúxor e
Camaque, no Egito; ou em cilindros, como o código de Hamurabi; ou nas rochas,
como em Persépolis; ou mesmo em lápides, como a pedra Roseta, decifrada por
Champolion, nos dias de Napoleão.
b)Cerâmica.
Material usado desde tempos imemoriais na região da Mesopotâmia. Dois tipos de
cerâmica têm sido encontrados pelos arqueólogos: seca ao sol e seca ao forno.
c) Linho. Tem sido encontrado nas descobertas arqueológicas.
d)Tábuas recobertas de cera (Is
8.1; Lc 1.63).
e)Papiro. O papiro se destaca
como o principal material antigo usado para escrever. Planta originária do
Egito, muito comum nas margens lodosas do Nilo, e usada abundantemente na
preparação de uma espécie de papel. Ele só cresce em terrenos alagadiços, por
isso em Jó 8.11 há a seguinte pergunta: Pode o papiro crescer sem lodo?
Normalmente se escrevia só de um lado do papiro e as folhas mais longas eram
enroladas. Estes rolos recebiam o nome de volumes, palavra do latim – volvere
que significa enrolar. Os egípcios guardavam ciosamente o segredo da preparação
do papiro para a escrita. No século VI a.C. começaram a exportá-lo para a
Grécia e depois para outros povos que habitavam nas margens do Mediterrâneo,
onde se criou um importante comércio desta especialidade, mormente na cidade da
Biblos. Quem hoje chega ao Cairo, capital do Egito, pode visitar, às margens do
rio Nilo um navio-escola, onde se prepara o papiro com finalidades culturais e
turísticas, mas não comerciais. The Interpreter's Dictionary of the Bible, vol.
3, p. 649, diz o seguinte sobre o papiro: "O papel, palavra derivada de
papiro, era preparado de finas faixas da parte interior da folha do papiro arranjadas
verticalmente, com outra camada aplicada horizontalmente em cima. Um adesivo era
empregado (Plínio diz que era água do Nilo!) e pressão aplicada para ligá-las
formando uma folha. Após secar, era polida com instrumentos de concha ou pedra;
depois as folhas eram atadas, formando rolos".
f) Pergaminho. A
preparação do pergaminho para receber a escrita tem uma interessante história.
De acordo com a História Natural de Plínio, o Velho (Livro XIII, capítulo XXI),
foi o rei Eumene de Pérgamo, uma cidade da Ásia Menor, quem promoveu a
preparação e o uso do pergaminho. Este rei planejou fundar uma biblioteca em
sua cidade, que se rivalizasse com a famosa biblioteca de Alexandria. Esta
ambição não agradou a Ptolomeu do Egito, que imediatamente proibiu a exportação
de papiro para Pérgamo. Esta proibição forçou Eumene a preparar peles de
carneiro ou ovelha para receber a escrita, dando-lhe o nome do lugar de origem
– pergaminho. O pergaminho era muito superior ao papiro, por causa da maior
durabilidade. Os principais manuscritos bíblicos estão escritos em Pergaminhos. Paulo
na sua segunda Epístola a Timóteo (4.13) roga ao jovem ministro para que lhe
trouxesse os pergaminhos. Em grego a palavra não é pergaminho mas membrana. O
pergaminho continuou a ser usado até o fim da Idade Média quando o papel
inventado pelos chineses e introduzido na Europa pelos comerciantes árabes
tornou-se popular, suplantando todos os outros materiais da escrita. Os judeus
eram bastante cuidadosos com a preparação de manuscritos destinados a receber
os escritos sagrados, exigindo que a pele fosse de animal limpo e preparada por
um judeu.
g)Palimpsesto. Em
virtude de crises econômicas o pergaminho tornava-se muito caro, era então
raspado, lavado e usado novamente. Estes manuscritos eram chamados palimpsestos
(do grego palin = de novo e psesto = raspado). Um famoso manuscrito – o Códice
Efraimita está escrito em um palimpsesto. Por meio de reagentes químicos e
raios ultravioletas eruditos têm conseguido fazer reaparecer a escrita
primitiva desses palimpsestos. Dos 250 manuscritos unciais conhecidos hoje, do
Novo Testamento, 52 são palimpsestos.
1.2.2
Caracteres dos Manuscritos
Na antiguidade havia dois
tipos distintos de escrita em grego: o cursivo e o uncial. O cursivo, escrita
rápida, empregado em escritos não literários, tais como: cartas, pedidos,
recibos. Neste tipo de escrita eram comuns as contrações e abreviações. O
uncial, usado mais em obras literárias, caracterizava-se por serem as letras
maiores e separadas umas das outras. Assemelhar-se-iam às nossas letras
maiúsculas. Os manuscritos bíblicos apresentam estes dois tipos de escrita,
porém, não nos devemos esquecer que os principais se encontram em letras
unciais.
No início do século IX a.D.,
houve uma reforma na maneira de escrever e uma escrita com letras pequenas,
chamadas minúsculas, era usada na produção de livros. Letras minúsculas,
economizando tempo e material, faziam com que os livros ficassem mais baratos e
pudessem ser adquiridos por maior número de pessoas. Nos manuscritos bíblicos
primitivos, normalmente, nenhum espaço era deixado entre as palavras e até o
século VIII a pontuação era escassamente usada. De acordo com J. Angus em
História, Doutrina e Interpretação da Bíblia, Vol, I, p. 39, somente no século
VIII é que foram introduzidos nos manuscritos alguns sinais de pontuação e no
século IX introduziram o ponto de interrogação e a vírgula. Sentidos distintos
têm surgido, quando uma simples vírgula é mudada de lugar, como se evidencia da
leitura da conhecida passagem: "Em verdade te digo hoje, comigo estarás no
paraíso". Muitas outras passagens bíblicas podem ser lidas com sentido
totalmente diferente ao ser mudada a sua pontuação como nos confirmam os
seguintes exemplos: "Ressuscitou, não está aqui." "Ressuscitou?
não, está aqui." "A voz daquele que clama no deserto: preparai o
caminho do Senhor"; "A voz daquele que clama: no deserto preparai o
caminho do Senhor."
1.2.3
Manuscritos gregos
a) Papiros. O texto do
Novo Testamento continuou sendo escrito sobre papiro até ao século VII. Mas
sabemos que a partir do século IV já se usava o pergaminho. Há nada menos de 76
papiros que contêm porções do Novo Testamento.
b) Unciais e
Cursivos. Existia uma variedade de
escritos unciais e cursivos. Há 252 cópias unciais, atribuídas de 4 a 9 e mais ou menos 2646
cópias em cursivos, de 9 a
11 d.C.
c) Lecionários. Igualmente escritos em pergaminho. Há 1997
cópias. Eram leituras escolhidas do texto do Novo Testamento, para serem lidas
nas reuniões públicas nas igrejas. Portanto, há nada menos de cinco mil
manuscritos gregos. De todas as obras literárias antigas, nenhuma é tão bem
documentada como o Novo Testamento.
d) Ostracas. Eram pedaços de jarros quebrados, grafados com
pequenas porções do Novo Testamento ou de outras obras literárias. Do Novo Testamento
há apenas vinte e cinco, com os seguintes textos: Mt 27.31,32; Mc 5.40,41; Lc
12.13-16; Jo 1.1-9,14-17; 18.19-25 e 19.15-17.
e) Amuletos. Também chamados "talismãs da
sorte." Eram pedaços de lança, madeira, barro, pergaminho e papiro, com
inscrições, algumas com breves porções do Novo Testamento, inclusive a oração
do Pai Nosso. Pertencem aos séculos IV à XIII.
1.2.4
Manuscritos Importantes do Antigo Testamento
Muitos dos manuscritos
medievais do Antigo Testamento exibem uma forma positivamente padronizada do
texto hebraico. Essa padronização reflete o trabalho de copistas medievais
conhecidos pelo nome de massoretas (500-900 d.C.). O texto resultante desse
trabalho é denominado texto massorético. A maioria dos manuscritos importantes,
datados do século XI d.C. ou posteriores reflete essa mesma tradição textual
básica. Mas, visto que o texto massorético não se firmou até bem depois de 500
d.C., muitas questões relacionadas ao seu desenvolvimento nos séculos
precedentes não podiam ser respondidas. Então, a primeira tarefa para os
críticos textuais do Antigo Testamento foi comparar as testemunhas antigas, a
fim de descobrir como o texto massorético surgiu e como ele e os testemunhos
antigos da Bíblia hebraica estão relacionados, o que nos leva à primeira tarefa
da crítica textual: a compilação de todos os registros possíveis dos escritos
bíblicos.
Todas as fontes primárias
das Escrituras hebraicas são manuscritos (grafados à mão), geralmente escritos
em peles de animais, em papiros ou, às vezes, em metais. O fato de serem
escritos à mão é fonte de muitas dificuldades para o crítico textual. O erro
humano e a interferência editorial são freqüentemente culpados pelas muitas
leituras variantes nos manuscritos do Antigo e do Novo Testamento. Pela razão
de os antigos manuscritos estarem escritos em peles ou em papiros, gera-se
outra fonte de dificuldades. Devido à deterioração natural, a maioria dos
antigos manuscritos subsistentes está fragmentária, difícil de ler [...] Há
muitas testemunhas secundárias para o texto primitivo do Antigo Testamento,
incluindo traduções para outras línguas, citações usadas tanto por amigos
quanto por inimigos da religião cristã e evidências dos primeiros textos impressos.
Grande parte das testemunhas secundárias passou por processos similares às
testemunhas primárias. Elas também contêm numerosas variantes por causa de
erros, não só intencionais como também acidentais, e estão fragmentárias como
resultado da degeneração natural. Considerando que as leituras variantes realmente
existem nos antigos manuscritos que subsistiram, estes devem ser compilados e
comparados. O trabalho de comparar e alistar as leituras variantes é
conhecido por colação (COMFORT, 1998, p. 215).
1.2.5
O Texto Massorético
A história do texto massorético
é um relato por si mesmo significativo. Esse texto da Bíblia hebraica é o mais
completo que existe. Forma a base para nossas modernas Bíblias hebraicas e é
o protótipo pelo qual todas as comparações são feitas no estudo textual do
Antigo Testamento. É chamado massorético porque, em sua presente forma, foi
baseado na Massora, a tradição
textual dos eruditos judeus conhecidos como os massoretas de Tiberíades (local
dessa comunidade, no mar da Galiléia). Os massoretas, cuja escola de erudição
prosperou entre 500 e 1000 d.C. padronizaram o tradicional texto consonantal,
adicionando pontos vocálicos e notas marginais (o antigo alfabeto hebraico não
tinha vogais).
O manuscrito massorético de
data mais antiga é o Códice Cairense (895 d.C. atribuído a Moisés ben Aser.
Esse manuscrito compreende os livros tanto dos primeiros profetas (Josué,
Juízes, Samuel e Reis) quanto dos últimos (Isaías, Jeremias, Ezequiel e os 12
Profetas Menores). O resto do Antigo Testamento está faltando no manuscrito
[...] Outro importante manuscrito subsistente atribuído à família Ben Aser é o
Códice Alepo. De acordo com nota conclusiva encontrada no manuscrito, Aron ben
Moisés ben Aser foi responsável por escrever as notas massoréticas e colocar os
pontos vocálicos no texto. Esse manuscrito continha todo o Antigo Testamento e
data da primeira metade do século X d.C. De acordo com notícias divulgadas, foi
destruído em um tumulto antijudaico em 1947, porém mais tarde tal informe
comprovou-se ser apenas parcialmente verdadeiro. Uma grande parte do manuscrito
subsistiu e será usada como base para uma nova edição crítica da Bíblia
hebraica a ser publicada pela Universidade Hebraica de Jerusalém [...] O
manuscrito conhecido como Códice Leningradense, atualmente guardado na Biblioteca
Pública de Leningrado, é de especial importância como testemunha ao texto de
Ben Aser. Segundo nota contida no manuscrito, esse códice foi copiado, em 1008
d.C., de textos escritos por Aron ben Moisés ben Aser. Visto que o mais antigo
texto hebraico completo do Antigo Testamento (o Códice Alepo), não estava
disponível aos eruditos no início do século XX, o Códice Leningradense foi
usado como base textual para os populares textos hebraicos de hoje: a Bíblia Hebraica, editada por R.
Kittel, e sua revisão, a Bíblia
Hebraica Stuttgartensia, editada por K. Elliger e W. Rudolf [...] Há um
número muito grande de códices de manuscritos menos importantes, que refletem a
tradição massorética: o Códice de Petersburgo dos Profetas e os Códices de
Erfurt. Também há vários manuscritos que não existem mais, embora tenham sido
usados pelos eruditos no período massorético. Um dos mais distintos é o Códice
Hillel, tradicionalmente atribuído ao rabino Hillel ben Moisés ben Hillel, de
aproximadamente 600 d.C. Esse códice era dito como muito exato e foi usado para
a revisão de outros manuscritos. Leituras desse códice são repetidamente
citadas pelos antigos massoretas medievais. O Códice Muga, o Códice Jericó e o
Códice Jerusalmi, também não mais subsistentes, foram igualmente citados pelos
massoretas. [...] A despeito da perfeição dos manuscritos massoréticos da
Bíblia hebraica, um importante problema ainda permanece para os críticos do
Antigo Testamento. Os manuscritos massoréticos, antigos como são, foram
escritos entre um e dois mil anos depois dos autógrafos originais. (COMFORT,
1998, p. 215-219).
1.2.6
Manuscritos do Mar Morto
Num dia de verão, em 1947, o
pastor beduíno árabe, Muhammad ad Dib, da tribo dos Taa'mireh, que se acampa
entre Belém e o mar Morto, saiu a procura de uma cabra desgarrada nas ravinas
rochosas da costa noroeste do referido mar, e encontrou um inestimável tesouro
bíblico. Estava o pastor junto à encosta rochosa do uádi Qümramo Ao atirar
uma pedra numa das cavernas ouviu um barulho de cacos se quebrando. Entrou na
caverna e encontrou uma preciosa coleção de MSS bíblicos: 12 rolos de
pergaminho e fragmentos de outros. Um dos rolos era um MS de Isaías do ano 100 a .C., isto é, mil anos
mais antigo que os exemplares até então conhecidos. Os rolos estão escritos em
papiro e pergaminho e envolvidos em panos de linho. Outras cavernas foram
vasculhadas e novos MSS foram encontrados.
Novas luzes estão surgindo
na interpretação de passagens difíceis do Antigo Testamento. Exemplos: em
Êxodo 1.5, o total de pessoas é 75, concordando assim com Atos 7.14. (O hebraico
não tem algarismos para os números e sim letras; daí, para um erro não custa
muito) Em Isaías 49.12, o novo MS de Isaías diz "Siene" e não
"Sinin". Ora, Siene era uma importante cidade fronteiriça do Egito,
às margens do Nilo, junto à Etiópia. É hoje a moderna Assuam, com sua
extraordinária represa.
Ezequiel 29.10 e 30.6
referem-se a essa cidade; a versão ARC grafa "Sevené". Muitos
eruditos pensavam até agora que o termo "Sinin" de Isaías 49.12 fosse
uma alusão à China. É muito confortante saber que os textos desses MSS
encontrados concordam com os das nossas Bíblias. Pesquisas revelam que os MSS
do mar Morto foram escondidos pelos essênios - seita ascética judaica -
durante a segunda revolução dos judeus contra os romanos em 132135 d.C. Os
responsáveis por um grande mosteiro agora descoberto, ao verem aproximar-se as
tropas romanas, esconderam ali sua biblioteca! Nas 267 cavernas examinadas,
foram encontrados fragmentos de 332 obras, ao todo. Encontraram, inclusive,
cartas do líder dessa revolta: Bar Kochba, em perfeito estado, estando sua
assinatura bem nítida. Nos MSS encontrados há trechos de todos os livros do
Antigo Testamento, exceto Ester.
1.2.7
Escritos em Blocos de Pedra
Dos escritos em blocos de
pedra há documentos que se tornaram famosos pela antiguidade e conteúdo. Dentre
estes se destacam: o Código de Hamurábi e a Pedra de Roseta.
1.2.7.1
Código de Hamurabi
Foi esta uma das mais
importantes descobertas arqueológicas que já se fizeram. Hamurabi, rei da
cidade de Babilônia, cuja data parece ser 1792-1750 a .C., é comumente
identificado pelos assiriólogos com o "Anrafel" de Gn 14, um dos reis
que Abraão perseguiu para libertar Ló. Foi um dos maiores e mais célebres dos
primitivos reis babilônios. Fez seus escribas coligir e codificar as leis do
seu reino; e fez que estas se gravassem em pedras para serem erigidas nas
principais cidades. Uma dessas pedras originalmente colocada na Babilônia, foi
achada em 1902, nas ruínas de Susa (levada para lá por um rei elamita, que
saqueara a cidade de Babilônia no século 12 a .C.) por uma expedição francesa dirigida
por M. J. de Morgan. Acha-se hoje no Museu do Louvre, em Paris. Trata-se de
um bloco lindamente polido de duro e negro diorito, de 2 m 60 cm de altura, 60 cm de largura, meio metro
de espessura, um tanto oval na forma, belamente talhada nas quatro faces, com
gravações cuneiformes da língua semito-babilônica (a mesma que Abraão falava).
Consta de umas 4.000 linhas, equivalendo, quanto à matéria, ao volume médio de
um livro da Bíblia; é a placa cuneiforme mais extensa que já se descobriu.
Representa Hamurabi recebendo as leis das mãos do rei-sol Chamás: leis sobre o
culto dos deuses dos templos, a administração da justiça, impostos, salários,
juros, empréstimos de dinheiro, disputas sobre propriedades, casamento,
sociedade comercial, trabalho em obras públicas, isenção de impostos,
construção de canais, a manutenção dos mesmos, regulamento de passageiros e
serviço de transporte pelos canais e em caravanas, comércio internacional e
muitos outros assuntos.
1.2.7.2
A Pedra
de Roseta
É a chave da língua egípcia
antiga. A língua da antigo Egito era hieroglífica, escrita de figuras, um
símbolo para cada palavra. Pelo ano 700 a .C. uma forma mais simples de escrita
entrou em uso, chamada 'demótica', mais aproximada do sistema alfabético, e que
continuou como língua do povo até aos tempos dos romanos. No 5º século d.C.
ambas caíram em desuso e foram esquecidas. De sorte que tais inscrições se
tornaram ininteligíveis, até que se achou a chave de sua tradução. Essa chave
foi a Pedra de Roseta. Achou-a M. Boussard, um dos sábios franceses que
acompanharam Napoleão ao Egito (1799), numa cidade sobre a foz mais ocidental
do Nilo, chamada Roseta. Encontra-se hoje no Museu Britânico. É de granito
negro, cerca de 1,30 m
de altura, 80 cm
de largura, 30 cm
de espessura, com três inscrições, uma acima da outra, em grego, egípcio
demótico, e egípcio hieroglífico, o grego era conhecido. Tratava-se de um
decreto de Ptolomeu V, Epífanes, feito em 196 a .C. nas três línguas usadas então em todo
o país, para ser colocado em várias cidades. Um sábio francês, de nome
Champollion, depois de quatro anos (1818-22) de trabalho meticuloso e paciente,
comparando os valores conhecidos das letras gregas com os caracteres egípcios
desconhecidos, conseguiu deslindar os mistérios da língua egípcia antiga.
1.2.8
Formato dos Livros
O livro, através da sua
longa existência, apresentou duas formas bem distintas: o rolo e o códice.
(a)
Rolo. Entre o povo judeu, bem como no mundo
grego-latino, os livros eram normalmente publicados em forma de um rolo feito
de papiro ou pergaminho. Formava-se o rolo colocando várias folhas de papiro ou
couro uma ao lado da outra. O tamanho médio de um rolo entre os gregos era de 11 metros . Alguns rolos
chegaram a ter o comprimento de 30 metros . O maior rolo de papiro, conhecido, é
uma crônica do rei egípcio Ramsés II, com a extensão de 40 metros , conhecido como
o Papiro Harris. O comprimento médio de um rolo bíblico estava entre 9 e 11 metros . Livros longos
como Reis, Crônicas e Isaías eram divididos em dois rolos. Os dois maiores
livros do Novo Testamento, Lucas e Atos, cada um preencheria um rolo de mais ou
menos 10 metros
de comprimento. O manuseio de um rolo era mais difícil do que o de um livro
atual, porque o leitor necessitava empregar as duas mãos, uma para desenrolá-lo
e a outra para enrolá-lo. Além disso, as comunidades cristãs primitivas, em
breve descobriram que era difícil encontrar específicos tópicos das escrituras
num rolo. Diante dessas dificuldades, o engenho humano idealizou o livro nos
moldes em que o temos hoje. Estes livros em seus primórdios eram chamados
códices.
(b)
Códices. A palavra códice vem do latim
"codex", que designava primitivamente um bloco de madeira cortado em
várias folhas ou tabletes para escrever. O códice era formado de várias folhas
de papiro ou pergaminho sobrepostas e costuradas. Estes códices começaram a
substituir os primitivos rolos no segundo século a.D. A afirmativa de que as
comunidades cristãs, começaram a usar os códices nas igrejas, para diferençar
dos rolos, usados nas sinagogas, pode ser verdadeira, levando-se em conta o
seguinte. Dos 476 manuscritos não cristãos descobertos no Egito, copiados no
segundo século a.D., 97% estão na forma de rolo. Em contrapartida, dos 111
manuscritos bíblicos cristãos dos primeiros 4 séculos da Era Cristã, 99 estão
na forma de códice.
As vantagens dos códices
sobre os rolos, no caso dos manuscritos bíblicos, são evidentes pelas seguintes
razões: Permitia que os quatro Evangelhos, ou todas as Epístolas paulinas se
achassem num livro; era bem mais fácil o manuseio do livro; adaptava-se melhor
para receber a escrita de ambos os lados, baixando assim o custo do livro; a
procura de determinadas passagens era mais rápida.
1.3 O Vocábulo "Bíblia"
Este vocábulo não se acha no
texto das Sagradas Escrituras. Consta apenas na capa. De onde, pois, vem? Vem
do grego, a língua original do Novo Testamento. É derivado do nome que os
gregos davam à folha de papiro preparada para a escrita - "biblos".
Um rolo de papiro de tamanho pequeno era chamado "biblion" e vários
destes eram uma "Bíblia". Portanto, literalmente, a palavra “Bíblia”
quer dizer "coleção de livros pequenos". Com a invenção do papel,
desapareceram os rolos, e a palavra “biblos” deu origem a "livro",
como se vê em biblioteca, bibliografia, bibliófilo etc.
É consenso geral entre os
doutos no assunto que o nome Bíblia foi primeiramente aplicado às Sagradas
Escrituras por João Crisóstomo, patriarca de Constantinopla, no Século IV. E
porque as Escrituras formam uma unidade perfeita, a palavra Bíblia, sendo um
plural, como acabamos de ver, passou a ser singular, significando o Livro, isto
é, o Livro dos livros; o Livro por excelência. Como Livro divino, a definição
canônica da Bíblia é "A revelação de Deus à humanidade". Os nomes
mais comuns que a Bíblia dá a si mesma, isto é, os seus nomes canônicos, são:
Escrituras (Mt 21.42); Sagradas Escrituras (Rm 1.2); Livro do Senhor (Is
34.16); Palavra de Deus (Mc 7.13; Hb 4.12); Oráculos de Deus (Rm 3.2).
1.4
Nomes atribuídos a Palavra de Deus
a) Bíblia. A palavra Bíblia,
usada com referência às Escrituras Sagradas desde o IV século, é a forma latina
da palavra grega Bíblia, plural neutro de Biblion, que por sua vez é diminutivo
de Biblos – nome grego para a planta da qual se fazia o papel – papiro Pelo uso que se fez do papiro é que biblos
veio a significar livro e biblion um livro pequeno. Os fenícios se ocupavam
grandemente do comércio de papiro, por isso no segundo século a.C. deram o nome
de Biblos ao seu principal porto, passando depois à cidade, e conservado até
hoje para as suas ruínas. A palavra Biblos encontra-se em Marcos 12.26 como
referência a um livro de Velho Testamento, ou a um grupo no plural para
designar os livros dos profetas – Daniel 9.2. O plural usado no Velho
Testamento passou à Igreja Cristã e as Escrituras são designadas por livros,
livros divinos, livros canônicos. O nome Bíblia para o conjunto dos livros
sagrados, foi usado pela primeira vez por Crisóstomo, no IV século. Alguns pais
da Igreja denominaram as Escrituras de Biblioteca Divina.
b) Escrituras. O
Novo Testamento, que ocupa menos da terceira parte do Velho, usa a expressão –
Os Escritos ou as Escrituras para os livros do Antigo Testamento, em Mateus
21.42 e João 5.39.
c) Outras Expressões:
A Palavra de Deus (Hb 4.12); A Escritura
de Deus (Êx 32.16); As Sagradas
Letras (1Tm 3.15); A Escritura da
Verdade (Dn 10.21); As Palavras da Vida (Atos 7.38); As Santas Escrituras (Rm
1.2).
d) Nomes figurativos: Uma luz. "Uma luz para o meu caminho" (Sl
119:105); Um espelho (Tg 1.23); Ouro fino (Sl 19.10); Uma porção de alimento
(Jó 23.12); Leite (1Co 3.2); Pão para os famintos (Dt 8.3); Fogo (Jr 23.29); Um
martelo (Jr 23.29); Uma espada do Espírito (Ef 6.17).
e) Pentateuco.
Etimologicamente, Pentateuco significa cinco estantes, onde se colocavam os
livros e depois, por metonímia, os próprios livros. Pesquisando um pouco mais
se tem a impressão de que as estantes eram aqueles pedaços de madeira que
sustentavam os rolos, vindo depois a designar os próprios rolos. O termo
pentateuco, de origem grega, significando cinco rolos tem sido usado para os
cinco livros de Moisés, enquanto o nome hebraico para estes mesmos livros é
Torá. Este vocábulo começou a ser usado para os primeiros cinco livros da
Bíblia depois da tradução da Septuaginta. Estes livros constituem a primeira
divisão do Cânon Hebraico, que é formado, como é do conhecimento geral, da Lei,
dos Profetas e dos Escritos. Eruditos modernos têm usado o termo
"Hexateuco" em vez de Pentateuco, por adicionarem aos primeiros
livros da Bíblia o livro de Josué, por notarem muita afinidade entre os seis.
Nenhuma razão plausível existe para a aceitação desta nova nomenclatura, desde
que o termo tem sido usado por críticos que não admitem tenha sido Moisés o
autor do Pentateuco.
f) Testamento.
Este vocábulo não se encontra na Bíblia como designação de uma de suas partes.
Sabemos que toda a Bíblia se divide em duas partes chamadas Antigo Testamento e
Novo Testamento. Contendo a primeira, os escritos elaborados antes de Cristo, a
segunda registra o que foi redigido no primeiro século da nossa era. A palavra
portuguesa testamento corresponde à palavra hebraica "berith" –
aliança, pacto, contrato, e designa aquela aliança que Deus fez com o povo de
Israel no Monte Sinai, aliança sancionada com o sangue do sacrifício como vemos
em Êxodo 24.1-8; 34.10-28. Sendo esta aliança quebrada pela infidelidade do
povo, Deus prometeu uma nova aliança (Jr 31.31-34) que deveria ser ratificada
com o sangue de Cristo. (Mt 26.28). Os escritores neotestamentários denominam a
primeira aliança de antiga (Hb 8.13), contrapondo-lhe a nova (2Co 3.6,14). Os
tradutores da Septuaginta traduziram "berith" para
"diatheke", embora não haja perfeita correspondência entre as
palavras, desde que berith designa aliança (compromisso bilateral) e diatheke
tem o sentido de "última disposição dos próprios bens",
"testamento" (compromisso unilateral). Pela figura de linguagem,
conhecida como metonímia, as respectivas expressões "antiga aliança"
e "nova aliança" passaram a designar a coleção dos escritos que
contém os documentos respectivamente da primeira e da segunda aliança. O termo
testamento veio até nós através do latim quando a primeira versão latina do
Velho Testamento grego traduziu diatheke por testamentum. São Jerônimo
revisando esta versão latina manteve a palavra "testamentum",
eqüivalendo ao hebraico "berith" – aliança, concerto, quando a
palavra como já foi visto não tinha essa significação no grego. Afirmam alguns
pesquisadores que a palavra grega para contrato, aliança deveria ser suntheke,
por traduzir melhor o hebraico "berith". As denominações Antigo
Testamento e Novo Testamento, para as duas coleções dos livros sagrados,
começaram a ser usadas no final do II século a.D. quando os evangelhos e outros
escritos apostólicos foram considerados como Escrituras. O cristianismo
distinguiu duas etapas na manifestação do dom de Deus à humanidade: A antiga –
feita por Deus ao povo de Israel (2Co 3.14); A segunda ou nova designa a união
que o próprio Deus, tomando a forma humana, selou com o homem pela oblação de
Cristo (2Co 3.6).
g) Torah. Palavra derivada do
verbo Yarah, que no "hifil" significa lançar, jogar (Êx 15.4, 1Sm
20.36) e de modo especial lançar flechas para se conhecer a vontade divina (Js
18.6; 2Rs 13.17). O mesmo verbo é usado no sentido de mostrar com a mão,
apontar com o dedo (Gn 46.28; Êx 15.25). A significação fundamental de yarah é,
portanto; indicar uma direção. O substantivo cognato tem o sentido bíblico mais
corrente: ensinamento, instrução, como se deduz da leitura de Isaías 30.9;
42.4; Mq 4.2; Ml 2.6; Jó 22.22, onde esta palavra aparece. Do estudo desta
palavra conclui-se que o termo português "lei" não traduz o vocábulo
hebraico em toda a sua extensão. A torah é o ensinamento que inspira bom
procedimento em nosso viver.
h) O termo “Palavra”. No
Antigo Testamento, a palavra dãbhãr de Deus é usada por 394 vezes para designar
alguma comunicação divina provinda da parte de Deus aos homens, na forma de mandamento, profecia, advertência ou
encorajamento. A fórmula usual é “a
palavra de Yahweh veio (literalmente, foi) a ...”, ainda que algumas vezes a
palavra de Deus seja vista como uma visão (Is 2.1; Jr 2.31; 38.21). A palavra
de Yahweh é uma extensão da personalidade divina, investida de autoridade, e
deve ser ouvida tanto pelos anjos como pelos homens (Sl 103.20; Dt 12.32). A
palavra de Deus permanece para sempre (Is 40.8), e uma vez proferida não pode
deixar de ser cumprida (Is 55.11). É usada como sinônimo da lei, tôrah, de
Deus, em Sl 119, onde a referência é à
mensagem escrita e não à mensagem falada da parte de Deus. No Novo Testamento, “palavra”
geralmente traduz dois termos gregos, logos e rhema, a primeira é usada
supremamente para designar a mensagem do evangelho cristão (Mc 2.2; At 6.2; Gl
6.6), embora a última esteja revestida
da mesma significação (Rm 10.8; Ef 6.17; Hb 6.5 etc.). Nos pontos seguintes
veremos maiores detalhes
1.5
A Palavra “Rhema”
Rhema. Aquilo que é
dito, palavra, dito, expressão (Mt 12.36; Mc 9.32). Ameaça (At 6.13). Coisa,
objeto, assunto, evento (Mt 18.16; Lc 1.37; 2.15,19,51). Nosso Senhor falou
sobre a palavra de Deus (na parábola do semeador, Lc 8.11; Mc 7.13; Lc 11.28),
porém, nos evangelhos sinópticos Ele sempre usava o plural para indicar a Sua
própria mensagem (“minhas
palavras”, Mt 24.35 e paralelos;
Mc 8.38; Lc 24.44). No quarto evangelho, entretanto, pode-se encontrar o
singular com freqüência. Para a Igreja primitiva, a palavra era uma mensagem
revelada da parte de Deus em Cristo, que
deveria ser pregada, ministrada e obedecida. Era a palavra da vida (Fp 2.16),
da verdade (Ef 1.13), da salvação (At 13.26), da reconciliação (2Co 5.19), e da
cruz (1Co 1.18).
Significado etimológico. Tem
um grande número de diferentes significados: sua tradução básica é “palavra”,
isto é declaração significativa, de onde se desenvolvem seus muitos sentidos
“afirmação, declaração, discurso, assunto, doutrina, questão” e, mediante um
outro tipo de desenvolvimento, “razão, causa, motivo, respeito”. Na Bíblia: palavra (Mt 12.37), dizer a
palavra (Mt 8.8), assunto sob discussão, matéria, coisa, ponto, tema (Mt 5.32;
Mc 9.10), declaração, asserção, afirmação (Mt 12.32; 15.12). A tradução do
logos irá, freqüentemente, variar de acordo com o contexto.
Como termo gramatical
significa uma sentença finita, em uma declaração lógica de fatos, definição ou
julgamento, e na retórica significa uma declaração de oratória corretamente
construída.
Como termo de psicologia e
metafísica, foi empregado pela Stoá, seguindo Heráclitos, para significar o
poder ou função divina pela qual o universo recebe sua unidade, coerência e
significado. Logos spermatikos, palavra seminal que, à semelhança de semente,
dá forma à matéria disforme. O homem foi criado de acordo com o mesmo
princípio, e em si mesmo se diz possuir um Logos, tanto internamente (logos
endiathetos, razão), e que se expressa pela fala externamente (logos prophorikos).
O termo é igualmente usado como padrão ou norma mediante a qual o indivíduo
pode viver “de conformidade com a
natureza”.
Na Septuaginta o termo
“Logos” é usado para traduzir a palavra hebraica dãbhãr. A raiz desta palavra
significa “aquilo que está por trás” e assim quando é traduzida por palavra,
também significa som compreensível; e também pode significar coisa. De acordo
com uma característica comum da psicologia dos hebreus, o dãbhãr de um homem é
considerado como, em certo sentido, uma extensão de sua personalidade, e, além
disso, como algo que possui uma existência substancial toda própria. A palavra
de Deus, portanto, é Sua auto-revelação através de Moisés e dos profetas.
Também pode ser usada para designar tanto visões isoladas e oráculos como o
conteúdo total da revelação inteira, e assim, especialmente o Pentateuco. A
palavra possui um poder semelhante ao de Deus, o qual a profere (Is 55.11) e
efetua Sua vontade sem qualquer resistência. Por conseguinte o termo pode referir-se à palavra criadora de Deus.
A revelação que Deus fez de
si mesmo centraliza-se em
Jesus Cristo. Ele é o Logos de Deus. Ele é o Verbo Vivo, o
Verbo encarnado, que revela o Deus eterno em termos humanos. O título Logos só
pode ser encontrado nos escritos joaninos, embora o emprego do termo haja sido
relevante na filosofia grega daqueles dias. Alguns têm procurado uma ligação
entre a linguagem de João e a dos estóicos, dos primeiros gnósticos, ou dos
escritos de Filo de Alexandria. Estudos mais recentes sugerem que João foi
influenciado primariamente pelos seus alicerces no Antigo Testamento e na fé
cristã. É provável, porém, que tivesse consciência das conotações mais amplas
do termo, e que a tivesse empregado deliberadamente, com o propósito de
transmitir um significado adicional e especial.
O Logos é identificado com a
Palavra de Deus na Criação e também com sua Palavra autorizada (a lei para toda
a humanidade). João deixa nossa imaginação atônita quando introduz o Logos
eterno, o Criador de todas as coisas, o próprio Deus, como o Verbo que se
encarnou a fim de habitar entre a sua criação (Jo 1.1-3,14). "Deus nunca
foi visto por alguém. O filho unigênito, que está no seio do Pai, este o fez
conhecer" (Jo 1.18). O Verbo Vivo tem sido visto, ouvido, tocado, e agora
proclamado mediante a Palavra escrita (1Jo 1.1-3). Quando do encerramento do
cânon sagrado, o Logos vivo de Deus, o Fiel e Verdadeiro, está em estado de
prontidão no Céu, prestes a voltar à Terra como Rei dos reis e Senhor dos
senhores (Ap 19.11-16).
A suprema revelação de Deus
acha-se no seu Filho. Durante muitos séculos, mediante as palavras dos
escritores do Antigo Testamento, Deus havia se revelado progressivamente.
Tipos, figuras, sombras e prefigurações desdobravam paulatinamente o plano de
Deus para a redenção da humanidade (Cl 2.17). Depois, na plenitude dos tempos,
Deus enviou o seu Filho para revelar o Pai de forma mais perfeita e para
executar aquele gracioso plano mediante a sua morte na Cruz (1Co 1.1 7-25; Gl 4.4).
Toda a revelação bíblica, antes e depois da Encarnação de Cristo, centraliza-se
nEle. As muitas fontes originárias e maneiras da revelação anterior indicavam e
prenunciavam a sua vinda à terra como homem. Toda a revelação subseqüente
engrandece e explica a sua vinda. A revelação que Deus fez de si mesmo começou
pequena e misteriosa, progrediu no decurso do tempo, e chegou ao seu ponto
culminante na Encarnação do seu Filho. Jesus é a revelação mais completa de
Deus.
Na Pessoa de Jesus Cristo,
coincidem entre si a Fonte e o Conteúdo da revelação. Ele não era mais um meio
de comunicar a revelação divina, conforme o foram os profetas e apóstolos. Ele
mesmo é "o resplendor da sua glória, e a expressa imagem da sua
pessoa" (Hb 1.3). Ele é "o caminho, e a verdade, e a vida";
conhecer a Ele é conhecer também o Pai (Jo 14.6-7). Os profetas diziam:
"Veio a mim a Palavra do Senhor", mas Jesus afirmava: "Eu vos
digo"! Jesus inverteu o uso do termo "amém", começando assim as
suas declarações: "Na verdade [hb. amen], na verdade te digo" (Jo
3.3). Tendo Ele falado, a verdade foi declarada de modo imediato e
inquestionável. Cristo é a chave que revela o significado das Escrituras (Lc
24.25-27; Jo 5.39,40; At 17.2,3; 28.23; 2Tm 3.15). Elas testificam dEle e da
salvação que Ele outorga mediante a sua morte. O enfoque que as Escrituras
dedicam a Cristo não justifica, porém, o abandono irresponsável do texto
bíblico nas áreas que parecem ter poucas informações abertamente cristológicas.
2 - LÍNGUAS, CARACTERÍSTICAS E AUTORIDADE
2.1
Línguas em que a Bíblia Escrita
Quase todos os estudantes da
Bíblia sabem que o Velho Testamento foi escrito em hebraico, e o Novo, em
grego, mas muitos desconhecem o fato de que há uma terceira língua na Bíblia –
o aramaico.
2.1.1
Aramaico
O aramaico foi sem dúvida,
desde muito tempo, a língua popular de Babilônia e da Assíria, cuja linguagem
literária, culta e religiosa era o sumero-acadiano. Documentos assírios
mencionam o aramaico desde 1100
a .C. Durante o reinado de Saul e Davi, os estados
aramaicos ou sírios são mencionados na Bíblia (1Sm 14.47; 2Sm 8.3-9; 10.6-8). O
aramaico foi trazido para a Palestina porque os assírios seguiam costume de
transplantar os povos das nações subjugadas, por isso depois de terem vencido o
reino de Israel, trocaram as pessoas e as espalharam através de todo o seu
império. 2Rs 17.24 menciona explicitamente que entre os povos trazidos para
Samaria a fim de repovoarem a terra devastada, encontravam-se aramaicos de
Hamate. Esta língua dotada de grande poder de expansão, tornou-se usual nas
relações internacionais de toda a Ásia, e na própria Palestina propagou-se tão
largamente, que venceu o próprio hebraico.
O lar original do aramaico
foi a Mesopotâmia. Algumas tribos arameanos viviam ao sul de Babilônia, perto
de Ur, outras tinham seus lares na alta Mesopotâmia entre o rio Quebar (Khabúr)
e a grande curva do Eufrates, tendo Harã como centro. O fato de os patriarcas
Abraão, Isaque e Jacó terem conexões com Harã é provavelmente responsável pelo
estatuto feito por Moisés de que Jacó era "arameano". Dt 26.5. Deste
seu lar ao norte da Mesopotâmia o aramaico se espalhou para o sul de toda a
Assíria.
Tudo indica que o aramaico
foi preferido pelos assírios e babilônicos por ser mais simples do que a
complicada escrita cuneiforme. A prova de sua simplicidade está relatada em 2Rs
18.26, quando Senaqueribe invadiu Judá no fim do VIII século a.C. os oficiais
judeus que dominavam tão bem o hebraico quanto o aramaico, pediram ao general
assírio que lhes falasse em
aramaico. Esta ainda a razão porque durante os setenta anos
do cativeiro babilônico os judeus se esqueceram muito do hebraico, adotando em
seu lugar o aramaico. Ao voltarem do cativeiro continuaram falando o aramaico,
como se depreende da leitura de Neemias 8.1-3 e 8. O aramaico era a língua
usada por Jesus (Mc 5.41; 7.34; 15.34), pela maioria das pessoas na Palestina,
bem como pelas primeiras comunidades cristãs. Segundo outros estudiosos entre
os quais se destaca Robertson, Jesus falava aramaico na conversação diária, mas
no ensino público e nas discussões com os fariseus a língua usada era o grego.
Já antes da Era Cristã
suplantou totalmente o hebraico que se tornou a língua morta e exclusivamente
religiosa. Na Ásia Ocidental, a língua aramaica se difundiu largamente,
assumindo naquelas regiões e naquele tempo o mesmo papel que assumem em nossos
dias o francês e o inglês. O aramaico, embora ainda utilizado em certas
regiões, vai cedendo lugar ao árabe, e corre o perigo de desaparecer como
língua falada, pois hoje é falada somente em algumas povoações da Síria. O
aramaico desapareceu sob o impacto cultural do grego e do latim, já que deixou
de ser conhecido pelos cristãos.
Quem conhece o hebraico pode
com facilidade ler e entender o aramaico, dadas as suas marcantes semelhanças.
As partes do Velho Testamento escritas em aramaico são as seguintes: A
expressão "Jegar-Saaduta" de Gênesis 31.47; O verso de Jeremias
10.11; Alguns trechos de Esdras 4.8
a 6.18; 7.22-26; Partes do livro de Daniel, entre os
capítulos 2.4 a
7.28.
2.1.2
Hebraico
A língua hebraica foi a
língua dos Hebreus ou israelitas desde a sua entrada em Canaã. A sua origem é
bastante misteriosa, porque além do Velho Testamento só possuímos escassos
documentos para o seu estudo. O mais provável é que o hebraico tenha vindo do
cananeu e foi falado pelos israelitas depois de sua instalação na Palestina. A
atual escrita hebraica (chamada "hebraico quadrado") é cópia do
aramaico e entrou em uso pouco antes da nossa era, em substituição ao hebraico
arcaico. Os Targuns o denominam de "língua sagrada" (Is 19.18); e no
Velho Testamento é chamado "a língua de Canaã" ou a língua dos judeus
(Is 36.13, 2Rs 18.26-28). Salmo 114.1 mostra a grande diferença entre o
hebraico e o egípcio. Israel por estar cercado de povos que falavam uma língua
cognata – o aramaico – foi se esquecendo do hebraico, até que este veio a
extinguir-se como língua falada. Era ainda a língua de Jerusalém no tempo de
Neemias (13.24), cerca de 430
a .C., mas muito antes do tempo de Cristo foi substituída
pelo aramaico.
O alfabeto hebraico consta
apenas de consoantes, em número de 22. O hebraico é escrito da direita para a
esquerda como o árabe e algumas outras línguas semíticas. Sua estrutura
fundamental é, como em todas as línguas semíticas, a palavra raiz, composta de
três consoantes. É uma língua bastante simples, seus melhores conhecedores
sublinham sem hesitação a sua pobreza, quando comparado com o grego ou com
línguas modernas, como o inglês e o português. De acordo com a Pequena
Enciclopédia Bíblica o vocabulário hebraico na Bíblia conta com apenas 7.704
vocábulos diferentes. A Academia do Idioma Hebraico tem registrado o uso de
cerca de 30.000 palavras. Quase não possui adjetivos nem pronomes possessivos,
porém, é rica em advérbios. É uma língua quase indigente em termos abstratos.
Quase sempre os pronomes
pessoais são ligados às formas verbais como se fossem sufixos ou prefixos. Com
raras exceções não faz uso de palavras compostas. O alfabeto hebraico possui
letras com sons bem próprios, por isso não apresentam nenhuma semelhança com o
nosso alfabeto. Os dois exemplos mais característicos se encontram no
"alef" e no "ayin". Se língua é um organismo vivo que se
transforma, o hebraico quase pode apresentar-se como exceção, como comprovam os
escritos de Moisés e de alguns profetas mil anos depois, cujas diferenças
lingüísticas são insignificantes. Este fato tem levado a "alta
crítica" a dogmatizar que os escritos do Velho Testamento foram produzidos
num espaço de tempo bem pequeno.
Seus processos sintáticos
são muito simples, usando pouco as orações subordinadas, preferindo sempre as
coordenadas, quase sempre unidas pela conjunção "e" como inegável
influência do hebraico. Os tempos do verbo, a exemplo do grego, indicam mais o
"aspecto" da ação, conforme ela seja momentânea, prolongada ou
repetida. Como língua semítica não classifica os fatos em passados, presentes e
futuros, mas em realizados ou de ação acabada (perfeito), e não realizados ou
de ação inacabada (imperfeito).
Uma das peculiaridades da
língua hebraica com respeito ao sistema verbal é esta: a simples troca de um
sinal vocálico determina uma mudança nas formas verbais. Não possui o verbo
"ter", enquanto o verbo "ser" é ativo e significa existir
eficazmente. Quando os judeus sentiram que o hebraico estava em declínio como
língua falada, e que sua leitura correta ia perder-se, criaram um sistema de
vocalização. Este trabalho foi feito pelos massoretas, por isso o texto
hebraico usado hoje chama-se massorético.
2.1.3
Grego Bíblico
Como é do conhecimento
geral, o Novo Testamento foi escrito na Koinê, língua na qual também foi
traduzido o Velho Testamento hebraico pelos Setenta. O termo Koinê significa a língua comum do povo entre os
anos 330 a .C.
e 330 a .D.
Com exceção da Epístola aos Hebreus e da linguagem de Lucas (Evangelho e Atos)
que se encontram num Koinê mais
literário, os outros escritos pertencem à língua mais comum ou Koinê vulgar. O insigne erudito Gustav Adolf
Deissmann foi quem primeiro mostrou a identidade do grego do Novo Testamento,
salientando que o grego da Bíblia era o Koinê, e não o grego erudito, nem a
chamada "linguagem do Espírito Santo" ardorosamente defendida por
alguns autores.
2.1.3.1
Características da Linguagem do Novo Testamento
Se fosse possível caracterizar
o Koinê, língua em que foi escrito o Novo Testamento, sintetizando-a em uma
palavra, a melhor seria "simplificação". Esta conclusão é facilmente
deduzida estudando-lhe as características: Substituição dos casos pelas
preposições; tendência para simplificar a morfologia e a sintaxe; uso escasso
de orações subordinadas, tendo preferência pelas coordenadas ligadas pela
conjunção "e"; eliminação do dual e uso parcimonioso do modo
optativo, aparecendo apenas 67 vezes no Novo Testamento; uso mais freqüente do
artigo; simplificação das riquíssimas formas verbais do grego clássico; mudança
de sentido de muitas palavras do grego clássico, por influência religiosa, tais
como: batizar, justiça, graça, amor, glória, carne, cruz, mundo, crer,
espírito, cálice, dia, etc.; as formas diminutivas se tornam mais comuns;
emprego mais generalizado de construções perifrásticas nos verbos; os adjetivos
são mais usados no grau superlativo do que no comparativo; preferência pela
ordem mais direta, pois no grego clássico predomina a ordem inversa; emprego
freqüente dos pronomes sujeitos, em casos dispensáveis, por estarem eles
subentendidos nas desinências verbais; idêntico valor fonético para as vogais
gregas; emprego de vários latinismos, tais como: legião, centurião, denário,
colônia e flagelo; uso freqüente do presente histórico nas narrativas;
aparecimento generalizado da parataxe, com prejuízo da hipotaxe.
Parataxe é uma construção
mais simples da frase, como as orações coordenadas, enquanto a hipotaxe é mais
complexa, isto é, formada de orações subordinadas; uso de palavras que são
empréstimos diretos do aramaico, a exemplo de: geena, Eli Eli, Hosana,
litóstrotos (gabatá), Satã, Talita cumi, Rabi, Maranata; freqüência de
hebraísmos, sobretudo na sintaxe, fastidioso emprego da conjunção
"e", pois esta partícula aparece muito no Novo Testamento, em
expressões como estas: "e ele falou dizendo", "e disse",
"e aconteceu que". As frases: "Filhos da luz'; "filhos da
perdição" são eminentemente semíticas.
Quanto à linguagem dos
escritores do Novo Testamento haveria muito que dizer, mas fiquemos somente com
as seguintes observações: Apenas Hebreus, Lucas e alguns trechos de Paulo são
escritos num estilo mais literário.
O vocabulário mais rico não
é o de Paulo, mas sim o de Lucas, que emprega 250 palavras novas no Evangelho
e, mais ou menos 500, em
Atos. Se a linguagem mais polida e mais erudita é a de Lucas,
a mais pobre e menos aprimorada, quanto ao estilo, é a de Marcos e a de João,
especialmente no Apocalipse. O doutor Benedito P. Bittencour no livro O Novo
Testamento, página 67, chama-nos a atenção para a linguagem pouco aprimorada do
Apocalipse, onde há violações flagrantes dos corretos cânones da gramática.
A Bíblia é um fenômeno que
só é explicável de um modo: é a Palavra de Deus. Ela não é o tipo de livro que
o homem escreveria se pudesse, ou que poderia escrever se quisesse. Outros
sistemas religiosos também têm seus desvios excêntricos do curso comum do
procedimento humano, desvios esses que não são muitos, e são de pequena
importância; e estes, realmente, são de se esperar, considerando que o homem
está sempre determinado a crer em
um Deus , ou deuses, quer sua crença seja baseada em fatos ou
não. O estudante da verdade sempre será convidado a reconhecer contra
reivindicações extra-bíblicas e intrabíblicas. Aquilo que é extrabíblico
encampa todo o campo das religiões humanamente arquitetadas e especulações
filosóficas. O que é intrabíblico encampa todos os cultos e declarações parciais
da verdade divina que, embora professem edificar seus sistemas sobre as
Escrituras, fazem-no, entretanto, através de falsas ênfases ou negligência da
verdade, provocando uma confusão de doutrina que é parente ou talvez até mais
desencaminhadora do que o erro sem mistura. Embora não seja possível apresentar
uma lista exaustiva, enumeramos aqui alguns dos muitos aspectos sobrenaturais
da Bíblia:
2.2.1
O Livro de Deus
Com este título queremos
chamar a atenção para a reivindicação que a Bíblia apresenta de que é a
mensagem de Deus ao homem e não uma mensagem do homem aos outros homens, muito
menos uma mensagem do homem a Deus. Neste Livro, Deus é apresentado como o
Criador e Senhor de tudo. É a revelação dele próprio, o registro do que Ele tem
feito e vai fazer, e, ao mesmo tempo, a revelação do fato de que cada coisa
está sujeita a Ele e que só descobre suas vantagens mais elevadas e seu destino
quando se conforma à Sua vontade. Cada palavra da Bíblia é o resultado de
sublimes declarações como esta: "Não há Deus como tu, em cima nos céus nem
em baixo da terra" (1Rs 8.23), e, novamente: "Tua, Senhor, é a
grandeza, o poder, a honra, a vitória e a majestade; porque teu é tudo quanto
há nos céus e na terra; teu, Senhor, é o reino, e tu te exaltaste por chefe
sobre todos" (1Cr 29.11). "Senhor, Senhor Deus compassivo, clemente e
longânimo, e grande em misericórdia e fidelidade" (Êx 34.6). "As suas
ternas misericórdias permeiam todas as suas obras" (SI 145.9). Quem, entre
a humanidade cega, seria o escritor de ficção capaz de criar os conceitos de um
Deus triúno de toda a eternidade que se encontra nas páginas das Escrituras?
Quem, entre os homens, planejou o peculiar e perfeito equilíbrio das partes de
cada Pessoa da Divindade na redenção, ou o caráter divino na sua consistente e
inalterável exibição de santidade infinita e amor infinito: os juízos divinos,
a avaliação divina de todas as coisas, inclusive das hostes angélicas e dos
espíritos do mal? Quem, entre os homens, já foi capaz de conceber a criação de
tais noções interdependentes, além de expressá-Ias perfeitamente numa história
em andamento, a qual, sendo acidental, afinal não passa de imitação: uma
imitação hipócrita e dissimulada da verdade? Que absurda é a presunção de que o
homem sozinho poderia escrever a Bíblia, se assim o quisesse! Mas se o homem
não deu origem a Bíblia, Deus o fez, e por causa disso sua autoridade tem de
ser reconhecida.
2.2.2
A Bíblia e o Monoteísmo
O fato de que Deus é supremo
implica em que não há nenhum outro que se lhe compare; mas quase universalmente
a humanidade tem praticado, com uma contumácia que está longe de ser acidental,
as abominações da idolatria. O povo judeu, de quem, considerando o lado humano,
vieram as Escrituras, não ficaram imunes a esta tendência. Desde os dias do
bezerro de ouro, através dos séculos seguintes, os israelitas estiveram sempre
revertendo à idolatria e isto apesar da abundância de revelação e castigo. A
história da igreja está manchada pelo culto de imagens esculpidas assimiladas
do paganismo. Com que insistência o Novo Testamento adverte os crentes a fugir
da idolatria e da adoração dos anjos! À luz destes fatos, como poderíamos supor
que os homens (até mesmo Israel) pudessem, à parte da direção divina, dar
origem a um tratado que, com os olhos apenas na glória de Deus, estigmatiza a
idolatria como um dos primeiros e mais ofensivos crimes e insultos contra Deus?
A Bíblia não é o tipo de livro que o homem escreveria se pudesse.
2.2.3
A Doutrina da Trindade
Embora defendendo o
monoteísmo sem modificação, a Bíblia apresenta o fato de que Deus subsiste em três Pessoas ou modos
de ser. A doutrina bíblica da Trindade consiste em que Deus é um em
essência, mas três Pessoas em identificação. Sem dúvida, este é um dos grandes
mistérios. A doutrina vai além do alcance da compreensão humana, embora seja
fundamental na revelação divina. Quando consideradas separadamente, as Pessoas
individuais da Divindade apresentam as mesmas evidências indiscutíveis quanto à
origem sobrenatural da Bíblia.
Deus
Pai.
Vasto realmente é o campo das Escrituras que apresenta as atividades e as
responsabilidades distintivas que são características da Primeira Pessoa.
Dizemos que Ele é o Pai de toda a criação, o Pai do Filho eterno (a Segunda
Pessoa) e o Pai de todo aquele que crê para a salvação de sua alma. Esta
revelação estende-se a todos os detalhes do relacionamento paternal e inclui a
dádiva do Filho para que a graça de Deus pudesse ser revelada. Nenhuma mente
humana poderia dar origem ao conceito de Deus Pai como Ele é revelado na
Bíblia.
Deus
Filho. O registro referente à Segunda Pessoa, que, de acordo
com a Palavra de Deus, é o Filho desde a eternidade, que sempre é a
manifestação do Pai e que, embora esteja agora sujeito ao Pai, é o Criador das
coisas materiais, o Redentor e Juiz final de toda a humanidade, oferece as
evidências mais extensas e mais incomensuráveis da origem divina das
Escrituras. A Pessoa e a obra do Filho de Deus com Sua humilhação e glória é o
tema dominante da Bíblia; mas o Filho, em troca, dedica-se à glória do Pai. As
perfeições do Filho não podem nunca ser comparadas ao mais sábio dos homens,
nem compreendidas por ele. Se, afinal, esta revelação ilimitada do Filho não
passa de ficção, não seria um desafio razoável (mesmo para a mente não
regenerada) que este suposto autor fosse descoberto e, com base no truísmo de
que a coisa criada não pode ser maior do que o seu criador, fosse adorado e
reverenciado acima de tudo o que é chamado de Deus?
Deus
Espírito. O Espírito Santo que é apresentado na revelação como
igual em cada particular ao Pai e ao Filho, é, não obstante e para a promoção
dos atuais empreendimentos divinos, retratado como sujeito a ambos, o Pai e o
Filho. Do mesmo modo, Seu serviço é considerado como complemento e
administração da obra do Pai e do Filho.
Assim o Deus triúno
revelou-se ao homem em termos que o homem, mesmo quando ajudado pelo Espírito,
só pode compreender debilmente; e que pueril é a intimação de que estas
revelações são o produto dos homens que sem exceção desde os dias de Adão são
depravados, degenerados e incapazes de receber ou conhecer as coisas de Deus à
parte da iluminação divina! Tal conceito propõe nada menos que a presunção de
que o homem deu origem à idéia de Deus, e que o Criador é um produto da
criatura.
2.2.4
A Continuidade da Bíblia
A continuidade da mensagem
da Bíblia é absoluta em sua inteireza. Ela se mantém coesa por sua seqüência
histórica, tipos e antítipos, profecias e seu cumprimento e por antecipação,
apresentação, realização e exaltação da Pessoa mais perfeita que jamais andou
sobre a terra e cujas glórias são o resplendor do céu. Mas a perfeição desta
continuidade se mantém contra o que para o homem seriam impedimentos
insuperáveis; pois a Bíblia é uma coleção de sessenta e seis livros que foram
escritos por mais de quarenta diferentes autores: reis, camponeses, filósofos,
pescadores, médicos, políticos, mestres, poetas e lavradores, que viveram suas
vidas em diversos países e não experimentaram nenhum contato ou concordância
entre si, e durante um período de não menos que mil e seiscentos anos de
história humana. Por causa destes obstáculos de continuidade, a Bíblia seria
naturalmente a coleção mais heterogênea, mais desigual, mais inconsonante e
contraditória de opiniões humanas que o mundo já viu; mas, pelo contrário, ela
é exatamente o que pretende ser, isto é, uma narrativa homogênea, ininterrupta,
harmoniosa e ordeira de toda a história do relacionamento de Deus com o homem.
Este livro contendo muitos
livros não recebeu a impressão idiossincrática de muitas mentes. Sua harmonia
não é a de trombetas tocadas em uníssono, mas, antes, uma orquestração em que,
embora absolutamente afinada distingue-se perfeitamente os instrumentos. Em que
base esta continuidade plenária poderia ser explicada se afirmássemos que a
Bíblia não é a Palavra de Deus?
2.2.5
Profecia e seu Cumprimento
Um grandíssimo número de
profecias foram feitas pelos escritores do Antigo Testamento relativamente à
vinda do Messias e foram centenas, algumas vezes milhares de anos antes da vinda
de Cristo. Essas predições que no propósito divino deveriam se cumprir no
primeiro advento de Cristo cumpriram-se literalmente nessa ocasião. Muitas mais
permanecem sem cumprimento até que Ele volte e, temos motivos para crer, elas
se cumprirão com a mesma precisão. Bastariam dois vaticínios feitos e
cumpridos, como os do nascimento virginal de Cristo que aconteceu em Belém de
Judá, e o caráter sobrenatural das Escrituras estaria comprovado pela história
que registra sua realização; mas quando estas predições chegam a milhares
relativamente às Pessoas da Divindade, aos anjos, às nações, às famílias, aos
indivíduos e aos destinos, sendo cada uma delas executada exatamente no tempo e
lugar prescritos, a evidência é incontestável quanto ao caráter divino das
Escrituras.
2.2.6
Tipos com seus Antítipos
Um tipo é um esboço divino
que descreve um antítipo. E a ilustração de uma verdade divina feita pela
própria mão de Deus. O tipo e o antítipo estão relacionados entre si pelo fato
de que a verdade ou o princípio conectivo encontra-se incorporado em cada um
deles. Não é prerrogativa do tipo estabelecer a verdade de uma doutrina; antes,
ele realça a força da verdade apresentada no antítipo. Por outro lado, o
antítipo serve para destacar o tipo no seu lugar comum, colocando-o naquilo que
é transcendental, investindo-o com as riquezas e os tesouros até então não
revelados. O tipo do Cordeiro Pascal transborda da graça redentora de Cristo
com riqueza de significado, enquanto a própria redenção investe o tipo do Cordeiro
Pascal de todo o seu maravilhoso significado. A continuidade das Escrituras, a
profecia e o seu cumprimento, e os tipos com os seus antítipos, são os três
fatores principais que não só servem para apresentar a unidade dos dois
Testamentos, como fios entretecidos que passam de um Testamento para outro,
ligando-os em um único material, mas também servem para traçar o desenho que
pelo seu maravilhoso caráter glorifica o Desenhista. Assim, a tipologia
conforme se encontra na Bíblia demonstra que a Bíblia é um livro que o homem
não poderia escrever se quisesse. É divina em sua origem como é sobrenatural em
seu caráter.
2.2.7
Revelação e Razão
A
Teologia Sistemática extrai o seu material tanto da revelação quanto da razão,
embora a porção fornecida pela razão seja incerta quanto à autoridade e, quando
muito, restrita a um ponto insignificante. A razão, como aqui está sendo
considerada, indica as faculdades intelectuais e morais do homem exercitadas na
busca da verdade e à parte de ajuda sobrenatural. Desde que Adão andou e falou
com Deus (revelação essa que ele sem dúvida comunicou à sua posteridade),
nenhum homem na Terra poderia ficar totalmente alheio à revelação divina.
Dentro dos limites circunscritos daquilo que é humano, a razão é predominante;
mas, quando comparada com a revelação divina, ela é falível e limitada.
2.2.7.1
Revelação
Entendemos que revelação é a
manifestação que Deus faz de Si mesmo e a compreensão, parcial embora, da mesma
manifestação por parte dos homens. Este modo de definir a revelação acentua que
o que se revela é o próprio Deus, e não apenas alguma coisa a respeito de Deus.
Na revelação, Deus faz-se conhecido dos homens na sua personalidade e nas suas
relações. Revelar é informar, e isto é justamente o que Deus há feito. “Fez
conhecidos os seus caminhos a Moisés, e os seus feitos aos filhos de Israel”
(Salmos 103.7). Deus informou ao homem acerca de Sua Pessoa e das Suas relações
com a criação. Não nos esqueçamos de que o centro de toda a revelação é a
pessoa de Deus. Jesus frisou bem esta verdade quando disse que veio revelar o
Pai: “Quem me vê a mim, vê o Pai”.
A revelação não tem por fim
simplesmente informar o homem acerca de Deus, mas também descobrir Deus ao
homem. Deus quer que o homem o conheça; daí a razão de ele se revelar. “Os céus
declaram a glória de Deus e o firmamento anuncia a obra das suas mãos. Um dia
faz declaração a outro dia, e uma noite mostra sabedoria a outra noite. Não há
linguagem nem fala onde se não ouçam as suas vozes. A sua linha se estende por
toda a terra, e as suas palavras até o fim do mundo” (Salmos 19.1-4).
2.2.7.2
Inspiração
Por inspiração entendemos a
operação pela qual Deus garantiu o conteúdo da Bíblia como autêntica expressão
de sua revelação. Agora perguntamos: Que referência encontramos na própria
Bíblia a essa inspiração divina? O texto mais explícito é aquele que se
encontra em 2 Timóteo 3.16: "Toda Escritura é divinamente inspirada e
proveitosa para ensinar, para repreender, para corrigir, para instruir em
justiça”. O termo grego usado no original é theopneostos, composto de duas palavras gregas: theós. "Deus", e pnéo, "soprar",
"respirar". Este termo grego é que foi traduzido por inspirado por Deus. A Escritura
inspirada por Deus é a que Timóteo havia aprendido desde a sua meninice e que
no versículo anterior se menciona como "Sagradas Escrituras”. Este termo
grego não se usa em outra parte do Novo Testamento, mas uma idéia similar
encontra-se em 2 Pedro 1.21: "Porque a profecia nunca foi produzida por
vontade dos homens, mas os homens da parte de Deus falaram movidos pelo
Espírito Santo". No versículo anterior, fala-se de Deus como o sujeito da
inspiração; no segundo, em 2 Pedro, fala-se mais especificamente do Espírito
Santo nessa mesma função. E, embora aqui o termo grego seja o particípio pheromenos, de um verbo que, entre
outros significados, tem o de "ocasionar", "causar",
"trabalhar", os dois versículos têm o mesmo sentido. Vale a pena
mencionar o comentário que se encontra na obra de Bonnet e Schroeder sobre 2
Timóteo 3.16:
O apóstolo Paulo se contenta
em expressar claramente este grande fato que é a base e a garantia de todas as
revelações divinas. Mas não expõe nem justifica nenhum sistema humano sobre o
modo, a natureza, a extensão da inspiração, tampouco sobre a parte de Deus e do
homem na composição das Escrituras. A exegese não pode ir mais longe; tudo mais
pertence à dogmática (BONNET, 1968, p. 707).
Assim é, mas, por amor à
verdade, devemos dizer que para o apóstolo Paulo seu Antigo Testamento era a
Palavra de Deus, sem nenhuma outra consideração, e deve-se ter isto em mente
quando se quer refletir dogmaticamente sobre a natureza, extensão ou modo da
inspiração.
2.2.7.2.1
Teoria evangélica da inspiração
Com este título queremos
dizer que nos ocuparemos do conceito de revelação tal como este é em geral
entendido nos meios evangélicos, sem que isto signifique, entretanto, um acordo
total na terminologia e na exposição do assunto. Lacy, por exemplo, afirma
"que a inspiração como Escrituras foi sobrenatural, dinâmica e plena”. Grau,
por sua vez, sustenta que positivamente a inspiração bíblica é orgânica, plena
e verbal. Mas, apesar das diferenças, existe, de modo geral, acordo sobre este
tema, como destacamos a seguir.
O Espírito Santo trabalhou
nos escritores de acordo com a sua maneira de ser, aproveitando a
idiossincrasia pessoal e cultural. Iluminou suas mentes, guiou sua memória e
controlou a influência do pecado e do erro para que seu trabalho não
malograsse. Não obstante, deixou-os expressar-se à sua maneira em tudo, segundo
o seu estilo e vocabulário e de acordo com o seu tempo. Não se pode negar que
haja, nos diferentes autores, diferenças de estilo e peculiaridades que os
caracterizam. Não há erros nem defeitos, mas as características são percebidas
na expressão de cada autor.
A personalidade do escritor
não foi anulada. Muitos dos livros da Bíblia contêm passagens que revelam que a
preparação prévia e as características pessoais do autor foram utilizadas pelo
Espírito Santo. Não podemos discordar dessas afirmações, visto que há
evidências nas Escrituras de que isto se deu desta forma. É claro, por exemplo,
que o estilo literário de Isaías difere do de Amós; o estilo do Evangelho de
Lucas difere do de Marcos; e a epístola de Tiago difere sob este aspecto da de
João. Aliás, no mesmo autor, em circunstâncias diferentes, encontramos também
estilos diferentes. Para verificar isto, basta comparar Romanos com Filipenses.
Essa combinação do divino
com o humano não é algo que apareça apenas na composição das Escrituras, afirmam
os teólogos; vemo-Ia, igualmente, na pessoa de nosso Senhor Jesus Cristo:
verdadeiramente homem e verdadeiramente Deus. Assim, as Escrituras são obra de
Deus, sem deixar de mostrar, por ele mesmo, a particularidade do instrumento
humano.
A posição adotada pelos
teólogos protestantes mais antigos e importantes é que, seja qual for a
definição que se dê à inspiração, todo o cânon atual, como o temos, participa
dela. O sentido original grego da expressão "toda escritura",
encontrada em 2 Timóteo 3.16, refere-se a cada um dos escritos sagrados. [...]
E esta Sagrada Escritura, em cada uma de suas partes e livros, é inspirada.
Essa inspiração para a totalidade do conteúdo da Bíblia é o que o autor
denomina "inspiração plena".
Este conceito de que a inspiração divina protege a totalidade dos livros
bíblicos de erros não nos deve levar a pensar, disse Hammond, que não haja
diferença alguma nos propósitos da inspiração. Trata-se, em verdade, de
entender que, enquanto todas as Escrituras são plenamente autorizadas por Deus,
diferem no tocante à aplicação e ao propósito
para o qual foram inspiradas. Diferem sobretudo quanto à aplicação essencial, mais do que em
relação ao grau da inspiração.
O estudioso deve manter-se prevenido contra uma observação como esta: "O
Evangelho de João é mais inspirado
do que Eclesiastes".
2.2.8
A iluminação
É aquela influência ou
ministério do Espírito Santo que capacita todos os que estão num relacionamento
correto com Deus para entender as Escrituras. Acerca de Cristo se escreveu que
Ele "abriu" o entendimento deles em relação às Escrituras (Lc
24.32-45). O próprio Cristo prometeu que, quando o Espírito viesse, Ele
"guiaria" em toda a verdade.
Finalmente,
tanto a revelação como a inspiração pode ser diferenciada da iluminação em que
a última é prometida a todos os crentes; que ela admite graus, uma vez que
aumenta ou diminui; que não depende de
escolha soberana, antes, de ajustamento pessoal ao Espírito de Deus; e sem ela
ninguém nunca seria capaz de aceitar a salvação pessoal (1Co 2.14), ou o
conhecimento da verdade revelada de Deus.
Podemos dizer que no passado
Deus se revelou aos homens; inspirou os homens para que tenhamos hoje um
testemunho digno de fé de sua revelação. No passado, Deus dirigiu o processo
pelo qual sua revelação chegou até nós sob a forma de uma bíblia. É evidente que de tudo isto
surge claramente a autoridade da Bíblia como Palavra de Deus nos assuntos de fé
e prática. Ou, como diz o pacto de Lausanne: "Afirmamos a inspiração
divina, a veracidade e a autoridade de ambos os Testamentos, o Antigo e o Novo,
em sua integridade, como a única Palavra de Deus escrita, e a única e infalível
regra de fé e prática".
A obra de Hammond trata este
assunto recordando que há três fontes possíveis da autoridade em assuntos de
religião: a razão, a igreja e a Bíblia. Estas três fontes têm de ser necessariamente
incompatíveis, mas, como exceção, às vezes se combinam. Da razão, "em
alguns casos a manipulação racionalista de certos aspectos da fé tem gravemente
desviado os homens" (HAMMOND, 1978, p. 51) da igreja, afirma que "tem um lugar de autoridade, mas só em subordinação à
Palavra de Deus" (HAMMOND, 1978, p. 52) da Bíblia, conclui que "não
há palavras suficientes para destacar a importância de acatar, bem longe de
toda dúvida, a autoridade insubstituível das Escrituras Sagradas em tudo o que
se refere à religião, quer se trate da doutrina, quer da prática"
(HAMMOND, 1978, p. 53). Nossa última palavra sobre este assunto é uma citação
de Donald G. Bloesch. Esse autor afirmou que a autoridade final não é da
Escritura em si, mas do Deus vivo que, por meio de Jesus Cristo, é quem nos
fala; e afirma:
Devemos, sem dúvida,
continuar dizendo que a autoridade absoluta de fé, o próprio Cristo vivo,
identificou-se de tal maneira com o testemunho histórico concernente à sua
auto-revelação, mais precisamente as Escrituras Sagradas, que estas participam,
necessariamente, da autoridade de seu Senhor. A Bíblia deve ser distinguida de
seu fundamento e de sua meta, mas não pode separar-se deles. E por isso que
Forsyth afirmou: “A Bíblia não é
meramente um registro da revelação; é parte da revelação. Não é uma
pedreira de dados para o historiador; é uma fonte de vida para a alma”.
(BLOESCH, 1978, p. 63).
Tem-se dito que a Bíblia
necessita, pela dificuldade de entender o seu conteúdo, de uma interpretação
infalível que evite que o estudioso não especializado incorra em erro em sua
interpretação. A posição que, desde o tempo da Reforma, os evangélicos têm
sustentado é a de que o cristão é um juiz idôneo para julgar o conteúdo da
revelação bíblica. Disse Hammond: "Sustentamos que as Escrituras são
capazes de oferecer seu significado correto em todas as idades e circunstâncias
em que se encontre o homem, sempre que este esteja disposto a ser ensinado pelo
Espírito Santo e a obedecer-Ihe" (BLOESCH, 1978, p. 46). Não podemos
colocar uma instância superior à clara mensagem da Bíblia, seja esta um
teólogo, uma igreja ou uma denominação. Isto não significa que não façamos uso
de todas as informações possíveis à nossa disposição para não nos enganarmos ao
interpretar a Palavra de Deus. Um princípio de saudável hermenêutica, sem
entrar nas complicadas considerações que a teologia atual tem a respeito deste
tema, é que um texto se esclarece por seu contexto, seja ele imediato ou
mediato. E o contexto mediato, ou distante, de um texto, é, em última análise,
a própria Bíblia, o conteúdo total da revelação. Em outras palavras, a Bíblia
contém em si a informação necessária para interpretar de forma correta qualquer
passagem que ofereça dificuldade. E conquanto usemos a ajuda humana para
entender o conteúdo da Bíblia, não nos esqueçamos de que, em última instância,
é a Bíblia que julga tal ajuda.
3 - DISPENSAÇÕES, ALIANÇAS E COMPOSIÇÃO
3.1
Dispensações e Alianças
O que é uma Dispensação?
Como medida de tempo, uma dispensação é um período que se identifica pelo seu
relacionamento a algum propósito particular de Deus, um propósito a ser
realizado dentro desse período. As primeiras dispensações, tão remotas do
presente, não estão muito claramente definidas como as últimas dispensações.
Por causa disto, os expositores da Bíblia nem sempre concordam quanto aos
aspectos preciosos dos períodos mais remotos. Portanto, uma Dispensação é um
período de tempo no qual o homem é testado na sua obediência a alguma revelação
específica da vontade de Deus. O propósito de cada dispensação, portanto, é
colocar o homem sob uma específica regra de conduta, mas tal mordomia não é uma
condição de salvação. Em cada uma das dispensações passadas, o homem não
regenerado fracassou, e ele tem fracassado nesta presente dispensação e
fracassará no futuro. Mas a salvação tem sido e continuará sendo dispensada
pela graça de Deus mediante a fé. Algumas das divisões dispensacionais – sete -
óbvias são as seguintes:
a)Inocência
(Gn 1.28).
b)Consciência
ou Responsabilidade Moral (Gn 3.7).
c) Governo
Humano (Gn 815).
d)Promessa
(Gn 12.1).
e)Lei
(Êx 19.1).
f) Igreja
(Atos 2.1).
g)Reino
(Ap 20.4).
Uma aliança é um
pronunciamento soberano de Deus através do qual Ele estabelece um
relacionamento de responsabilidade:
a)Entre
Ele mesmo e um indivíduo (por exemplo, com Adão na Aliança Edênica, Gn 2.16 e
segs.).
b)Entre
Ele mesmo e a humanidade em geral (por exemplo, na promessa da Aliança Noética
de nunca mais destruir toda a carne com um dilúvio, Gn. 9.9 e segs.).
c) Entre
Ele mesmo e uma nação (por exemplo, com Israel na Aliança Mosaica, Êx 19.3 e
segs.).
d)Entre
Ele mesmo e uma família humana específica (por exemplo, com a casa de Davi na
promessa de uma linhagem real perpetuada na Aliança Davídica, 2Sm 7.16 e
segs.).
São oito as principais
alianças de significado especial que explicam o resultado dos propósitos de
Deus para com o homem. São:
a)Edênica
(Gn 2.16).
b)Adâmica
(Gn 3.15)
c) Noética
(Gn 9.16)
d)Abraâmica
(Gn 12.2)
e)Mosaica
(Êx 19.5)
f) Palestiniana
(Dt 30.3)
g)Davídica
(2Sm 7.16)
h)Nova
Aliança (Hb 8.8)
3.1.1
A Primeira Dispensação: Inocência, Gn 1.28
O homem foi criado em
inocência, colocado em um ambiente perfeito, sujeito a uma prova simples, e
advertido das conseqüências da desobediência. Ele não foi compelido a pecar,
mas, tentado por Satanás, preferiu desobedecer a Deus. A mulher foi enganada; o
homem transgrediu deliberadamente (1Tm 2.14). A mordomia da Inocência terminou
na sentença da expulsão do Éden (Gn 3.24).
3.1.2
A Primeira Aliança: Edênica
Exigia as seguintes
responsabilidades da parte de Adão:
a)Propagar
a raça.
b)Sujeitar
a terra ao homem.
c) Dominar
a criação animal.
d)Cuidar
do jardim e comer os seus frutos e ervas.
e)Abster-se
de comer de um único fruto, da árvore do conhecimento do bem e do mal, com a
penalidade da morte para a desobediência.
3.1.3
A Segunda Dispensação: Consciência (Responsabilidade Moral), Gn 3.7
O homem pecou (Gn 3.6-7), a
primeira promessa de redenção estava para ser feita (Gn 3.15), e nossos
primeiros pais seriam expulsos do Éden (Gn 3.22-24). O pecado do homem foi uma
rebeldia contra uma ordem específica de Deus (Gn 2.16-17) e marcou uma
transição do conhecimento teórico do bem e do mal para o conhecimento
experimental (Gn 3.5-7,22). O homem pecou entrando no reino da experiência
moral pela porta errada, quando poderia tê-lo feito fazendo o que era certo.
Assim o homem tornou-se igual a Deus, através de uma experiência pessoal da
diferença entre o bem e o mal, mas também diferente de Deus, passando por esta
experiência, no escolher o mal e não o bem. Assim ele foi colocado por Deus sob
a mordomia da responsabilidade moral, ficando responsável de praticar todo o
bem conhecido, abster-se de todo o mal conhecido e aproximar-se de Deus por
meio do sacrifício sangrento aqui instituído, em perspectiva à obra consumada
de Cristo. O resultado é apresentado na Aliança Adâmica (Gn 3.14-21). O homem
falhou no teste que lhe foi apresentado nesta dispensação (Gn 6.5), como nas
outras. Embora, como teste específico, este período de tempo tenha terminado
com o dilúvio, o homem continuou em sua responsabilidade moral conforme Deus
acrescentou mais revelação referente a Si mesmo e à Sua vontade nos períodos
subseqüentes.
3.1.4
Segunda Aliança: Adâmica, Gn 3.15
Condiciona a vida do homem
caído - condiciona o que tem de permanecer até que, na dispensação do reino,
"a própria criação será redimida do cativeiro da corrupção, para a
liberdade da glória dos filhos de Deus" (Rm 8.21). Os elementos da aliança
são:
a)A
serpente, instrumento de Satanás, é amaldiçoada (Gn 3.14; Rm 16.20; 2Co
11.3,14; Ap 12.9) e transforma-se na advertência viva de Deus na natureza dos
efeitos do pecado - da mais linda e mais sutil das criaturas, em um réptil
repugnante.
b)A
primeira promessa de um Redentor (v. 15). Aqui começa "o caminho da
Semente": Abel, Sete, Noé (Gn 6.8-10), Sem (Gn 9.26-27), Abraão (Gn
12.1-4), Isaque (Gn 17.19-21), Jacó (Gn 28.10-14), Judá (Gn 49.10), Davi (2Sm
7.5-17), Cristo-Emanuel (Is 7.10-14; Mt 1.1,20-23; Jo 12.31-33; 1Jo 3.8).
c) A
condição da mulher mudou (v. 16) em três aspectos: a) concepção multiplicada;
b) sofrimento (dores) na maternidade; c) o senhorio do homem (Gn 1.26-27). A
desordem do pecado faz necessário que haja um senhorio; ele é concedido ao
homem (Ef 5.22-25; 1Co 11.7-9; 1Tm 2.11-14).
d)O
trabalho leve do Éden (Gn 2.15) mudou para trabalho cansativo (3.18-19), por
causa da maldição lançada sobre a terra (3.17).
e)O
inevitável sofrimento da vida (v.17).
f) A
brevidade da vida e a certeza trágica da morte física de Adão e de todos os
seus descendentes (v. 19; Rm 5.12-21).
3.1.5
A Terceira Dispensação: Governo Humano, Gn 8.15
Esta dispensação começou
quando Noé e sua família saíram da arca. Quando Noé entrou numa nova situação,
Deus (na Aliança Noética) sujeitou a humanidade a um novo teste. Antes disso,
nenhum homem tinha o direito de tirar a vida de outro homem (Gn
4.10-11,14-15,23-24). A mais alta função do governo é proteger a vida humana,
da qual deriva a responsabilidade da pena capital. O homem não deve vingar o
homicídio individualmente, mas, na qualidade de grupo corporativo, ele deve
salvaguardar a santidade da vida humana como um dom de Deus, que não pode ser
exterminado, exceto quando Deus o permite. "Os poderes constituídos foram
ordenados por Deus", e resistir-lhes é resistir a Deus. Enquanto, na
dispensação precedente, as restrições feitas ao homem eram internas (Gn 6.3), o
Espírito de Deus operando através da responsabilidade moral, agora uma nova
restrição externa foi acrescentada, isto é, o poder do governo civil.
O homem fracassou em
governar com justiça. Este fracasso foi visto de um modo geral, na confusão de
Babel (Gn 11.9). Como uma prova específica da obediência, a dispensação do
Governo Humano foi seguida, pela da Promessa, quando Deus chamou Abrão como Seu
instrumento de bênção para a humanidade. Contudo, a responsabilidade do homem
pelo governo não acabou, mas continuará até que Cristo estabeleça o Seu reino.
3.1.6
A Terceira Aliança: Noética, Gn 9.16
Reafirma as condições de
vida do homem caído conforme anunciadas pela Aliança Adâmica, e institui o
princípio do governo humano para reprimir a expansão do pecado, uma vez que a
ameaça do juízo divino na forma de outro dilúvio foi removida. Os elementos da
aliança são:
a)O
homem torna-se responsável pela proteção da santidade da vida humana, através
de um governo ordeiro sobre o homem individual, até à pena capital (Gn 9.5-6;
Rm 13.1-7).
b)Nenhuma
maldição adicional é enunciada sobre a terra, nem o homem deve temer outro
dilúvio universal (Gn 8.21; 9.11-16).
c) A
ordem da natureza é confirmada (Gn 8.22; 9.2).
d)A
carne dos animais é acrescentada à dieta do homem (Gn 9.3-4). Presume-se que o
homem fosse vegetariano antes do dilúvio.
e)Uma
declaração profética é enunciada sobre os descendentes de Canaã, um dos filhos
de Cão, de que seriam servos dos seus irmãos (Gn 9.25-26).
f) Faz-se
uma declaração profética de que Sem terá um relacionamento peculiar com o
SENHOR (Gn 9.26-27). Toda a revelação divina é através dos homens semitas, e
Cristo, segundo a carne, descende de Sem.
g)Uma
declaração profética é enunciada de que de Jafé virão os grandes povos (Gn. 9:
27).
3.1.7
A Quarta Dispensação: A Promessa, Gn 12.1
Esta dispensação estendeu-se
da chamada de Abrão até a concessão da lei no Sinai (Êx 9.3ss) Sua mordomia
baseava-se sobre a aliança de Deus com Abrão, citada pela primeira vez aqui, Gn
12.1-3, e confirmada e ampliada em Gn 13.14-17; 15.1-7; 17.1-8,15-19; 22.16-18;
26.2-5,24; 28.13-15; 31.13; 35.9-12.
3.1.8
A Quarta Aliança: Abraâmica, Gn 12.2
Conforme constituída (Gn
12.1-4) e confirmada (Gn 13.1417; 15.1-7, 18-21; 17.1-8) têm três aspectos:
a)A
promessa de uma grande nação: "De ti farei uma grande nação", Gn
12.2.
b)Várias
promessas pessoais foram dadas a Abraão: Gn 17.16; 13.14-15,17; 15.8; 24.34-35;
15.6; Jo 8.56.
c) Promessas
aos gentios, Gn 12.3.
A Aliança Abraâmica revela o
propósito soberano de Deus em cumprir, através de Abraão, o Seu programa para
Israel, providenciando em Cristo o Salvador para todos aqueles que crêem. O
cumprimento final repousa sobre a promessa divina e o poder de Deus mais do que
sobre a fidelidade humana.
3.1.9
A Quinta Dispensação: A Lei, Gn 19.1
Esta dispensação começa com
a concessão da lei no Sinai e terminou como período de tempo com a morte
sacrificial de Cristo, que cumpriu todas as suas provisões e tipos. Na
dispensação anterior, Abraão, Isaque e Jacó, como também as multidões de outros
indivíduos, falharam nos testes da fé e obediência que eram da responsabilidade
do homem (por exemplo, Gn 16.1-4; 26.6-10; 27.1-25). O Egito também falhou em
atender a advertência de Deus (Gn 12.3) e foi julgado. Não obstante Deus
providenciou um libertador (Moisés), um sacrifício (o cordeiro pascal) e o poder
milagroso para tirar os israelitas do Egito (as pragas do Egito; livramento no
Mar Vermelho). Os israelitas, como resultado de suas transgressões (Gl 3.19),
foram agora colocados sob a disciplina precisa da lei. A lei ensina:
a) A
santidade espantosa de Deus (Êx 19.10-25).
b) A
horrível hediondez do pecado (Rm 7.13; 1Tm 1.8-10).
c) A
necessidade da obediência (Jr 7.23-24).
d) A
universalidade do fracasso humano (Rm 3.19-20).
e) A
maravilha da graça de Deus em providenciar um caminho até Eles através do
sacrifício típico antevendo um Salvador que viria a ser o Cordeiro de Deus, que
tira o pecado do mundo (Jo 1.29), conforme "o testemunho da lei" (Rm
3. 21).
A lei não alterou as
provisões nem revogou a promessa de Deus dada na Aliança Abraâmica. Não foi
concedida como um modo de vida (isto é, um meio de justificação, Atos 15.10-11;
Gl 2.16,21; 3.3-9,14,17,21,24-25), mas uma regra devida para um povo já dentro
da aliança de Abraão e coberto pelo sangue do sacrifício, isto é, do cordeiro
pascal etc. Um dos seus propósitos foi o de esclarecer a pureza e santidade que
deveria caracterizar a vida de um povo, cuja lei seria ao mesmo tempo a lei de
Deus (Êx 19.5-6). Daí, a função da lei em relação à Israel foi de restrição
disciplinar e corretiva, como aquela exercida sobre os filhos gregos e romanos
pelo escravo ou tutor de confiança da casa (Gl 3.24, traduzido para “aio”) para
manter Israel sob controle para o seu próprio bem (Dt 6.24):
a) Até
que Cristo viesse (Cristo é realmente o nosso Tutor, pois a graça que nos salva
também nos ensina, Gl 3.24; Tt 2.11-12).
b) Até
que a ocasião designada pelo Pai para os herdeiros (filhos da promessa) serem
removidos da condição de menoridade legal para os privilégios de herdeiros que
atingiram a maioridade (Gl 4.1-3). Isto Deus fez enviando o Seu Filho, e agora
os crentes estão na posição de filhos na casa do Pai (Gl 3.26; 4.4-7).
Mas Israel interpretou mal o
propósito da lei (1Tm 1.8-10), buscando a justiça através de boas obras e
ordenanças cerimoniais (At 15.1; Rm 9.31 – 10.3), e rejeitou o seu próprio
Messias (Jo 1.10-11). A história de Israel no deserto, na terra e dispersos
entre as nações, tem sido um registro longo de transgressão da lei.
3.1.10
A Quinta: A Aliança Mosaica (19.5)
Dada a Israel em três
divisões, cada uma essencial às outras e juntas formando a Aliança Mosaica,
isto é, os mandamentos, expressando a justa vontade de Deus (Êx 20.1-26); os
juízos, regulando a vida social de Israel (Êx 21.1-24.11); e as ordenanças,
governando a vida religiosa de Israel (Ex 24.12-31.18). Estes três elementos
formam "a lei", como essa expressão foi generalizadamente usada no
Novo Testamento, (por exemplo, Mt 5.17,18). Os mandamentos e as ordenanças
formavam um sistema religioso. Os mandamentos eram um "ministério da condenação"
e "da morte" (2Co 3.7-9); as ordenanças davam na pessoa do sumo
sacerdote, um representante do povo junto ao SENHOR; e, nos sacrifícios, uma
cobertura para os seus pecados em antecipação à cruz (Hb 5.1-3; 9.6-9; comp.
Rm. 3.25-26). O cristão não está sob a condicional Aliança Mosaica das obras, a
lei, mas sob a Nova Aliança incondicional da graça (Rm 3.21-27; 6.14-15; Gl
2.16; 3.10-14,16-18,24-26; 4.21-31; Hb 10.11-27). A lei não mudou a provisão da
Aliança Abraãmica, mas foi uma coisa acrescida apenas por um tempo limitado até
que viesse a Semente (Gl 3.17-19).
3.1.11
A Sexta: A Aliança Palestiniana (Dt
30.3)
Apresenta as condições sob
as quais Israel entrou na terra da promessa. É importante ver que a nação ainda
nunca tomou a terra sob a Aliança Abraâmica incondicional (Gn 12: 2), nem ainda
possui toda a terra (comp. Gn 15.18 com Nm 34.1-12). A Aliança Palestiniana tem
sete partes:
a) A
dispersão por causa da desobediência, v.1 (Dt 28.63-68; Gn 15.18).
b) O
futuro arrependimento de Israel quando estiver na dispersão, v.2.
c) A
volta do SENHOR, v.3 (Am 9.9-15; At 15.14-17).
d) A
restauração da terra, v.5 (Is 11.11-12; Jr 23.3-8; Ez 37.21-25).
e) A
conversão nacional, v.6 (Os 2.14-16; Rm 11.26-27).
f) O
julgamento dos opressores de Israel, v. 7 (Is 14.1-2; Joel 3.1-8; Mt 25.31-46).
g) A
prosperidade nacional, v. 9 (Am 9.11-15).
3.1.12
A Sétima: A Aliança Davídica (vs. 8-17)
Sobre a qual o futuro reino
de Cristo, "o qual, segundo carne, veio da descendência de Davi" (Rm
1.3), devia ser fundamentado, dava a Davi:
a) A
promessa da posteridade na casa de Davi.
b) Um
trono simbólico de autoridade real.
c) Um
reino, ou governo sobre a terra;
d) Certeza
de cumprimento, pois as promessas a Davi "serão estabelecidos (as) para
sempre".
Salomão, cujo nascimento
Deus predisse (2Sm 7.12), não recebeu a promessa de uma semente perpétua, mas
apenas a certeza de que:
a) Construiria
"uma casa ao meu nome" (v. 13).
b) O
seu reino seria estabelecido (v. 12).
c) O
seu trono, isto é, a autoridade real, permaneceria para sempre.
d) Se
Salomão pecasse, seria castigado, mas não deposto.
A continuidade do trono de
Salomão, mas não da semente de Salomão, demonstra a exatidão da predição.
Israel teve nove dinastias; Judá, uma. Cristo nasceu de Maria, que não veio da
linhagem de Salomão (Jr 22. 8-30); Ele era um descendente de Natã, outro filho
de Davi (comp. Lc 3.2331; e Lc 3.23). José, o marido de Maria, era descendente
de Salomão e através dele o trono passou legalmente a Cristo (comp. Mt 1.6,16).
Assim, o trono, mas não a semente, veio através de Salomão, que foi
precisamente o cumprimento da promessa do SENHOR a Davi.
Em contraste com a promessa
irrevogável de cumprimento perpétuo feita a Davi, Salomão é uma ilustração do
caráter condicional da Aliança Davídica conforme aplicada aos reis que o
seguiram. A desobediência da parte dos descendentes de Davi resultaria em
castigo, mas não em anulamento da aliança (2Sm 7.15; SI 89.20-37; Is
54.3,8,10). Assim o castigo caiu, primeiro na divisão do reino sob Reoboão e,
finalmente, nos cativeiros (2Rs 25.1-21). Desde aquele tempo apenas um rei da
família davídica foi coroado em Jerusalém e esse foi coroado com espinhos. Mas
a Aliança Davídica, dada a Davi pelo juramento do SENHOR e confirmada a Maria
pelo Anjo Gabriel, é imutável (Sl 89.20-37); e o Senhor ainda dará àquele que
foi coroado de espinhos o trono de Davi, seu pai (Lc 1.31-33; At 2.29-32;
15.14-17). Ambos, Davi e Salomão, entenderam que a promessa referia-se
literalmente a um reino terreno (2Sm 7.18-29; 2Cr 6.14-16).
3.1.13
A Sexta Dispensação: a Igreja (At 2.1)
Uma nova era foi anunciada
por nosso Senhor Jesus Cristo em Mt 12.47-13.52. A Igreja foi claramente
profetizada por Ele em Mt 16.18 (comp. Mt 18.15-19), comprada pelo derramamento
do Seu sangue no Calvário (Rm 3.24-25; 1Co 6.20; 1Pe 1.18-19), e constituída
como Igreja depois de Sua ressurreição e ascensão no Pentecostes quando, de
acordo com a Sua promessa (Atos 1.5), os crentes foram pela primeira vez
batizados individualmente com o Espírito Santo. Por causa da ênfase dada ao
Espírito Santo, esta dispensação também tem sido chamada "dispensação do
Espírito".
O ponto de prova desta
dispensação é o Evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo, a mensagem das boas
novas sobre a Sua morte e ressurreição (Jo 19.30; At 4.12; 1Co 15.3-5; 2Co
5.21; etc.). A contínua e cumulativa revelação das dispensações anteriores
combina com esta revelação mais completa para enfatizar a total iniqüidade e
perdição do homem, e a suficiência da obra historicamente completa de Cristo
para salvação, pela graça, mediante a fé, a todos os que vêm a Deus por Ele (Jo
14.6; At 10.43; 13.38-39; Rm 3.21-26; Ef 2.8-9; 1Tm 4.10; Hb 10.12-14).
Enquanto aqueles indivíduos
salvos, que compõem a verdadeira Igreja de Cristo, cumprem as ordens do seu
Senhor, de pregar o Evangelho até os confins da terra (Mc 16.15; Lc 24.46-48;
At 1.8), Deus está formando, durante esta dispensação, ''um povo para o seu
nome" (At 15.14) dentre os judeus e os gentios, chamado de "a
Igreja" e, portanto especialmente distinto dos judeus e gentios como tais
(1Co 10.32; Gl 3.27-28; Ef 2.11-18; 3.5-6).
O Senhor Jesus advertiu que
durante todo o período, enquanto a Igreja estiver sendo formada pelo Espírito
Santo, muitos rejeitarão o Seu Evangelho e muitos outros pretenderão crer nEle
e se tomarão uma fonte de corrupção espiritual e impedimento para o Seu
propósito nesta dispensação, na igreja professa. Estes produzirão a apostasia,
particularmente nos últimos dias (Mt 13.24-30,36-40,47-49; 2Ts 2.5-8; 1Tm
4.1-2; 2Tm 3.1; 4.3-4; 2Pe 2.1-2; 1Jo 2.18-20). A Dispensação da Igreja chegará
ao fim através de uma série de acontecimentos profetizados, o principal dos
quais será:
a) A
trasladação da verdadeira Igreja da terra para encontrar o Senhor nos ares em
um momento conhecido por Deus, mas não revelado aos homens, e sempre mantido
diante dos crentes como uma esperança iminente e feliz, encorajando-os no
serviço do amor e na santidade de vida. Este acontecimento geralmente é chamado
de "arrebatamento" (1Ts 4.17).
b) Os
juízos da septuagésima semana de Daniel, chamados de "a Grande Tribulação"
(Ap 7) que cairão sobre a humanidade em geral, mas incluirão a parte não salva
da igreja professa, que terá apostatado e por isso será deixada para trás sobre
a terra, quando a verdadeira Igreja for trasladada para o céu. Esta forma final
da Igreja apóstata está descrita em Ap 17 como "a meretriz" que
primeiro vai "montar" o poder político ("besta"), apenas
para ser derrotada e absorvida por esse poder (comp. Ap 18.2).
c) A
volta do Senhor Jesus do céu à terra em poder e glória, trazendo com Ele a Sua
Igreja, para estabelecer o Seu reino milenial de justiça e paz (Ap 19.11 e 17).
3.1.14
A Sétima Dispensação: O Reino (Ap 20.4)
Esta é a última das
dispensações ordenadas que condicionam a vida humana na terra. É o Reino da
Aliança feita a Davi (2Sm 7.8-17).
O Filho maior de Davi, o
Senhor Jesus Cristo, reinará sobre a terra como Rei dos reis e Senhor dos
senhores por 1.000 anos, associando consigo mesmo naquele Reino, os Seus santos
de todas as dispensações (Ap 3.21; 5.9-10; 11.15-18; 15.3-4; 19.16; 20.4,6).
A Dispensação do Reino une
dentro de si mesmo e debaixo de Cristo as várias "épocas" mencionadas
na Escritura:
a) O
período de opressão e desgoverno termina quando Cristo estabelece o Seu reino
(Is 11.3-4).
b) O
período de testemunho e paciência divina termina em julgamento (Mt 25.31-46; At
17.30-31; Ap 20.7-15).
c) O
período de luta termina em repouso e recompensa (2Ts 1.6-7).
d) O
período de sofrimento termina em glória (Rm 8.17-18).
e) O
período da cegueira e castigo de Israel termina em restauração e conversão (Ez
39.25-29; Rm 11.25-27).
f) O
tempo dos gentios termina no desmoronamento da imagem e no estabelecimento do
reino dos céus (Dn 2.34-35; Ap 19.15-21).
g) O
período da escravidão da criação termina em livramento e manifestação dos
filhos de Deus (Gn 3.17; Is 11. 6-8; Rm 8.19-21).
h) No
final dos mil anos, Satanás é solto por um pequeno período e instiga uma
rebelião final que é sumariamente abafada pelo Senhor. Cristo lança Satanás no
lago de fogo para ser eternamente atormentado, derrota o último inimigo - a
morte - e então entrega o reino ao Pai (1Co 15.24).
3.1.15
A Oitava: A Nova Aliança (Hb 8.8)
A última das oito grandes
alianças das Escrituras, é:
a) "Melhor"
do que a Aliança Mosaica Êx 19.5), não moralmente mas em eficácia (Hb 7.19;
comp. Rm 8.3-4).
b) Está
estabelecida sobre promessas "melhores" (isto é, incondicionais). Na
Aliança Mosaica, Deus disse: "Se..." (Êx 19.5); na Nova Aliança, Ele
diz: “Eu farei... “ (Hb 8.10,12).
c) Sob
a Aliança Mosaica, a obediência brotava do temor (Hb 2.2; 12.25-27); sob a
Nova, ela brota de um coração e uma mente dispostos (Hb 8.10).
d) A
Nova Aliança garante a revelação pessoal do Senhor a cada crente (v. 11).
e) Ela
assegura esquecimento completo dos pecados (Hb 8.12; 10.17).
f) Ela
repousa sobre uma redenção consumada (Mt 26.27-28; 1Co 11.25; Hb
9.11-12,18-23). Tenha em mente que a mesma palavra grega (diathekê) foi
traduzida para "testamento" e "aliança" no N.T.
g) Ela
garante a perpetuidade, conversão futura e bênção de um Israel arrependido, com
os quais a Nova Aliança ainda será ratificada (Hb 10.9; comp. Jr 31.31-40).
3.1.16
Resumo das Oito Alianças
a) A
Aliança Edênica (Gn 2.16) condiciona a vida do homem na inocência.
b) A
Aliança Adâmica (Gn 3.15) condiciona a vida do homem caído e dá a promessa de
um Redentor.
c) A
Aliança Noética (Gn 9.16) estabelece o princípio do governo humano.
d) A
Aliança Abraâmica (Gn 12.2) inaugura a nação de Israel e confirma, com
acréscimos específicos, a promessa adâmica da redenção.
e) A
Aliança Mosaica (Êx 19.5) condena todos os homens, "pois todos
pecaram" (Rm 3.23; 5.12).
f) A
Aliança Palestiniana (Dt 30.3) garante a restauração final e a conversão de
Israel.
g) A
Aliança Davídica (2Sm 7.16) estabelece a perpetuidade da família davídica
(cumprida em Cristo, Mt 1.1; Lc 1.31-33; Rm 1.3), e do reino davídico sobre
Israel e sobre toda a terra, a ser cumprida em e por Cristo (2Sm 7.8-17; Zc
12.8; Lc 1.31-33; At 15.14-17; 1Co 15.24).
h) E a
Nova Aliança (Hb 8.8) repousa sobre o sacrifício de Cristo e garante bênção
eterna, sob a Aliança Abraâmica (Gl 3.13-29), de todo aquele que crê. É
absolutamente incondicional e, considerando que nenhuma responsabilidade é por
ela consignada ao homem, ela é final e irreversível.
A mensagem da Bíblia é
completa. Ela incorpora cada capítulo e cada versículo em sua perfeita unidade,
e todas as suas partes são interdependentes. O domínio de qualquer parte exige
o domínio do todo. Se houver tolerância de ênfase desproporcional ou
indulgência para com modismos nas doutrinas, pouco progresso se obterá na sua
exata compreensão. Os sessenta e seis livros, que por disposição divina formam
este todo incomparável, estão divididos em duas partes principais: o Antigo
Testamento e o Novo Testamento, e estes Testamentos se prestam ao
esclarecimento de dois propósitos divinos supremos: aquilo que é terreno e
aquilo que é celestial. Os livros do Antigo Testamento estão classificados em
históricos: de Gênesis a Ester; poéticos: de Jó aos Cantares de Salomão; e
proféticos: de Isaías a Malaquias. Os livros do Novo Testamento se classificam
em históricos: de Mateus a Atos; epistolares: de Romanos a Judas; e proféticos:
o Apocalipse. No que se refere à Pessoa de Cristo (que é o tema central de toda
a Escritura), o Antigo Testamento é classificado como preparação; os quatro
Evangelhos como manifestação; os Atos como propagação; as Epístolas como
explanação; e o Apocalipse como consumação. A análise essencial de cada livro,
cada capítulo e cada versículo, pertence a outras disciplinas do treinamento do
estudante e não à Teologia Sistemática.
3.2.1
Composição do Antigo Testamento
A palavra testamento vem do termo grego "diatheke", e significa: a)
Aliança ou concerto, e b) Testamento, isto é, um documento contendo a última
vontade de alguém quanto à distribuição de seus bens, após sua morte. Esta é a
palavra empregada no Novo Testamento, como por exemplo, em Lucas 22.20. No
Antigo Testamento, a palavra usada é "berith" que significa apenas concerto. O duplo sentido do termo
grego nos mostra que a morte do testador (Cristo) ratificou ou selou a Nova
Aliança, garantindo-nos toda a herança com Cristo (Rm 8.17; Hb 9.15-17).
Tem, portanto, 39 livros, e
foi escrito originalmente em hebraico, com exceção de pequenos trechos que o
foram em aramaico. O aramaico foi a língua que Israel trouxe do seu exílio
babilônico. Há também algumas palavras persas. Seus 39 livros estão
classificados em 4 grupos, conforme os assuntos a que pertencem: Lei,
História, Poesia, Profecia. O grupo ou classe poesia também é conhecido por devocional.
a) LEI.
São 5 livros: Gênesis a Deuteronômio. São comumente chamados de Pentateuco.
b) HISTÓRIA. São 12 livros: de Josué a
Ester. Ocupam-se da história de Israel nos seus vários períodos: a) Teocracia, sob os juízes. b) Monarquia, sob Saul, Davi e Salomão.
c) Divisão do reino e cativeiro, contendo o relato dos
reinos de Judá e Israel, este levado em cativeiro para a Assíria, e aquele para
Babilônia. d) Pós-cativeiro, sob
Zorobabel, Esdras e Neemias, em conjunto com os profetas contemporâneos.
c) POESIA. São 5 livros: de Jó a
Cantares de Salomão. São chamados poéticos,
não porque sejam cheios de imaginação e fantasia, mas devido ao gênero
do seu conteúdo. São também chamados devocionais.
d) PROFECIA. São 17 livros: de Isaías a
Malaquias. Estão subdivididos em: Profetas Maiores: Isaías a Daniel (5 livros)
e Profetas Menores: Oséias a Malaquias (12 livros).
Os nomes maiores e menores não se referem ao mérito ou notoriedade do profeta mais
ao tamanho dos livros e à extensão do respectivo ministério profético.
A classificação dos livros
do Antigo Testamento, por assunto, vem da versão Septuaginta, através da
Vulgata, e não leva em conta a ordem cronológica dos livros, o que, para o
leitor menos avisado, dá lugar a não pouca confusão, quando procura agrupar os assuntos
cronologicamente. Na Bíblia hebraica (que é o nosso Antigo Testamento), a
divisão dos livros é bem diferente.
Nas Bíblias de edição
católico-romana, os livros de 1 e 2 Samuel e 1 e 2 Reis são chamados 1, 2, 3 e
4 Reis, respectivamente. 1 e 2 Crônicas são chamados 1 e 2 Paralipômenos.
Esdras e Neemias são chamados 1 e 2 Esdras. Também, nas edições católicas de
Matos Soares e Figueiredo, o Salmo 9 corresponde em Almeida aos Salmos 9 e 10.
O de número 10 é o nosso 11. Isso vai assim até os Salmos 146 a 147, que nas nossas
Bíblias são o de número 147. Deste modo, os três salmos finais são idênticos
em qualquer das versões acima mencionadas. Essas diferenças de numeração em
nada afetam o texto em si, e não poderia ser doutra forma, sendo a Bíblia o
Livro do Senhor!
3.3
O Texto e Estrutura da Bíblia
3.3.1
Particularidades do Texto
Apesar da grande diversidade
de traduções, edições e publicações existentes hoje não só na língua
portuguesa, mas como em muitos outros idiomas, relacionamos abaixo algumas
particularidades interessantes a saber para melhor interpretação e estudo da
Bíblia:
a) As palavras em Itálico
Não constam do original.
Foram introduzidas na tradução para completar o sentido do texto ou facilitar
sua interpretação. Muitas vezes acabam permitindo duplo sentido exegético.
b) O uso da margem
Muitas Bíblias têm na margem
de determinados trechos, a tradução literal do hebraico ou do grego. Às vezes,
têm uma tradução diferente quando o caso é duvidoso. São muito úteis essas
notas marginais.
c) O sumário dos capítulos
São preparados pelos
editores, e nada têm com a inspiração e o texto original. As exceções são
algumas frases introdutórias de certos Salmos, como o 4, 5, 6, 7, 8, 9, 22, 32,
45, 46, 53, 56, 69, 75 etc. Tais sumários nem sempre correspondem aos capítulos
aos quais se referem. Há casos até negativos, como a parábola dos Dez
Talentos", quando não são dez; a "Parábola do Rico e Lázaro",
quando não se trata de parábola, e assim por diante.
d) A divisão do texto
bíblico em capítulos e versículos
Não vem do original. A
primeira Bíblia que trouxe essa divisão foi a Vulgata, em 1555. Em muitos
casos, a divisão tanto em capítulos como em versículos, quebra o sentido, parte
o texto e altera toda a linha de pensamento. Exemplo de capítulos: Isaías 53,
que devia começar em Isaías 52.13, João 8, devia começar em João 7.53; 2 Reis 7 devia começar em 2 Reis 6.24; o
capítulo 3 de Colossenses devia terminar em Colossenses 4.1; Atos 5 devia
começar em 4.36. Com a divisão em versículos, acontece a mesma coisa, por
exemplo: Efésios 1.5 devia começar com as duas últimas palavras de Efésios 1.4;
1 Coríntios 2.9 e 2.10 deviam formar um só versículo. Na Epístola aos Romanos,
bem como em Efésios, há diversos casos desses. Também a divisão em versículos
não é a mesma em todas as versões: Dn
3.24-30 da ARC, corresponde à Dn 3.91-97 na Matos Soares; Lc 20.30 na ARC,
corresponde à Lc 20.30,31 na
“Brasileira".
e) A divisão do texto em
parágrafos é muito útil para a sua compreensão
O Salmo 2, por exemplo,
contém 5 parágrafos, tendo cada um aplicação diferente (vv. 1-3, 4-6, 7-9,
10-12a; 12b). Uma versão em português que indica os parágrafos é a ARA, com um
tipo negrito cada vez que isso ocorre. Há versões em outras línguas que dão
tanta importância à
essa divisão, que,
para maior comodidade do leitor,
imprimem o próprio sinal gráfico para parágrafo.
4 - PENTATEUCO – ESTRUTURA E ENSAIO
Introdução
São
cinco os Livros do Pentateuco: Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e
Deuteronômio. Esses primeiros cinco livros da Bíblia
são chamados "a Lei". Podemos considerá-los
como um único livro, embora incluam toda sorte de escritos: narrativas, leis,
instruções sobre o culto e as cerimônias religiosas, sermões e genealogias.
Mas, de qualquer modo, estes livros possuem tema comum. Depois das narrativas
sobre os primórdios do mundo em Gn 1-11, contam a história do povo de Deus
desde a vocação de Abraão até a morte de Moisés, compreendendo um período de
cerca de 600 anos, ou seja, de aproximadamente 1800 até 1250 a .C. O Gênesis contém a
história dos fundadores de Israel: Abraão, Isaac, Jacó e José. Os outros livros
da Lei são dominados pela figura de Moisés, o grande líder dos israelitas. A
idéia de uma comunidade que obedece à vontade de Deus é o centro destes livros,
e por isso lhes deu o nome hebraico de Torá, isto é, "ensinamento"
por excelência. Estes cinco livros também são conhecidos pelo nome grego de
Pentateuco ou "cinco rolos" (literalmente "cinco estojos"
nos quais estavam os rolos).
4.1
O Livro de Gênesis
O Gênesis, primeiro livro da
Bíblia, é o livro dos inícios, como diz o seu nome (grego) que significa
"origem". Trata da criação de uma maneira geral. Fala da origem do
homem e da mulher. Explica como as coisas começaram a ir mal e apresenta as
boas intenções de Deus em relação à sua criação. O livro está dividido em duas
grandes partes. Os caps. 1 - 11 narram a história da criação do mundo e da raça
humana. Lemos sobre Adão e Eva, Caim e Abel, Noé e o dilúvio, e a torre de Babel.
A criação de Deus foi progressivamente deteriorada pelo egoísmo, o orgulho e
a maldade humana. O livro fala das origens do pecado e do sofrimento, bem como
da promessa de esperança feita por Deus.
Os caps. 12 - 50 passam da história geral da humanidade para a de uma
pessoa, Abraão, e sua família. Abraão acreditou e obedeceu a Deus, que o escolheu
para fundar a nação de Israel. Seguem-se as histórias de Isaac, seu filho, de
Jacó (também conhecido como Israel), seu neto, e dos doze filhos deste, que
são os fundadores das doze tribos de Israel. Depois da narrativa concentra-se
num dos filhos de Jacó: José, que é feito prisioneiro no Egito, para onde mais
tarde emigra toda a sua família. O livro termina com a promessa de Deus de
cuidar do seu povo. Todos os capítulos mostram um Deus ativo, que julga e pune as pessoas que fazem o mal, que guia
e conserva o seu povo, moldando a sua história. O Gênesis narra a história de
alguns grandes homens de fé.
4.2
O Livro de Êxodo
A palavra êxodo vem do grego
e significa "saída". O livro do Êxodo narra como o povo de Israel
saiu do Egito, onde era escravo, e emergiu como nação livre, com uma esperança
para o futuro. A figura central é Moisés, o grande líder de Israel, chamado por
Deus para conduzir o povo para fora do Egito. O Êxodo divide-se em três partes:
Caps. 1-18: o povo hebreu é libertado da escravidão no Egito. Moisés conduz os
israelitas através do deserto até o monte Sinai. Caps. 19 - 24: Deus faz um
pacto com o seu povo no Sinal. Dá-lhe normas segundo as quais deve viver, tanto
no deserto como depois que tiver entrado na Terra Prometida. Estas normas estão
resumidas nos dez mandamentos, no capítulo 20. As leis de Deus abrangem a
totalidade da vida: o comportamento particular de uns para com os outros, o
comportamento na vida pública e o
comportamento para com Deus. Caps. 25 - 40: Deus dá ao povo de Israel
instruções sobre a construção de uma tenda móvel (o tabernáculo) para
adorá-lo.
4.3
O Livro de Levítico
O Levítico é substancialmente
um livro de leis. São leis sobre as cerimônias religiosas, o culto e a vida
cotidiana, com o objetivo de manter o povo de Israel num relacionamento justo
com Deus. O nome deriva dos sacerdotes (membros da tribo ou clã de Levi) aos
quais cabia cuidar das leis do culto. O livro volta constantemente ao tema da
santidade de Deus e da sua extraordinária bondade, tão diferente do homem.
Quando Jesus resumiu a lei, citou o Levítico: "Amarás o teu próximo como
a ti mesmo" (Lv 19, 18). Contém as seguintes seções: Caps. 1-7: leis sobre
sacrifícios e ofertas e seu significado. Caps. 8-10: leis referentes aos homens
que podiam ser sacerdotes e sua destinação para o exercício de suas funções.
Caps. 11-15: leis referentes à vida cotidiana, concentradas sobre as coisas
"puras" e "impuras" que impediam as pessoas de participar
do culto divino por certo tempo. Caps. 16: o dia da expiação, ocasião anual em
que se faziam ofertas para "purificar" o povo do pecado. Caps. 17-27:
leis sobre a santidade de vida e o culto, com promessas para os que obedecerem
e advertências para os que desobedecerem.
4.4
O Livro de Números
O livro dos Números conta a
história de Israel em sua peregrinação de quase quarenta anos pelo deserto
do Sinal. Começa no terceiro ano depois
da fuga do Egito e termina um pouco antes da entrada em Canaã, a terra que
Deus tinha prometido ao seu povo. O título Números provém das duas
"enumerações" (recenseamento) dos israelitas no monte Sinai e nas
estepes de Moab, perto do rio Jordão e de Jericó. Entre os dois recenseamentos
os israelitas estabeleceram-se por algum tempo no oásis de Cades-Barnéia e
depois seguiram para uma região a leste do Jordão. O livro dos Números é a
longa e triste história das queixas e do descontentamento de Israel.
Freqüentemente os israelitas deixaram-se dominar pelo medo e pelo desânimo
diante das dificuldades. Rebelaram-se contra Deus e seu líder Moisés. Apesar
disso, Deus continuou a preocupar-se com o seu povo. Mas só dois homens dos que
tinham saído do Egito, Calebe e Josué, entraram na Terra Prometida.
4.5
O Livro de Deuteronômio
Consiste de uma série de
discursos de Moisés aos israelitas nas estepes de Moab, pouco antes da entrada
na Terra Prometida. O nome do livro significa "segunda outorga da
lei". Mas na verdade trata-se de nova confirmação das leis dadas por Deus
no Sinai (registradas no Êxodo, Levítico e Números) e sua aplicação à vida
sedentária na terra de Canaã. No decorrer de seus discursos Moisés repete os
grandes eventos dos últimos quarenta anos. Reitera e destaca os dez mandamentos
e nomeia Josué seu sucessor para conduzir os israelitas. O grande tema do
Deuteronômio é que Deus salvou e abençoou seu povo, e este deve sempre
lembrar-se disso, amá-lo e obedecer-lhe. As palavras que Jesus classificou de o maior
mandamento: "Amarás a Iahweh teu Deus com todo o teu coração, com
toda a tua alma e com toda a tua força", são do Deuteronômio (Dt 6.4-5; Mt
22.37).
5 - HISTÓRICOS - ESTRUTURA E ENSAIO
Introdução
São
12 livros os livros históricos: Josué, Juízes, Rute, 1 Samuel, 2 Samuel, 1
Reis, 2 Reis, 1 Crônicas, 2 Crônicas, Esdras, Neemias e Ester. Esta
seção, que na Bíblia hebraica vai de Josué a Ester, abrange o tempo da
conquista, o tempo dos reis, o exílio e o retorno. Está dividida em duas
partes. A primeira, isto é, Josué, Juízes, Samuel e Reis, têm o título de
"Primeiros Profetas" da Bíblia hebraica. A segunda parte, ou seja,
Crônicas, Esdras e Neemias, estavam incluídos nos chamados “Escritos". As
duas partes juntas cobrem cerca de 800 anos da história de Israel, do século
XIII ao século V a.C. Estes livros foram escritos não simplesmente como
história da nação, mas para mostrar como o plano e a mensagem de Deus foram
cumpridos na vida de Israel.
5.1
O Livro de Josué
O livro de Josué conta como
Israel invadiu Canaã sob o comando de Josué, sucessor de Moisés. Os caps. 1-12
falam da conquista de Canaã, ocorrida provavelmente após 1240 a .C. Estas narrativas
poderão ter sido escritas pela primeira vez na época de Samuel, embora o livro
como um todo seja parte da grande "história deuteronômica", que vai
de Josué a 2 Reis. Não sabemos quem escreveu o livro. A narrativa compreende a
travessia do Jordão, a queda da cidade de Jericó e a batalha de Ai. Os caps.
13-22 contam como os israelitas dividiram entre si e ocuparam as terras
conquistadas. Os últimos dois capítulos (23-24) trazem o discurso de despedida
de Josué e a renovação da aliança com Deus e da sua promessa ao povo em Siquém.
5.2
O Livro de Juizes
O livro dos Juizes é uma
coletânea de narrativas referentes aos dois séculos turbulentos, que vão desde
o tempo da conquista de Canaã até pouco antes da coroação do rei Saul, isto é,
aproximadamente de 1200 a
1050 a .C.
Os "Juízes" eram heróis locais das tribos de Israel, geralmente
chefes militares, cujos feitos são narrados no livro. Incluem figuras como
Débora, Gideão e Sansão. Neste período só a fé comum em Deus manteve de certo
modo unidas as tribos de Israel. Quando seguiam os deuses locais, caíam em
divisão, tornavam-se fracas e acabavam sendo presas dos cananeus.
5.3
O Livro de Rute
A idílica história de Rute
contrasta com os tempos violentos do livro dos Juízes em que se situa. Rute,
mulher moabita, desposara um israelita. Quando o marido morreu, ela demonstrou
inesperada lealdade para com a sogra israelita e confiou no Deus de Israel. Por
fim encontrou novo marido entre os parentes do falecido esposo e através deste
casamento tornou-se bisavó do rei Davi e antepassada do próprio Jesus. Embora a
religião passasse por crise generalizada naquela época, o livro de Rute exalta a fé de pessoa comum, uma
estrangeira que se convertera ao Deus de Israel.
5.4 Primeiro e Segundo Samuel
Estes dois livros narram a
história de Israel desde Samuel até os últimos anos de Davi. Tomam o nome do
último grande Juiz, Samuel, não porque este os escreveu, mas porque a sua
figura domina os primeiros capítulos. Originalmente era um único livro na
Bíblia hebraica. Samuel ungiu os dois primeiros reis de Israel - Saul e Davi -
como escolhidos de Deus. Os dois cobrem aproximadamente o período de 1075-975 a .C. O autor várias vezes
se refere ao reino separado de Judá. Isso indica que a redação final da obra
deve ter ocorrido depois de 900
a .C. Mas contém muito material contemporâneo dos eventos
descritos, especialmente a história das intrigas da corte de Davi em 2Sm 9-20,
que muitos estudiosos acreditam ser obra de secretários profissionais da corte,
que foram testemunhas do que escreveram. Os livros de Samuel tratam
principalmente da história da ação de Deus em relação à nação de Israel. 1
Samuel conta como Israel passou do governo dos juízes para o regime dos reis.
Caps. 1-8: os anos de Samuel como Juiz de Israel. Caps. 9–15: história de Saul,
primeiro rei de Israel. Caps. 16-30: As relações entre Davi e Saul. O livro
termina (cap.31) com a morte de Saul e de seus filhos. Ainda que agora o povo
tivesse um rei, tanto este como o povo
são vistos sob a condução e o juízo de Deus. 2 Samuel narra a história de Davi
rei, primeiro de Judá ao sul (caps. 1 - 4), depois de todo o país, inclusive da
parte que posteriormente será o reino setentrional de Israel. Lemos como o rei
Davi expandiu o seu reino e se
tornou soberano poderoso. Davi era homem de profunda fé em Deus e muito
popular. Mas às vezes era cruel e impiedoso para conseguir o que queria, por
exemplo, no caso da sua determinação de ter para si Bate-Seba, mulher de um dos
seus oficiais.
5.5
Primeiro e Segundo Reis
Os dois livros dos Reis
abrangem cerca de 400 anos da história de Israel, desde a morte de Davi até a
destruição de Jerusalém em 587
a .C. Não sabemos quem foi o autor deles, mas à
semelhança de 2 Samuel, é certo que contêm informações tiradas de documentos da
corte, contemporâneos aos fatos descritos. Provavelmente passaram por várias
edições e revisões até receberem sua forma final durante o exílio em Babilônia
(587-539 a .C.).
1 Reis pode ser dividido em duas partes: Caps. 1-11: Salomão sucede ao seu pai
Davi como rei de Israel e Judá. O período áureo do seu reinado viu a construção
do templo de Jerusalém. Caps. 12 - 22: a nação divide-se, dando origem ao reino
de Israel (norte) e ao reino de Judá (sul). O livro narra a história dos reis
dos dois reinos, entre os quais Jeroboão (Israel), Roboão (Judá), Acabe
(Israel), Josafá (Judá) e Acazias (Israel). Os profetas de Deus anunciam com
coragem a sua palavra numa época em que as pessoas se voltam para outros
deuses. O maior dentre eles é Elias, cuja disputa com os profetas de Baal no
monte Carmelo é narrada em 1Rs 18. 2 Reis continua a história dos dois reinos
no ponto em que termina 1 Reis, e igualmente se divide em duas partes. Caps.
1-17: a história dos dois reinos desde a metade do século IX a.C. até a
derrota do reino
setentrional pela Assíria e a
queda de Samaria em 722 a .C.
Neste período destaca-se o
profeta Eliseu, sucessor de Elias, como mensageiro de Deus. Caps. 18 - 25: a
história do reino de Judá desde a queda do reino de Israel até a destruição de
Jerusalém pelo rei de Babilônia, Nabucodonosor, em 587 a .C. São destacados os
reinados de dois grandes reis: Ezequias e Josias. Nos dois livros dos Reis, os
soberanos de Israel são julgados com base na sua fidelidade a Deus. O país
prospera quando o rei é leal, e entra em decadência quando o rei presta culto a
outros deuses. Segundo este modelo, todos os reis do reino do norte representam
um fracasso.
5.6
Primeiro e Segundo Crônicas
À primeira vista os livros
das Crônicas parecem uma repetição simplificada dos livros de Samuel e dos
Reis. Na verdade, o autor reescreve a história para leitores que já conheciam
esses livros. Mas tinha dois motivos principais para dar sua própria versão da
história dos reis de Israel. Queria mostrar que, apesar dos desastres que
atingiram Israel, Deus mantém a sua promessa de cuidar do seu povo. Para isso,
concentrou a atenção nos reinados gloriosos de Davi e Salomão e nos bons
governos dos reis Josafá, Ezequias e Josias. Queria descrever como começou o
culto do templo em Jerusalém, explicar os deveres dos sacerdotes e dos levitas,
e mostrar que Davi foi o verdadeiro fundador do templo (ainda que de fato
tivesse sido Salomão quem o construiu). O autor, o “Cronista”, provavelmente
escreveu para os israelitas que tinham voltado do exílio a fim de reconstruir
Jerusalém. Estes precisam entender o seu passado, e o autor lhes recordou que o
sucesso da nação dependia da sua lealdade para com Deus. 1Crônicas começa com
uma genealogia, que vai de Adão ao rei Saul (caps. 1-9) e entra propriamente no
tema com o reinado de Davi e os preparativos deste para a construção do templo
(caps. 10-29). 2 Crônicas começa com o reinado de Salomão e a construção do
templo (caps. 1-9). Depois de lembrar a revolta das tribos setentrionais sob
Jeroboão, continua nos caps. 11-36 com a história dos reis de Judá até a
destruição de Jerusalém em 587
a .C.
5.7
O Livro de Esdras
O livro de Esdras continua
diretamente as Crônicas e descreve a volta de parte dos judeus exilados de
Babilônia. Estes trouxeram um pouco de vida e a restauração do culto em Jerusalém. A narração
cobre aproximadamente os anos 583-433
a .C. Partes da obra reproduzem talvez trechos escritos
pelo próprio Esdras. A volta a Jerusalém é apresentada nas suas três fases:
Caps. 1-2: volta do primeiro grupo com Zorobabel, por ordem do rei persa Ciro.
Caps. 3-6: reconstrução do templo e retomada do culto em Jerusalém, apesar das
oposições locais. Caps. 7-10: Esdras volta a Jerusalém com outro grupo e
contribui para restaurar a religião e o modo de vida de Israel.
5.8
Livro de Neemias
Neemias, um exilado judeu,
teve permissão do rei persa Artaxerxes de voltar com um grupo de judeus a
Jerusalém em 445 a .C.
O livro que tem seu nome, escrito como memória pessoal, apresenta-o como líder
nato, e pessoa que confiava plenamente em Deus e para quem orar era coisa tão
natural como respirar. Também este livro pode ser dividido em três partes:
Caps. 1-7: Neemias retoma a Jerusalém, encoraja o povo a reconstruir os muros
da cidade para defender-se de feroz oposição e introduz reformas religiosas que
se faziam urgentes. Caps. 8-10: Esdras proclama a lei de Deus diante do povo que,
profundamente comovido, confessa sua infidelidade e volta novamente a Deus.
Caps. 11-13: atividades de Neemias como governador de Judá, nomeado pelo rei da
Pérsia.
5.9
Livro de Ester
A história enquadra-se na
época de Esdras e Neemias, ou seja, no período persa. Fala de conspiração
urdida no reinado de Assuero (Xerxes) para destruir a raça judaica. Uma heroína
judia de nome Ester torna-se rainha dos persas e com a sua coragem consegue
salvar o seu povo. O livro mostra como a nação judaica, mais uma vez, foi salva
da destruição e explica a origem e a significação da festa judaica do Purim
(que celebra esta salvação). Em alguns pontos, o texto grego é mais longo que o
hebraico.
6 - POÉTICOS - ESTRUTURA E ENSAIO
Introdução
São
5 livros: Jó, Salmos, Provérbios, Eclesiastes e Cantares de Salomão. São
chamados poéticos, não porque sejam
cheios de imaginação
e fantasia, mas devido ao gênero do seu conteúdo. Alguns
também os chamam de “Livros Devocionais”. No Antigo Testamento os
livros dos Provérbios, Jó, Eclesiastes, Eclesiástico e Sabedoria são comumente
conhecidos como livros sapienciais.
Escritos deste tipo
encontram-se também em outras partes do Antigo Testamento, sob formas diversas,
como fábulas, ditados populares e regras gerais de vida. De maneira geral,
tratam da vida cotidiana, da boa conduta, das virtudes que se devem cultivar e
dos vícios que se deve evitar. A maior parte dos conselhos é fruto do bom senso
baseado na experiência. Mas alguns tratam de temas importantes. Os livros de Jó
e Eclesiastes tratam de problemas muito sérios (como o sofrimento) e
discutem-no a fundo. Entre os livros sapienciais incluem-se também os Salmos e
o Cântico dos Cânticos.
6.1
O Livro de Jó
O padrão claramente
desenvolvido do livro de Jó, prólogo, discursos e epílogo, além dos ciclos
dentro dos próprios discursos, mostra que se trata de uma interpretação
teológica sobre certos acontecimentos da vida de Jó. Do início ao fim, o autor
tem a intenção de responder a uma pergunta básica: Qual é o significado da fé?,
Jó era um chefe de clãs (famílias) de notável piedade, integridade e sabedoria,
foi abençoado por Deus com uma prosperidade terrena tal, que se tornara o maior
e mais rico de todos no Oriente. Subitamente, porém Jó experimentou uma
reversão completa da fortuna, foi vitimado por uma série de grandes
calamidades, tendo sido privado de todas as suas possessões e dos seus
filhos. Seu corpo foi tomado por uma
enfermidade repulsiva, três amigos
que vieram ostensivamente para
consolar Jó, insistiam que o seu sofrimento tinha como causa o pecado.
Mas Jó rejeita veementemente esta afirmação, reafirmando em todo tempo que ele
era um homem justo, mas confessou que não tinha capacidade para explicar porque
estava lhe sucedendo tudo aquilo. Finalmente Deus responde as repetidas
solicitações de Jó, e lhe dá uma explicação direta sobre os seus sofrimentos,
não por uma justificação de suas ações, nem por qualquer solução intermediária,
mas sim pela vontade de Deus. E isso foi o suficiente para Jó, ele percebeu que
Deus, sendo poderoso, misericordioso, justo e
amoroso, não o deixaria sofrer mais. Esse livro serve de um propósito
muito alto para as nossas vidas: mostrar que a certeza da fé não descansam nas
circunstâncias exteriores, nem em explicações especulativas, mas na certeza da
fé em Deus, onisciente e onipotente.
6.2
O Livro dos Salmos
O título hebraico dos Salmos
é Tehillim, que significa “louvores”; o título na Septuaginta (tradução do
Antigo Testamento para o grego, feita em c. 200 a .C.) é Psalmoi, que
significa “cânticos para serem acompanhados por instrumentos de cordas”. O
título em português, “Salmos”, deriva da Septuaginta. A música desempenhava
papel de importância no culto do antigo Israel (confronte Sl 149; 150; 1Cr
15.16-22); os salmos eram os hinos do povo de Israel. Bem diferente de boa
parte da poesia e do cântico do mundo ocidental, compostos com rima ou
metrificação, a poesia e o cântico do Antigo Testamento tem por base o
paralelismo de pensamento, em que a
segunda linha (ou linhas sucessivas) da estrofe
praticamente faz uma reiteração (paralelismo sinônimo), ou apresenta um
contraste (paralelismo antitético), ou, de modo progressivo, completa
(paralelismo sintético) a primeira linha. Todas as três formas de paralelismo
caracterizam o Saltério.
O salmo mais antigo
conhecido vem de Moisés, no século XV a.C. (Sl 90); os mais recentes provêm dos
séculos VI e V a.C. (por exemplo, Sl 137). A maioria dos salmos, no entanto,
foi escrita no século X a.C., durante a era áurea da poesia em Israel. Os títulos
descritivos que precedem a maioria dos salmos, embora não pertençam ao texto
original, logo não inspirados, são muito antigos (anteriores à Septuaginta) e
importantes.
6.3
O Livro de Provérbios
O Antigo Testamento hebraico
era em regra dividido em três partes: a Lei, os Profetas e os Escritos
(confronte Lc 24.44). Na terceira parte estavam os livros poéticos e
sapienciais, a saber: Jó, Salmos, Provérbios, Eclesiastes etc. Semelhantemente,
o Israel antigo tinha três categorias de ministros: os sacerdotes, os profetas
e os sábios. Estes últimos eram especialmente dotados de sabedoria e conselho
divinos a respeito de princípios e práticas da vida.
O livro de Provérbios
representa a sabedoria inspirada dos sábios. A palavra hebraica mashal,
traduzida por “provérbio”, tem os sentidos de “oráculo”, “parábola”, ou “máxima
sábia”. Por isso, há declarações longas no livro de Provérbios (por exemplo,
1.20-33; 2.1-22; 5.1-14), mas há também as concisas, mas ricas
de sentido e sabedoria, para se viver de modo prudente e justo. O
conteúdo de Provérbios representa uma forma de ensino comum no Oriente Próximo
antigo, mas no caso deste livro, sua sabedoria é diferente porque veio da parte
de Deus, com seus padrões justos para o povo do seu concerto.
O ensino mediante provérbios
era popular naqueles antigos tempos, em virtude da sua grande clareza e
facilidade de memorização e transmissão de geração em geração. Assim como
Davi é o manancial da tradição salmódica em Israel, Salomão é o manancial da tradição
sapiencial em Israel (ver Pv 1.1; 10.1; 25.1). Conforme 1Rs 4.32, Salomão
produziu 3.000 provérbios e 1.005 cânticos.
Outros autores mencionados
por nome em Provérbios são Agur (Pv 30.1-33) e o rei Lemuel (Pv 31.1-9), ambos
desconhecidos.
Autores outros estão
subentendidos em Pv 22.17 e em Pv 24.23. A maioria dos provérbios teve origem
no século X a.C., porém a provável data mais antiga para a conclusão deste
livro seria o período de reinado de Ezequias (isto é c. 700 a .C.). A participação dos
homens de Ezequias na compilação dos provérbios de Salomão (25.1-29.27) talvez
remonte a 715-686 a .C.,
durante o avivamento espiritual liderado por esse rei temente a Deus. É
possível que os provérbios de Agur, de Lemuel e os outros “sábios” também
tenham sido compilados nesse período.
6.4
O Livro de Eclesiastes
O livro sintetiza a
“sabedoria”, ou seja, observações, pensamentos e sentenças, de um “filósofo”
que se oculta sob o pseudônimo de Coélet, “presidente da assembléia”
(Eclesiastes em Grego). Tal gênero de escrito era popular nos países antigos do
Oriente Médio. O autor examina a vida humana, julga-a breve e absurda,
concluindo que ela não tem sentido. Não consegue entender para que serve.
Contudo, termina recomendando a aplicação ao trabalho e o gozo do prazer
enquanto a vida dura. Grande parte do livro parece deprimente e destrutiva,
porque considera a “vida debaixo do sol” exclusivamente do ponto de vista
humano. A vida sem Deus não tem objetivo nem sentido, mas a sabedoria e a
justiça conferem pelo menos um pouco de nobreza à existência humana.
6.5
O Livro de Cantares de Salomão
É uma coleção de poesias
amorosas, que cantam o amor de um homem e de uma mulher. Às vezes é chamado de
cântico de Salomão, porque na Bíblia hebraica é atribuído a esse rei. As
poesias, cujo cenário é o campo na primavera, exaltam com paixão e entusiasmo o
amor e exprimem com franqueza o prazer da atração física.
7 - PROFÉTICOS - ESTRUTURA E ENSAIO
Introdução
São
17 livros chamados proféticos, que vão de Isaías a Malaquias. Estão
subdivididos em
Profetas Maiores e Profetas Menores, sua composição é:
Profetas Maiores: Isaías, Jeremias,
Lamentações de Jeremias, Ezequiel e
Daniel; Profetas Menores: Oséias, Joel, Amós, Obadias, Jonas, Miquéias, Naum,
Habacuque, Sofonias, Ageu, Zacarias e Malaquias.
Os livros trazem o nome de
16 profetas hebreus, aos quais se acrescentam as Lamentações. Os quatro
profetas “maiores”, Isaías, Jeremias, Ezequiel e Daniel são seguidos pelos
chamados doze profetas “menores”, autores de livros breves. Os livros dos profetas vão desde a
época áurea do povo israelita até o exílio e o retorno à pátria. Entre os
primeiros contam-se Amós e Oséias, que dirigiram suas mensagens ao reino do
norte, no século VIII a.C. Mas a maioria dos profetas atuou no reino de Judá.
Aí desenvolveram suas atividades Isaías, Miquéias e talvez também Joel em torno
de 700 a .C.,
mais de cem anos antes da queda de Jerusalém em 587 a .C. Jeremias, Habacuque
e Sofonias proclamaram suas palavras nos anos que antecederam a queda da cidade
e durante o exílio. Ageu, Zacarias e Malaquias profetizaram durante e após o
retorno, a partir de 538 a .C.
Alguns profetas tiveram outros destinatários. Jonas e Naum dirigiram mensagens
especiais a Nínive, a capital da Assíria destruída em 612 a .C. Daniel é descrito
como profeta em
Babilônia. Obadias sentenciou contra Edom, antigo inimigo de
Israel.
7.1
Os Livros dos Profetas Maiores
7.1.1
O Livro de Isaías
Isaías viveu no século VIII
a.C. O livro que trás o seu nome é dos mais impressionantes do Antigo
Testamento. Pinta com cores fortes o poder de Deus e contém mensagem de
esperança para o seu povo. O chamado de Isaías para a função de profeta é
descrito no cap. 6. Ele profetizou durante mais de quarenta anos. Os caps. 1 -
39 pertencem ao período em que o reino de Judá foi ameaçado pela Assíria, o
grande império do mundo bíblico de então. Mas Isaías proclamou que o perigo
real para a nação estava nos seus pecados e na sua desobediência a Deus. O povo
não confiava em Deus e o profeta convidou-o a voltar a ele, a restabelecer a
justiça e a agir corretamente. Se não prestasse ouvidos, Judá seria destruído.
Isaías também voltou os olhos para o futuro, época em que em todo o mundo
reinaria a paz. Um descendente do rei Davi tornar-se-ia o rei ideal que
cumpriria a vontade de Deus. Os caps. 40 - 55 tratam da volta do exílio de
Babilônia. O povo tinha perdido toda esperança, mas o profeta lhe fala de um
tempo em que Deus
o libertaria e reconduziria a Jerusalém. Enfatiza o fato de que Deus controla a
história e acena ao plano divino de utilizar a nação de Israel para levar a
esperança a todos os povos. Esta parte do livro inclui certo número de
passagens em que o profeta, olhando para o futuro, fala da vinda do “Servo de
Iahweh”, portador de esperança para a nação. Os caps. 56 - 66 formam seção
separada, dirigida principalmente aos judeus que voltaram a Jerusalém.
7.1.2
O Livro de Jeremias
Jeremias viveu cerca de cem
anos depois de Isaías, tendo sido chamado por Deus à vocação de profeta em 627 a .C. e morrido pouco
depois de 587 a .C.
Na sua época, a Assíria, a superpotência do norte, entrava em decadência. A nova
ameaça do reino de Judá era Babilônia. Por quarenta anos advertiu o povo sobre
o futuro juízo de Deus, que o castigaria, por causa da sua idolatria e do seu
pecado. Por fim suas palavras cumpriram-se. Em 587 a .C. o exército
babilônico, conduzido por Nabucodonosor, destruiu Jerusalém e o templo, levando
muitos judeus para o exílio. Jeremias recusou a oferta para ir viver
comodamente na corte babilônica e provavelmente morreu no Egito. Os caps. não
seguem a ordem cronológica dos fatos. O livro começa com a descrição da vocação
de Jeremias. Os primeiros 25 caps. contêm mensagens de Deus dirigidas a Judá
durante os reinados dos últimos reis: Josias, Joacaz, Jeoaquim, Joaquim (filho
deste) e Zedequias. Os caps. 26 - 45 narram acontecimentos da vida de Jeremias
e incluem algumas outras profecias. Os caps. 46 - 51 trazem as mensagens
enviadas por Deus a diversas nações estrangeiras. Os capítulos finais descrevem
a queda de Jerusalém e o exílio em Babilônia. Jeremias
tornou-se muito impopular e foi acusado de traição, porque exortava o povo a
render-se aos babilônios. Mas ele amava
o seu povo
e sofria por
ser obrigado, pela sua dramática missão, a anunciar o juízo de Deus. Era
muito inseguro de si, mas jamais traiu a mensagem que Deus lhe confiara. Embora
seja lembrado pelo seu pessimismo, também teve palavras de esperança e prometeu
que, depois do obscuro período do exílio, Deus reconduziria o seu povo de volta
à pátria.
7.1.3
O Livro de Lamentações
O livro das Lamentações é
uma coletânea de cinco poemas, que choram a queda de Jerusalém em 587 a .C. e o exílio. O templo
tinha sido destruído e a nação via nisso um sinal de que Deus a tinha entregado
aos inimigos. O profeta chora o pecado do seu povo. O livro é principalmente um
lamento. Mas também contém promessa de esperança. A obra ainda continua sendo
lida em voz alta nas sinagogas em julho de cada ano, quando os judeus recordam
a destruição do templo em 587
a .C. e em 70 d.C.
7.1.4
O Livro de Ezequiel
O profeta Ezequiel foi
levado para o exílio em Babilônia no ano de 597 a .C. e ali viveu antes e
depois da queda de Jerusalém em 587
a .C. Foi chamado para a missão de profetizar aos trinta
anos de idade e dirigiu sua mensagem tanto aos exilados em Babilônia, quanto ao
povo que ainda vivia na longínqua Jerusalém. Quando recebeu o chamado profético
também teve uma vívida visão da santidade de Deus (caps. 1-3), que influenciou
toda a sua vida. Os caps. 4-24 prevêem o juízo divino sobre Israel: Jerusalém
será destruída. Ezequiel também anunciou o juízo de Deus contra as nações que
ameaçavam o seu povo (caps. 25-32). Depois da queda de Jerusalém em 587 a .C. mudou o tom de sua
mensagem (caps. 33-39), levou conforto ao povo e fez brilhar a promessa e a
esperança para o futuro: Deus haveria de libertar Israel. Finalmente descreveu
as visões que teve sobre o futuro, em que o povo ofereceria a Deus culto
perfeito em templo novo (caps. 40-48). Ezequiel sublinhou a responsabilidade
individual diante de Deus e a renovação do povo partindo do coração.
7.1.5
O Livro de Daniel
Daniel é apresentado como
exilado de Judá que viveu na corte babilônica no tempo de Nabucodonosor e seus
sucessores. Na verdade, parece mais homem de Estado que profeta. O livro que
leva seu nome foi escrito no momento em que o povo judeu estava oprimido,
talvez durante a perseguição Babilônica sob o domínio de Nabucodonosor. Os
caps. 1-6 narram episódios da vida de Daniel e alguns amigos seus, exilados na
época do império babilônico e persa. Porque confiaram em Deus e a ele
obedeceram a qualquer preço, triunfaram dos seus inimigos. O restante do livro
contém uma série de visões do profeta (caps. 7-12), que descrevem em termos
figurativos o nascimento e a queda dos impérios. Os perseguidores pagãos cairão
e o povo de Deus sairá vitorioso. A versão grega da Setenta e,
conseqüentemente, a Bíblia católica, tem mais dois caps., 13-14, que, entre
outras coisas, contam a história da casta Susana injustamente acusada, mas
salva por Daniel.
7.2
Os Livros dos Profetas Menores
7.2.1
O Livro de Oséias
Oséias viveu mais ou menos
na época de Isaías, no século VIII a.C., no reino de Israel. Profetizou durante
os tormentosos 40 anos que antecederam a queda de Samaria em 722 a .C.. Israel teve seis
reis no espaço de vinte anos e freqüentemente contemporizou com as religiões
pagãs. O profeta preocupou-se muito com a idolatria e pintou a infidelidade de
Israel com imagens tiradas do seu próprio casamento com mulher infiel (caps. 1
- 3). O juízo de Deus virá, mas no fim o seu amor saberá reconquistar o povo.
Os caps. 4 - 13 contêm as mensagens que dirigiu a Israel. Mostram como Deus
estava irado, mas ao mesmo tempo não conseguia esquecer o seu amor ao povo. O
capítulo final implora a Israel que volte a Deus.
7.2.2
O Livro de Joel
Não conhecemos nada sobre
este profeta, nem sabemos em que tempo viveu. Talvez tenha vivido depois do
exílio. Seu livro fala de exército de gafanhotos que devoram as colheitas e de
seca desastrosa. Trata-se de imagens do iminente juízo de Deus sobre aqueles
que lhe desobedecem, imagens do “dia do Senhor”. Joel convida o povo a
voltar-se a Deus, que renovará todas as coisas e enviará o seu Espírito sobre
todo o povo.
7.2.3 O Livro de Amós
Amós era originário de uma
cidade de Judá, mas dirigiu sua mensagem ao reino do norte de Israel. Viveu no
século VIII a.C., durante o reinado de Jeroboão II de Israel. Foi pastor e
cultivador de uma espécie de figueiras. Naquela época Israel vivia em grande prosperidade
e riqueza, o reino também parecia religioso. Mas Amós condenou a sua
hipocrisia. Os pobres eram oprimidos e a religião era apenas fachada. Era
necessário um homem corajoso pala denunciar a nação em nome de Deus, e Amós
desejou que a justiça “corresse como rio”. Em 722 a .C. os assírios
destruíram Samaria e levaram o povo ao exílio. Os primeiros 6 caps. do livro de
Amós contêm os juízos pronunciados por Deus sobre Israel e seus vizinhos. OS
caps. 7-9 apresentam a descrição de cinco visões. O profeta Amós era pastor.
7.2.4
O Livro de Obadias
O livro de Obadias é o mais
curto do Antigo Testamento e foi escrito depois da queda de Jerusalém em 587
d.C. Os edomitas, antigos inimigos de Judá que habitavam as montanhas a sudeste
do mar Morto, aproveitaram a ocasião para invadir o país. Obadias condenou o
orgulho de Edom e profetizou a sua derrota. No século V a.C. os árabes
derrotaram os edomitas; no século III a.C. foi a vez de os nabateus os
subjugarem; finalmente desapareceram da história. Por outro lado, Obadias
profetiza o retorno de Israel à sua pátria.
7.2.5
O Livro de Jonas
Diversamente dos outros
livros proféticos, o de Jonas tem a forma de uma história. Descreve as
aventuras um tanto fabulosas, mas de cunho moral, de um profeta que tentou desobedecer
às ordens de Deus. Jonas recebera de Deus a incumbência de ir a Nínive, capital
da Assíria, e de converter o seu povo. Finalmente Jonas anunciou a mensagem e
ficou desgostoso quando Deus perdoou a cidade, grande inimiga de Israel. O
livro mostra o amor e a bondade de Deus, que prefere esquecer e salvar a punir
e destruir.
7.2.6
O Livro de Miquéias
O profeta Miquéias foi mais
ou menos contemporâneo de Isaías, Amós e Oséias no século VIII a.C., e dirigiu
sua mensagem tanto a Judá como a Israel. À semelhança de Amós, Miquéias
denunciou os governantes, os sacerdotes e os profetas porque exploravam os
pobres e indefesos, defraudavam e desonravam a religião. O juízo de Deus viria
sobre Samaria e Jerusalém. Mas também teve palavras de esperança, prometendo
que Deus instauraria a paz universal e que da família de Davi surgiria um
grande rei, portador da paz. Um dos versículos do seu livro resume grande parte
da mensagem dos profetas: “O que lahweh exige de ti: nada mais do que praticar
o direito, gostar do amor e caminhar humildemente com o teu Deus!” (Mq 6.8).
7.2.7
O Livro de Naum
O livro de Naum consiste num
poema. O profeta prediz que Nínive cairá e regozija-se pelo juízo de Deus
contra uma nação cruel e arrogante. De fato, Nínive caiu nas mãos dos babilônios
e dos medos em 612 a .C.
Provavelmente o livro foi escrito nessa época.
7.2.8
O Livro de Habacuque
Este livro é do fim do
século VII a.C., quando Jeremias profetizava em Jerusalém. Era a
época dos cruéis babilônios. O profeta pergunta a Deus: “Por que contemplas os
traidores, silencias quando um ímpio devora alguém mais justo do que ele?” (Hb
1.13). Deus responde que intervirá no
momento oportuno e punirá os malfeitores. O livro termina com a advertência e a
oração do profeta justo, que se alegra sabendo que Deus tem o controle de tudo.
7.2.9
O Livro de Sofonias
Sofonias proclamou a
mensagem de Deus a Judá durante o reinado de Josias (640-609 a .C.), no início da
atividade de Jeremias. Manassés e Amon, os dois reis anteriores, tinham levado
a religião e a moral da nação ao nível mais baixo já alcançado. Sofonias lembra
a Judá o juízo que se aproxima por ter abandonado o Deus vivo, e prediz aos
vizinhos de Israel a destruição que os espera. Mas ainda que Jerusalém caia,
será reconstruída.
7.2.10
O Livro de Ageu
Ageu, Zacarias e Malaquias,
os três últimos livros do Antigo Testamento, são da época em que os judeus
haviam voltado do exílio, sob a liderança de Esdras e Neemias. Após os
primeiros esforços para reconstruir o templo destruído pelos babilônios em 587 a .C., haviam interrompido
a obra. O livro de Ageu é coleção de breves mensagens “do Senhor” comunicadas
por meio do profeta em 520 a .C.
O profeta convida seus conterrâneos a estabelecerem as prioridades justas. É
necessário concluir a reconstrução do templo. Deus concederá paz e prosperidade
se o povo esquecer suas preocupações egoísticas e puser em primeiro lugar
aquilo que deve ter primazia.
7.2.11
O Livro de Zacarias
O profeta Zacarias era de
família sacerdotal e, como Ageu, esteve envolvido na reconstrução do templo,
concluído em 516 a .C.
Os caps. 1.- 8 do livro são profecias pronunciadas entre 520 e 518 a .C., apresentadas sob
forma de visões referentes à restauração de Jerusalém, à reconstrução do
templo, à purificação do povo de Deus e à promessa do futuro Messias. Os caps.
9 - 14 são uma coleção diferente de oráculos, talvez pronunciados por outro
autor. Tratam da espera do Messias e do juízo final.
7.2.12
O Livro de Malaquias
Na época de Malaquias o
templo tinha sido reconstruído, mas o povo continuava desiludido. O exílio havia acabado, mas os tempos
continuavam duros, muita gente passava mal e se sentia abandonada por Deus. O
profeta lembra-lhes o amor de Deus e convida os sacerdotes e o povo a
respeitá-lo e a obedecer-lhe. O povo não dava a Deus o que lhe era devido no
sacrifício, no culto e no comportamento.
8 - EVANGELHOS E ATOS - ESTRUTURA E ENSAIO
8.1
Introdução ao Novo Testamento
O
Novo Testamento têm 27 livros. Foi escrito em grego, não no
grego clássico dos eruditos, mas no do povo comum, chamado Koiné. Seus 27 livros também estão
classificados em 4 grupos, conforme o assunto a que pertencem: BIOGRAFIA. São os 4 Evangelhos; HISTORIA. É o livro de Atos dos
Apóstolos. EPÍSTOLAS. São 21 as
epístolas ou cartas. Vão de Romanos a Judas. 9 são dirigidas a igrejas (Romanos
a 2 Tessalonicenses); 4 são dirigidas a indivíduos (1 Timóteo a Filemom); 1 é
dirigida aos hebreus cristãos; 7 são dirigidas a todos os cristãos,
indistintamente (Tiago a Judas); PROFECIA.
É o livro de Apocalipse ou Revelação. Trata da volta pessoal do Senhor
Jesus a Terra e das coisas que precederão esse glorioso evento.
8.2
Os Evangelhos (Biografia)
Os quatro Evangelhos
compreendem cerca de 46 por cento no Novo Testamento. A igreja primitiva
colocou os Evangelhos no início do Cânon do Novo Testamento, não por serem eles
os primeiros livros escritos, mas por serem o fundamento sobre o qual Atos e as
Epístolas são edificados. Os Evangelhos ao mesmo tempo se originam do Antigo
Testamento e o cumprem, bem como fornecem um cenário histórico e teológico para
o restante do Novo Testamento.
A palavra grega euaggelion
se refere às “boas novas” ou “alegres novas” acerca de Jesus Cristo, que foi
oralmente proclamado. Mais tarde veio a ser também sido escritos depois, a
igreja primitiva considerou somente os quatro Evangelhos, da forma que os
conhecemos, como dotados de autoridade e divinamente inspirados. Foram
distinguidos uns dos outros pela preposição grega kata (“segundo”), acompanhada
pelo nome do escritor. A presente ordem dos quatro Evangelhos remonta pelo
menos ao final do segundo século, e cria-se ser esta a ordem em que eles foram
escritos. Embora haja quem teorize que os Evangelhos foram originalmente
escritos em Aramaico, não há evidência real para tal posição. Os habitantes da
Palestina eram primariamente bilíngües (aramaico e grego), e muitos eram
trilíngües (hebraico ou latim). O grego,
porém, era o idioma comum de todo o império, e por isso o mais adequado veículo
para as narrativas evangélicas.
Os quatro relatos
complementares fornecem um retrato composto da pessoa do Salvador, operando
juntos para fornecer profundidade clareza à nossa compreensão da mais singular
figura da história humana. Neles Jesus é visto como divino e humano, o Servo
soberano, O Deus-homem.
8.2.1
O Livro do Evangelho de Mateus
O Evangelho de Mateus foi
redigido principalmente para os judeus e anuncia a boa nova de que Jesus é o
salvador prometido, o Messias ou Cristo tão longamente esperado pelos judeus.
Com Jesus cumpriram-se todas as promessas feitas por Deus ao seu povo no Antigo
Testamento. O evangelho não traz o nome do autor, mas desde os primeiros tempos
se considerou que foi escrito por Mateus, o cobrador de impostos que se tornou
um dos doze amigos íntimos de Jesus. Se não escreveu todo o evangelho, é pelo
menos quase certamente o autor da coleção de discursos de Jesus incluída na
obra. O evangelho de Mateus foi escrito entre 50 e 100 d.C. Grande parte
do seu
conteúdo é muito
semelhante ao evangelho de
Marcos. Mas apresenta com exclusividade dez parábolas, e certo número de
episódios, bem como cinco grandes discursos. Começa com a genealogia e o
nascimento de Jesus (caps. 1-2). A seguir descreve a obra de João Batista, o
batismo de Jesus e o tempo de tentação passado por Jesus no deserto (caps.
3-4). Grande parte do evangelho é dedicada à pregação, aos ensinamentos e às
curas operadas por Jesus na Galiléia. Mateus no-lo apresenta como grande
mestre, que tem muitas coisas a dizer sobre o “reino” de Deus, sobre seu reino
no mundo (caps. 4; 1418). O ensinamento de Jesus divide-se em cinco grandes
seções: Caps. 5-7: o sermão da montanha, que responde a muitas perguntas sobre
o reino e constitui a base do ensinamento moral de Jesus. Cap. 10: instruções
dadas por Jesus aos doze antes de enviá-los em missão. Cap. 13:
parábolas sobre o reino. Cap. 18: Jesus explica o que significa segui-lo. Caps.
24-25: palavras de Jesus sobre a queda de Jerusalém, o fim desta era e o
advento de nova era. Depois Mateus descreve a viagem de Jesus da Galiléia a
Jerusalém (caps. 19-20), e os acontecimentos da última semana naquela cidade.
(caps. 21-27). A narrativa da morte de Jesus na cruz é seguida pela da
ressurreição, ou seja, como ele voltou à vida (cap. 28).
8.2.2
O Livro do Evangelho de Marcos
O Evangelho de Marcos, o
segundo dos quatro evangelhos que contam a vida de Jesus, mas provavelmente o
primeiro em ordem cronológica, é evangelho de ação, cheio de vida, que se
concentra sobre o que Jesus fez e os lugares onde andou, e não tanto sobre o
que ele disse e pensou. É o evangelho mais breve, composto de apenas dezesseis
capítulos, e talvez também o mais antigo, provavelmente escrito entre 65-70
d.C. Os escritores dos primeiros séculos do cristianismo afirmam que é obra de
João Marcos, com base no que ele ouvira do apóstolo Pedro. O nome de João
Marcos ocorre freqüentemente nos Atos e nas cartas do Novo Testamento. Tomou
parte da primeira viagem missionária de Paulo e mais tarde esteve com Pedro.
Após curta introdução dedicada a João Batista, ao batismo e às tentações de
Jesus, os primeiros nove caps. ocupam-se das curas e do ensinamento de Jesus na
Galiléia. Marcos mostra como os discípulos começaram gradativamente a
compreender melhor o Mestre, enquanto os seus inimigos se tornavam cada vez mais
hostis. Os caps. 11-15 descrevem a última semana de Jesus em Jerusalém e são
seguidos pela narrativa da sua ressurreição (cap. 16).
8.2.3
O Livro do Evangelho de Lucas
O evangelho de Lucas, a
terceira das quatro narrativas da vida de Jesus, é o mais minucioso de todos. A
história do crescimento e da difusão do cristianismo após o retorno de Jesus ao
céu o mesmo autor a continua no livro dos Atos. Os dois livros foram dedicados
a um funcionário romano de nome Teófilo. O autor do evangelho procurou informar-se
bem sobre a história e os fatos, e expõe o que aconteceu na Palestina durante a
vida de Jesus. A tradição afirma que toda a obra foi escrita por Lucas, o
médico que acompanhou Paulo em algumas de suas viagens. Começa com a história
do nascimento e da infância de João Batista e de Jesus (caps. 1-2), dando
muitas informações que se encontram só neste evangelho. Os caps. 3 - 9
referem-se ao batismo e às tentações de Jesus, bem como à sua pregação e seus
ensinamentos na Galiléia. A viagem de Jesus da Galiléia a Jerusalém ocupa
9.51–19.46. Algumas parábolas de Jesus incluídas nesta parte são exclusivas de
Lucas, como a do bom samaritano, a do filho pródigo e a do rico insensato. A
última semana de Jesus em Jerusalém é narrada de 19.47 a 23.56. Finalmente, o
cap. 24 conta como Jesus ressuscitou e voltou ao céu.
8.2.4
O Livro do Evangelho de João
O evangelho de João, a
quarta história neotestamentária da vida de Jesus, difere bastante dos três
anteriores. Provavelmente foi escrito por último, talvez em torno de 90 d.C.
Preocupa-se mais com o sentido dos fatos
que com os fatos em si, os quais presumivelmente já eram bem conhecidos na
época. Começa apresentando Jesus como a “Palavra” de Deus, existente antes do
tempo e, contudo nascida no tempo sob forma humana. O evangelho foi escrito
“para crerdes que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo,
tenhais a vida em seu nome” (Jo 20.31). O evangelho provavelmente contém as
recordações de João, o irmão de Tiago e um dos doze amigos mais íntimos de Jesus.
No texto João não é mencionado pelo nome e aparece só como “o discípulo que
Jesus amava”. Não está excluído que tenha sido redigido por um secretário.
Depois da introdução, que apresenta Jesus como a “Palavra” de Deus (Jo 1.1-18),
o evangelho prossegue descrevendo certo número de milagres chamados “sinais” ou
“obras” de Jesus, que mostram que ele é realmente o Salvador prometido (caps.
2-12). A história da sua pregação e dos seus ensinamentos é redigida de tal
modo que cada milagre é seguido de explicação e discussão. João também descreve
como alguns creram em Jesus e outros o rejeitaram. Não menciona nenhuma de suas
parábolas. Os caps. 13-19 tratam dos últimos dias de Jesus com os discípulos em
Jerusalém, transmitindo-nos as suas palavras de encorajamento e os seus
ensinamentos dados às vésperas de sua morte na cruz. Os caps. 20-21 narram
algumas aparições de Jesus aos discípulos depois da ressurreição. João vê nos
milagres “sinais” que mostram quem era Jesus. Além disso, utiliza uma série de
realidades comuns para indicar verdades ocultas sobre Jesus: água, pão, luz,
pastor e videira. Neste evangelho aparecem as famosas afirmações “Eu sou...”,
recordando a definição de Deus dada no livro do Êxodo (cap. 3): “Eu sou aquele
que é”. João apresenta Jesus como o caminho, a verdade e a vida.
8.2.5
O Livro dos Atos dos Apóstolos (Histórico)
O livro dos Atos continua a
história iniciada no evangelho de Lucas, sendo obra do mesmo autor. Fala
principalmente dos “atos” dos apóstolos Pedro e Paulo. Por causa da ênfase dada
ao poder de Deus, às vezes é com razão chamado de “Atos do Espírito Santo”.
Conta como os discípulos de Jesus difundiram a boa nova primeiramente em
Jerusalém e depois nas regiões circunjacentes da Judéia e de Samaria, até “aos
confins do mundo”. Cobre um período de cerca de trinta anos, desde o início da
Igreja, no dia de Pentecostes, até a prisão de Paulo em Roma. Os Atos foram
escritos entre 60 e 85 d.C. Os primeiros sete capítulos descrevem como o
movimento cristão teve inicio na própria Jerusalém com a vinda, em poder, do
Espírito Santo no dia de Pentecostes. O grupo cristão começou a cumprir a ordem
de Jesus de ensinar e pregar. A Igreja crescia e se difundia. Esta parte também
descreve como Estêvão, um dos primeiros cristãos, morreu pela sua fé. Os caps.
8-12 narram como o cristianismo, inicialmente devido à perseguição, propagou-se
na Judéia (região em torno de Jerusalém) e na Samaria (onde pessoas
pertencentes a uma nação inimiga e desprezada pelos judeus foram acolhidas com
alegria na Igreja). A dramática conversão
de Saulo (ou Paulo) na estrada de Damasco 'é seguida
da narrativa de como Pedro entendeu que a mensagem cristã era destinada a todas
as nações e não só aos judeus. A parte restante do livro trata das atividades
missionárias de Paulo e das suas viagens pelo mundo mediterrâneo, dos seus
processos e da sua prisão em Roma (caps. 13-28).
9 - EPÍSTOLAS PAULINAS
Introdução
As Epístolas Paulinas foram
os primeiros escritos do Novo Testamento. São 13 Epístolas na sua totalidade,
de Romanos a Filemom. As mesmas foram escritas entre 52 e 67 d.C. Pela ordem
cronológica, é consenso entre teólogos, que o primeiro livro do Novo Testamento
é o de 1 Tessalonicenses, escrito por volta de 52 d.C.; 2 Timóteo foi escrita
em torno de 67 d.C., pouco antes do martírio do apóstolo Paulo em Roma. Essas Epístolas
foram também as primeiras aceitas como canônicas. Pedro chama os escritos de
Paulo de "Escrituras" - título aplicado somente à Palavra inspirada
de Deus! (2Pe 3.15,16). Paulo é um personagem tão importante no Novo Testamento
e na história da igreja que tem sido chamado de o segundo fundador do
cristianismo. É claro que isso não é a verdade, pois desconsidera a
continuidade entre Jesus e Paulo e menospreza injustamente as contribuições de
homens tais como Pedro, João e Lucas. Mas não há dúvida de que Paulo
desempenhou um papel vital no crescimento e estabelecimento da igreja e na
interpretação e aplicação da graça de Deus em Cristo.
Essas Epístolas constituem
quase um quarto do Novo Testamento, colocando Paulo logo atrás de Lucas em
porcentagem do Novo Testamento escrito por um único indivíduo. E, caso se
acrescentem os 16 capítulos de Atos (13-28) que são quase inteiramente
dedicados a Paulo, este aparece em quase um terço do Novo Testamento.
Quem foi esse homem chamado
Paulo? O próprio Paulo apresenta um esboço rudimentar de sua origem e formação,
mas em suas Epístolas ,
esses dados acham-se dispersos. Os detalhes históricos básicos estão
convenientemente agrupados nos discursos que Paulo proferiu (relatados por
Lucas) diante de uma multidão hostil de judeus nos degraus do templo (At
22.1-21), do rei Agripa II e do procurador Romano Festo (At 26.2-23).
Paulo escreveu esta carta
aos cristãos de Roma em torno do ano 57 d.C., depois das chamadas três viagens
missionárias principais. Ainda não tinha viajado a Roma, mas pretendia fazê-lo.
Enviou assim a famosa epístola a fim de preparar a comunidade cristã da capital
do mundo, comunidade da qual conhecia alguns membros (cf. cap. 16), para a sua
visita. A carta expõe amplamente a concepção paulina da mensagem cristã, e foi
redigida depois das cartas aos Tessalonicenses, aos Gálatas e aos Coríntios. Poderíamos defini-la como o
manifesto de Paulo, pois nos dá a conhecer de maneira mais completa, clara e
raciocinada, o seu modo de entender as verdades cristãs fundamentais. Começa
saudando os cristãos de Roma e lhes anuncia aquilo que será a base da sua
carta: “... porque nele a justiça de Deus se revela da fé para a fé, conforme
está escrito: 'O justo viverá da fé' “ (Rm 1.17). A seguir demonstra que todos,
judeus e não-judeus, precisam de Deus por causa de seus pecados. Podemos ser
justificados perante Deus pela fé em Jesus Cristo (caps. 3-4). O perdão gratuito e a
nova vida dada por Deus mediante Cristo, a importância das leis divinas e da
ação do Espírito divino na vida de todo cristão constituem o objeto dos caps.
5-8, enquanto os caps. 9-11 tratam da posição atual de Israel no plano de Deus.
Paulo acha que os judeus não rejeitarão Jesus para sempre. Depois continua
(caps. 12-15) com algumas francas exortações a propósito do comportamento dos
cristãos: relações com as autoridades, deveres recíprocos e modo de viver num
mundo não-cristão. Por fim esclarece algumas complicadas questões de
consciência. A carta termina de maneira característica, com saudações pessoais
a amigos e palavras de louvor a Deus (cap. 16).
9.2
A Primeira Epístola aos Coríntios
Foi escrita por Paulo aos
cristãos de Corinto, cidade grega fervilhante de gente das mais variadas
nacionalidades e notória pelo seu comércio, sua cultura, suas muitas religiões
e pela sua imoralidade. A Igreja de Corinto fora fundada pelo Apóstolo durante
a sua permanência de dezoito meses na cidade, no decurso da segunda viagem missionária.
Agora Paulo recebia
más notícias e, quando alguns membros chegaram de Corinto para pedir-lhe
conselhos, entregou-lhes esta carta importante, que trata das principais
questões daquela comunidade eclesial: divisões (caps. 1-4), problemas morais e
de vida familiar (caps. 5-7), inclusive um caso de incesto e de cristãos que
intimavam a juízo outros cristãos perante tribunais pagãos. Paulo também
resolveu um problema de consciência que preocupava os cristãos a respeito do
alimento (caps. 8-10). A maior parte da carne vendida no comércio tinha sido
oferecida antes aos ídolos. Era permitido comêla? Os caps. 11-14 propõem
princípios para culto ordenado na igreja, especialmente durante a ceia do
Senhor. Tratam também dos dons especiais concedidos por Deus ao seu povo. A
carta delineia um quadro claro, nem sempre edificante, do modo como os
primeiros cristãos se reuniam e se comportavam. Explica também o sentido da
ressurreição de Jesus e de todos aqueles que morrem confiando nele (cap. 15).
No último capítulo o Apóstolo fala à igreja de Corinto sobre uma coleta que faz
para os cristãos pobres da Judéia e termina com saudações pessoais. O capo 13
em louvor da caridade, o dom mais precioso concedido por Deus ao seu povo, é um
dos textos paulinos mais famosos.
Paulo ditou-a cerca de um
ano depois da primeira (em torno de 56 d.C.), num momento em que as relações
entre ele e a Igreja de Corinto tinham chegado a ponto crítico. Durante aquele
ano alguns cristãos daquela comunidade tinham-no atacado duramente e, ao que
parece, Paulo lhes fizera curta visita. A carta mostra o seu grande desejo de
estar bem com esta igreja. Nos caps. 1-7 recorda a história das suas relações
com a comunidade de Corinto, explica o sentido das palavras severas usadas
anteriormente, manifesta sua gratidão pelas mudanças verificadas e se propõe
fazer a terceira visita, mais tranqüila. A seguir pede aos destinatários que
demonstrem generosidade para com as necessidades dos cristãos da Judéia (caps.
8-9). Nos caps. finais (10-13) Paulo defende com ardor seu título de apóstolo.
Numerosos cristãos da cidade tinham questionado o seu direito a este título.
Esta carta, com suas efusões, às vezes tempestuosas, outras vezes idílicas, é
das mais pessoais de Paulo. Nela deixa transparecer todo seu amor e preocupação
pela Igreja e revela seus sofrimentos e sua fé inabalável.
Esta carta representa um dos
primeiros esboços do pensamento paulino, mais tarde desenvolvido na carta aos Romanos.
Talvez seja de aproximadamente 57 d.C. (outros pensam que foi escrita cerca de
dez anos antes). Foi enviada a um grupo de igrejas da província romana da
Galácia (atual Turquia central), algumas das quais foram visitadas por Paulo.
Ele havia-lhes ensinado que o dom divino da nova vida era destinado a todos que
cressem e muitos ouvintes haviam correspondido. Mas depois vieram doutores
judeus afirmando que os cristãos deviam observar as leis do Antigo Testamento.
Por isto a carta responde a uma pergunta de vital importância: Os não-judeus
devem obedecer à lei judaica de Moisés para serem verdadeiros cristãos? Paulo
começa defendendo o seu direito de apóstolo, que fala com autoridade divina,
investido de missão especial junto aos não-judeus (caps. 12). A seguir argumenta (caps. 3-4):
Somos justificados unicamente pela fé em Cristo. A vida nova é dom de Deus para todos
aqueles que crêem. Nada podemos fazer para ganhá-la por nós mesmos. Conclui
mostrando que a conduta dos cristãos deriva do amor, que é fruto da fé em
Cristo (caps. 5-6). A carta aos Gálatas é uma peroração sobre a liberdade
cristã: “É para a liberdade que Cristo nos libertou. Permanecei firmes,
portanto, e não vos deixeis prender de novo ao jugo da escravidão” (Gl 5.1).
Trata-se provavelmente de
carta “circular” dirigida a um grupo de igrejas da região da atual Turquia
ocidental. A igreja de Éfeso era a mais importante do grupo. À semelhança das
cartas aos Filipenses, aos Colossenses e a Filemom, Paulo escreveu-a da prisão,
provavelmente em Roma, no início da década de 60 d.C. O grande tema é o plano
de Deus de “reconciliar em Cristo todas as coisas, as que estão nos céus e as
que estão na terra” (Ef 1.10). Começa com esta idéia da unidade (caps. 1-3).
Deus Pai escolheu o seu povo. Jesus, o Filho, libertou-o dos pecados e destruiu
as barreiras raciais, religiosas e culturais. O Espírito de Deus age na vida de
todo cristão para levá-lo de vitória em vitória. A segunda parte da carta convida os
fiéis a viver de modo tal que sua união em Cristo possa transparecer do seu
amor recíproco. Devemos sair das trevas e caminhar na luz! Paulo usa uma série
de imagens para ilustrar esta união em Cristo: o corpo, o edifício, as relações
entre marido e mulher. Toda a vida e experiência humana são vistas na luz de
Cristo, do seu amor, da sua morte na cruz, do seu perdão e da sua pureza. Paulo
termina convidando os cristãos a vestirem a “armadura de Deus para que possam
resistir no dia mau e sair firmes de todo o combate”.
Paulo fundou a igreja grega
de Filipos, a primeira igreja da Europa, em torno do ano 50 d.C. Escreveu esta
carta da prisão, segundo alguns, de Roma, em torno de 61-63 d.C., segundo
outros, de Éfeso, cerca de 54 d.C. Explica a sua situação aos filipenses e
agradece-lhes pelos presentes enviados. Exorta-os a perseverarem na fé, a não
serem orgulhosos e a seguirem o exemplo de Jesus, que “foi humilde e percorreu
o caminho da obediência”. Descreve a alegria e a paz daqueles que confiam em Cristo. Embora
estivesse preocupado com os falsos doutores que agiam na igreja de Filipos,
transparece claramente o seu afeto por aqueles cristãos. Não obstante o fundo
escuro da prisão, a carta está cheia de alegria, de confiança e de esperança
cristã.
Paulo ditou na prisão esta
carta aos cristãos de Colossos, provavelmente em Roma, em torno do ano 61 d.C.
ainda que não tivesse fundado esta igreja (região ocidental da Turquia),
preocupava-se com ela, porque quem a iniciou foi um dos seus convertidos,
Epafras, e ainda porque em Roma encontrara um escravo fugitivo dessa cidade.
Fora informado de que em Colossos agiam falsos doutores, os quais afirmavam que
para conhecer a Deus era necessário adorar estranhos poderes espirituais e
praticar determinados ritos. Esses homens introduziam idéias derivadas de
outras filosofias e religiões.
Por isso Paulo expõe a verdadeira
mensagem cristã (Cl 1–2.19). Jesus, e só ele, pode salvar o homem e darlhe a
verdadeira vida. Por meio de Jesus Cristo Deus criou o mundo. Prossegue
explicando o que significa esta vida nova na prática (Cl 2.20–4.6). Ela influi sobre tudo o que
fazemos e dizemos, sobre os sentimentos e sobre as relações domésticas, profissionais
e eclesiais. A carta termina com notícias pessoais (Cl 4.7-18).
Tessalônica era a capital da
província romana da Macedônia. Paulo fundara uma igreja aí durante a sua
segunda viagem missionária. Depois de ter chegado a Corinto, soube através de
Timóteo que os judeus continuavam a criar problemas por causa do grande
interesse dos não-judeus pela mensagem de Paulo. Em resposta, Paulo escreveu
esta carta. É uma das suas primeiras cartas que nos foi conservada, tendo sido
escrita em torno do ano 50 d.C., apenas vinte anos depois da morte de Jesus.
Paulo procura encorajar e tranqüilizar os cristãos de Tessalônica. Agradece a
Deus pelas boas notícias recebidas a respeito deles e lembra a sua visita
(caps. 1-3). Exorta-os a viver de modo a agradecer a Deus (1Ts 4.1-12) e trata
de alguns problemas sobre a esperada volta de Jesus (1Ts 4.13–5.11). Quando
retomará? O que acontecerá aos cristãos antes da sua volta? Termina a carta com
algumas instruções práticas, oração e saudações (1Ts 5.12-28).
Apesar da primeira carta de
Paulo (1ª Carta aos Tessalonicenses, acima), os cristãos de Tessalônica
continuavam confusos quanto à volta de Jesus. Alguns pensavam que o dia do seu
retorno já tinha chegado. Nesta segunda carta, escrita poucos meses depois da
primeira, Paulo lembra que a volta de Jesus será precedida por um tempo de
grande maldade (cap. 2). Termina exortando os cristãos a guardar a fé e a
trabalhar (cap. 3).
Timóteo era um jovem cristão, filho de pai grego e
mãe judia, originário de Listra, cidade da província da Galácia (região central
da Turquia). Viajou com Paulo e ajudou nas suas viagens missionárias
posteriores. Era tímido e não gozava de boa saúde, necessitando de ser
encorajado e apoiado. Quando Paulo lhe escreveu, Timóteo cuidava da igreja de
Éfeso. A carta dá muitos conselhos e orientações para a vida eclesial. Adverte
contra falsas doutrinas, em particular contra uma mistura de idéias judaicas e
gnósticas sobre a salvação e sobre a natureza do mundo físico. O destinatário
recebe instruções sobre a organização e o governo da igreja (caps. 1-3) e a
carta termina com recomendações mais pessoais a Timóteo sobre seu serviço na
igreja (caps. 4-6).
Grande parte desta carta
contém conselhos pessoais de Paulo a Timóteo. Exorta Timóteo a permanecer fiel
à boa nova de Jesus Cristo e a perseverar na atividade de mestre e
evangelizador, apesar da oposição e da perseguição. Acautela-o contra discussões inúteis e encoraja-o com o exemplo
de sua própria fé, que continua firme depois de uma vida cheia de sofrimentos:
“Terminei minha carreira, guardei a fé. Desde já me está reservada a coroa da
justiça” (2Tm 4.7-8).
9.12
A Epístola a Tito
Tito era cristão grego, que
ajudou Paulo no seu trabalho missionário. Paulo escreveu esta carta a Tito em
Creta, onde este ajudava na supervisão da igreja. Esta comunidade tinha
problemas semelhantes aos enfrentados por Timóteo em Éfeso: doutrinas falsas e
discussões inúteis. Paulo lembra ao discípulo que os chefes cristãos devem ter
bom caráter (cap. 1). Explica os deveres que tem para com os diferentes grupos
de cristãos (cap. 2) e termina com exortações e conselhos gerais sobre o
comportamento dos cristãos.
É carta particular de Paulo
ao seu amigo Filemom, cristão convertido de Colossos (na Turquia ocidental).
Filemom possuía um escravo de nome Onésimo que fugira. Onésimo encontrara Paulo
na prisão e tornara-se cristão. Paulo escreve ao amigo para exortálo a perdoar
ao fugitivo e acolhê-lo como irmão cristão. A carta provavelmente foi levada a
Colossos pelo próprio Onésimo, juntamente com a carta dirigida à igreja local.
10 - HEBREUS, EPÍSTOLAS GERAIS E APOCALIPSE
10.1
Epístola aos Hebreus
Na versão do Pe. Figueiredo
é intitulada Epístola de S. Paulo. Na versão de Almeida, é anônima, porque nos
manuscritos mais antigos seu autor não é mencionado. Figueiredo baseou-se no
título da Epístola como se encontra na Vulgata, “Epístola Pauli ad Hebraeos”. A
Igreja Oriental aceitou, desde o princípio, a autoria paulina para esta
Epístola. Só no 4º Século a Igreja Ocidental aceitou-a como obra de Paulo.
Eusébio considerava Paulo seu autor. Tertuliano chamou-a Epístola de Barnabé.
Clemente de Alexandria pensava que Paulo a escreveu em hebraico, e Lucas a
traduziu para o grego (é escrita em excelente grego). Orígenes disse que os
pensamentos dela eram os de Paulo, e considerava este seu provável autor, mas
acrescentou, “Quem a escreveu, só Deus sabe com certeza”. Lutero supunha fosse
Apolo, não havendo para esta opinião nenhuma evidência antiga. Ramsay sugere o
nome de Filipe. Harnack e Rendel Harris sugerem Prisca. Alguns a atribuem a
Lucas, ou Silas, ou Clemente de Roma. Ferrar Fenton pensa que somente Paulo
podia escrevê-la, e que o fez, originalmente, em hebraico, mandando algum dos
seus auxiliares traduzi-la para o grego. Em geral, a opinião tradicional e
multissecular, ainda hoje largamente admitida, é a favor de Paulo.
Evidentemente,
foi escrita antes da destruição de Jerusalém, ocorrida em 70 d.C. Se Paulo a
escreveu, parece provável que o fez de Roma, 62-64 d.C. O sentido natural,
ainda que não necessário, da frase “os da Itália vos saúdam”, 13.24, é que a
carta foi escrita da Itália. Timóteo estava com o autor, 13.23. Fora com Paulo
a Jerusalém, At 20.4, de onde o acompanhou a Roma, Cl 1.1. Acabara de ser
solto, e Paulo planejava enviá-lo de volta ao oriente, Fp 2.19, 24, esperando
que em breve ele também iria. E parece que ele e Timóteo tinham o plano de
voltar a Jerusalém, 13.23, uma vez que
os líderes, a quem a carta se dirige, eram amigos de Paulo, o que se poderia
inferir de 13.19. Esta Carta pode ter sido escrita, mais ou menos, ao tempo da
Epístola aos Filipenses.
10.1.1
Epístolas Gerais
A Epístola de Tiago está em
primeiro lugar no grupo de sete livros do Novo Testamento denominado as
Epístolas Gerais ou Católicas. As igrejas evangélicas estiveram hesitantes, por
razões óbvias, em usar o termo “católicas” na descrição destas sete cartas. O
termo em si é uma transliteração do adjetivo grego katolikós, que significa
“geral' ou “universal”. Dois adjetivos latinos (generalis, universalis)
traduzem a palavra grega perfeitamente, mas a Vulgata transliterou o grego como
catholicas. É da Vulgata que o título Epístolas Católicas tornou-se uso comum
entre os tradutores e estudiosos.
O termo católicas foi pela
primeira vez aplicado às sete cartas como um grupo por Eusébio (265-340 d.C.),
embora escritores mais antigos tenham chamado as cartas individuais deste grupo
de “gerais”. Um comentário anônimo do sétimo século sobre a Epístola de Tiago
afirma que o termo foi usado porque estas cartas são encíclicas; ou seja, não
são endereçadas a igrejas ou pessoas individuais, mas escritas coletivamente a
todas as igrejas. Esta descrição geral vale para Tiago, 1 e 2 Pedro, 1 João e
Judas. 2 e 3 João, contudo, são endereçadas a um grupo, ou pessoa, particular
e, assim, não caem dentro da definição. Mas estas duas cartas foram
consideradas como anexas a 1 João e foram agrupadas juntamente com ela.
A posição destas sete
cartas, nas edições modernas do Novo Testamento, segue a ordem da Vulgata. Esta
é a ordem geralmente adotada pela igreja ocidental (Evangelhos, Atos, Epístolas
Paulinas, Epístolas Gerais, Apocalipse), que parece representar a primazia que
a igreja ocidental deu a Paulo. Na igreja oriental, estas sete cartas
seguiam-se a Atos. Como um grupo de oito (chamado praksapóstoloi), elas
normalmente eram colocadas entre os Evangelhos e as cartas paulinas, mas às
vezes depois de Paulo. Os dois grandes manuscritos unciais gregos do quarto
século diferem neste ponto. O Vaticanus tem os Evangelhos, Atos, Epístolas
Gerais e Epístolas Paulinas (faltam, neste manuscrito, Hebreus 9.14-13.25, as
Pastorais, Filemom e Apocalipse). O Sinaiticus tem os Evangelhos, Epístolas
Paulinas, Atos, Epístolas Gerais e Apocalipse.
10.2
Epístola de Tiago
Tiago é dirigida “às doze
tribos que se encontram na Dispersão” (Tg 1.1) e é claro nos vs. 1.19 e 2.1,7
que esta saudação se refere aos cristãos hebreus que estavam fora da Palestina.
Seu lugar de reunião é chamado de “sinagoga” no texto grego de Tg 2.2, e toda a
epístola reflete o pensamento e expressões judaicas (Tg 2.19, 21; 4.11-12; 5.4,
12). Não há referências à escravidão ou idolatria, e isso também se adapta a
uma leitura originalmente judaica. É possível que os destinatários fossem os
primeiros convertidos em Jerusalém, que, após a morte de Estêvão, foram
dispersos pela perseguição (At 8.1) até a Fenícia, Chipre, Antioquia da Síria e
além (At 11.19). Isso explicaria a ênfase inicial da carta quanto ao sofrer com
alegria as provações que testam a fé e que demandam perseverança (Tg 1.2-12), o
conhecimento pessoal que Tiago demonstra ter pelos crentes “dispersos”, e o tom
de autoridade da carta. Como pastor da igreja de Jerusalém, Tiago escreve às
suas ovelhas dispersas.
Segundo o historiador Flávio
Josefo, Tiago foi martirizado em 62 d.C. (Hegesipo, citado em Eusébio, fixou a
data da morte de Tiago em 66 d.C.). Aqueles que o aceitam como autor da
epístola têm sugerido uma data para sua redação entre 45 d.C. e o final de sua
vida. Entretanto, vários fatores indicam que essa epístola pode ter sido
escrita (cerca de 46-49 d.C.).
10.3
Primeira Epístola de Pedro
A Igreja primitiva
reconhecia universalmente a autenticidade e a autoria de 1 Pedro. As evidências
internas apóiam esse consistente testemunho externo de várias maneiras. O nome
do apóstolo Pedro é dado em 1Pe 1.1, e há semelhanças definitivas entre certas
expressões nesta epístola e os sermões de Pedro, conforme registrados no Livro
de Atos (1Pe 1.20 e At 2.23; 1Pe 4.5 e At 10.42). Duas vezes em Atos Pedro usou a
palavra grega xy/on, “madeiro, árvore”, para falar sobre a cruz, e esse uso
distinto é encontrado em 1 Pedro (cf. At 5.30; 10.39; 1Pe 2.24). A epístola
contém um número de alusões aos acontecimentos da vida de Cristo que tiveram
especial importância para Pedro (1Pe 2.23; 3.18; 4.1; 5.1; cf. 5.5 e Jo 13.4).
Entretanto, os críticos
desde o século dezenove vêm desafiando a autenticidade de 1 Pedro por várias
razões. Uns dizem que 1Pe 1.1-2 e 4.12-5.14 foram acréscimos feitos mais tarde
que tomaram um pronunciamento anônimo ou um sermão batismal em uma epístola de
Pedro. Outros argumentam que os sofrimentos experimentados pelos leitores desta
epístola devem se referir à perseguição dos cristãos que ocorreu depois da
época de Pedro, nos reinados dos imperadores Domiciano (81-96 d.C.) e Trajano
(98-117 d.C.). Não há base para o primeiro argumento e o segundo argumento
deduz falsamente que os cristãos não estavam sendo insultados por causa da sua
fé durante a vida de Pedro. Um outro desafio afirma que a qualidade do grego
desta epístola é muito elevada para um Galileu como Pedro. Mas os galileus eram
bilíngües (aramaico e grego), e escritores como Mateus e Tiago eram muito
capacitados no uso do grego. É também provável que Pedro tenha usado Silvano
como escriba (1Pe 5.12; Paulo o chama de Silvano em 2Co 1.19; 1Ts 1.1; 2Ts 1.1;
Lucas o chama de Silas em At 15.40-18.5), e Silvano pode ter atenuado o
discurso de Pedro nesse processo.
Esta epístola foi dirigida
aos cristãos da Ásia Menor, indicando que o evangelho se espalhou por regiões
não-evangelizadas quando Atos foi escrito (Ponto, Capadócia, Bitínia; 1Pe 1.1).
É possível que Pedro tenha visitado e ministrado em algumas dessas áreas, mas
não há evidência. Ele escreveu esta epístola em resposta às notícias da
crescente oposição aos crentes na Ásia Menor (1Pe 1.6; 3.13-17; 4.12-19;
5.9-10). A hostilidade e a suspeita aumentavam contra os cristãos no Império, e
eles estavam sendo insultados e maltratados por causa de seu estilo de vida e
conversa subversiva sobre outro Reino. O Cristianismo ainda não tinha recebido
a interdição oficial romana, mas o palco estava sendo montado para a
perseguição e martírio no futuro próximo.
A vida de Pedro foi mudada
drasticamente após a ressurreição, e ele ocupava um papel central na Igreja
primitiva e no anúncio do evangelho para os samaritanos e gentios (At 2-10).
Após o Concílio de Jerusalém, registrado em At 15, bem pouco se diz em relação
às atividades de Pedro. Ele, evidentemente, viajou extensivamente com sua
esposa (1Co 9.5) e ministrou em várias províncias romanas. Segundo a tradição,
Pedro foi crucificado de cabeça para baixo em Roma antes da morte de Nero, em
68 d.C. Esta epístola foi escrita em Babilônia (1Pe 5.13), mas os estudiosos
estão divididos a respeito dessa parte se referir literalmente à Babilônia na
Mesopotâmia ou simbolicamente a Roma. Não há tradição de que Pedro foi para a
Babilônia, e, na sua época, ela possuía poucos habitantes. Por outro lado, a
tradição, consistentemente, indica que Pedro passou seus últimos anos de vida em Roma. Como um centro de
idolatria, o termo “Babilônia” era uma designação figurada apropriada para Roma
(o uso de Babilônia em Ap 17; 18).
10.4
Segunda Epístola de Pedro
Nenhum outro livro no Novo
Testamento cria mais problemas de autenticidade do que 2 Pedro. Diferentemente
de 1 Pedro, essa epístola possui um testemunho externo muito fraco, e a
genuinidade é maculada por dificuldades internas também. Por causa desses
obstáculos, muitos estudiosos rejeitam a autoria de Pedro para essa epístola,
mas isso não significa que não haja evidência para a posição oposta.
O testemunho externo para a
autoria de 2 Pedro é mais fraco do que qualquer outro livro do Novo Testamento,
mas até o quarto século ela se tornou reconhecida como uma obra autêntica do
apóstolo Pedro. Não há qualquer citação do segundo século, de 2 Pedro que seja
incontestável, mas no terceiro século ela é citada em escritos de vários pais
da Igreja, principalmente Orígenes e Clemente de Alexandria. Os escritores do
terceiro século estavam freqüentemente conscientes a respeito de 2 Pedro e
respeitavam seu conteúdo, mas ainda era catalogada como um livro contestável. O
quarto século via o reconhecimento oficial da autoridade de 2 Pedro apesar de
algumas dúvidas. Por várias razões, 2 Pedro não foi rapidamente aceita como um
livro canônico. (1) A sua lenta circulação evitou que ela fosse mais conhecida.
(2) Sua brevidade e conteúdo limitam grandemente o seu número de citações nos
escritos dos líderes da Igreja primitiva. (3) O atraso no reconhecimento
significou que 2 Pedro tinha de competir com outras obras escritas mais tarde
que reivindicavam a autoria de Pedro (p. ex., o Apocalipse de Pedro). (4)
Diferenças de estilo entre 1 e 2 Pedro também levantaram dúvidas.
Por outro lado, 2 Pedro traz
testemunho abundante de sua origem apostólica. Ela reivindica ser “Simão Pedro”
(1.1), e 3.1 diz. “Amados, esta é, agora, a segunda epístola que vos escrevo.”
O autor se refere à profecia do Senhor sobre a morte do apóstolo em 1.14 (Jo
21.18-19) e diz que ele foi uma testemunha ocular da Transfiguração (1.16-18).
Como um apóstolo (1.1), ele se coloca num nível de igualdade com Paulo (3.15).
Há também palavras distintas que são encontradas em 2 Pedro e nos sermões de
Pedro em Atos, assim como palavras incomuns, e expressões compartilhadas entre 1 a 2 Pedro.
No lado negativo, numerosas
áreas problemáticas desafiam a posição tradicional. (1) Há diferenças entre o
estilo e vocabulário de 1 e 2 Pedro. O grego de 2 Pedro é rude e deselegante,
comparado com o de 1 Pedro, e há também diferenças na informalidade e no uso do
Antigo Testamento. Mas essas diferenças são geralmente exageradas e podem ser
explicadas. Pelo fato de Pedro ter usado Silvano como seu secretário para a 1
Pedro e suas próprias mãos na 2 Pedro. (2) Argumenta-se que a 2 Pedro usou uma
passagem de Judas para descrever falsos mestres e que a Epístola de Judas foi
escrita após a morte de Pedro. Entretanto, esta é uma questão discutível, e é
possível que Judas tenha citado Pedro ou que ambos usaram uma fonte em comum.
(3) A referência a uma coleção de epístolas de Paulo (3.15-16) implica numa
data tardia para essa epístola. Mas não é necessário concluir que todas as
epístolas de Paulo estivessem sendo consideradas aqui. O contato de Pedro com
Paulo e seus associados, indubitavelmente, o fizeram conhecer várias epístolas
paulinas. (4) Alguns estudiosos dizem que os falsos ensinamentos mencionados na
2 Pedro eram uma forma de gnosticismo que emergiu após a época de Pedro, mas há
evidência insuficiente para apoiar essa posição. Uma alternativa para a autoria
de Pedro é uma falsificação feita mais tarde em seu nome. Mesmo a sugestão de
que a 2 Pedro tenha sido escrita por um dos discípulos de Pedro não pode
superar o problema de deturpação. Além do mais, a 2 Pedro é claramente superior
a qualquer escrito pseudônimo.
Apesar dos problemas
internos e externos, a posição tradicional da autoria de Pedro supera mais
dificuldades do que qualquer outra opção. Essa epístola foi escrita pouco antes
da morte do apóstolo (1.14), provavelmente em Roma. Seu martírio
aconteceu entre 64 e 66 d.C. (se Pedro estava vivo em 67 quando Paulo escreveu
a Segunda Timóteo durante seu segundo cárcere romano, é improvável que Paulo o
tivesse mencionado).
10.5
As Epístolas Joaninas
Cinco livros do Novo
Testamento são atribuídos ao apóstolo João. O Evangelho de João, o Apocalipse e
as três chamadas Epístolas de João. Estes cinco livros, conhecidos como a
literatura joanina, contêm os três tipos de literatura encontrada no Novo
Testamento: histórica, epistolar e apocalíptica. As três Epístolas estão
incluídas no grupo de escritos neotestamentários denominados Epístolas Gerais.
Esta classificação pode ter sido útil para separar e identificar os vários
livros do cânon, mas as três Epístolas, na realidade, não incidem na categoria
de gerais ou universais (católicas). A primeira não tem a característica
costumeira de uma carta (identificação introdutória do autor e receptores,
encerramento com despedida) e a segunda e a terceira são breves, pessoais e
dirigidas a leitores específicos. As três Epístolas são fortemente
reminiscentes do Evangelho de João e, como este, nunca cessaram de fazer arder
os corações dos cristãos com o tema central do amor. Como o quarto Evangelho,
elas são de estrutura simples, mas de pensamento profundo. A teologia e o
pensamento destas Epístolas tornam-nas importantes no estudo do Novo Testamento
e mostram as ameaças de heresia e do abuso de autoridade, como o fazem poucos
outros livros do Novo Testamento.
Que as três Epístolas provêm
do mesmo autor é evidente, mediante uma leitura cuidadosa. As “irmãs gêmeas”, 2
e 3 João, com certeza têm o mesmo autor,
que se denomina “o ancião” (2 João 1; 3 João 1). As comparações destas duas
Epístolas mostram, tão conclusivamente quanto possível, com material tão
sucinto, o mesmo autor (2 João 1; 2 João
1; 2 João 4; 3 João 3; 2 João 10,11; 3
João 5,6; 2 João 12; 3 João 13,14). A Terceira Epístola foi endereçada a um
indivíduo, e isto pode explicar suas diferenças com a Segunda Epístola, que foi
escrita a uma Senhora Eleita. As semelhanças entre as duas só podem ser explicadas
como ambas sendo provenientes da mesma mão, precisamente porque o assunto e o
número de leitores são tão diferentes. Quando estas duas cartas (e mais
particularmente 2 João) são colocadas num estudo comparativo com a Primeira
Carta, que é mais extensa, dificilmente se pode duvidar de que todas provieram
do mesmo autor (1 João 1.4; 2 João 12; 1 João 1.6,7; 2.6,11; 2 João 4; 1 João
2.7; 2 João 5,6; 1 João 2.14, 24; 2 João 2; 1 João 2.18; 4.1-5; 2 João 7; 1
João 2.23; 2 João 9;1 João 3.6,9; 2 João
11). Dos treze versículos de 2 João, pelo menos oito podem ser combinados com
versículos de 1 João. É inescapável o fato de que todas as três Epístolas
vieram da mesma mão.
10.5.1
O tempo de 1 João
Em At 8.14, João é associado
com “os apóstolos, que estavam em Jerusalém”, e Paulo o chama de “coluna” da
Igreja de Jerusalém em GI 2.9. Com exceção de Ap 1, o Novo Testamento silencia
a respeito desses últimos anos, mas a tradição cristã primitiva, uniformemente,
nos diz que ele saiu de Jerusalém (provavelmente não muito antes de sua
destruição, em 70 d.C.) e que ministrou em Éfeso e, nas suas vizinhanças. As
sete igrejas da província romana da Ásia, mencionadas em Ap 2-3, eram
evidentemente uma parte desse ministério. Embora não haja um destinatário em 1
João, é provável que o apóstolo tenha dirigido sua epístola às igrejas
asiáticas que estavam no âmbito de sua supervisão.
10.5.2
O tempo de 2 João
Julgando pelo conteúdo e
circunstâncias de 2 João, ela era evidentemente contemporânea de 1 João ou foi
escrita não muito tempo depois. Foi, provavelmente, escrita por volta do ano 90
d.C.
10.5.3
O tempo de 3 João
Os paralelos entre João 2 e
3 sugerem que essas epístolas foram escritas na mesma época (90 d.C.).
Escritores cristãos primitivos são unânimes em seu testemunho de que o quartel
general de João ao fim de seu ministério era em Éfeso, a principal cidade da
província romana da Ásia. Evidentemente, João enviava um número de mestres
viajantes para espalharem o evangelho e para solidificarem as igrejas
asiáticas, e esses mestres eram apoiados por cristãos que os recebiam em seus
lares.
10.6
O Livro de Judas
Apesar do assunto e tamanho
limitados, Judas foi aceita como autêntica e citada pelos pais da Igreja
primitiva. Pode haver alusões mais antigas, mas referências irrefutáveis a essa
epístola aparecem no final do segundo século. Ela foi incluída no Cânon
Muratoriano (cerca de 170 d.C.) e aceita como parte das Escrituras pelos
antigos líderes, tais como Tertuliano e Orígenes. Entretanto, dúvidas surgiram
em relação ao lugar de Judas no Cânon, por causa de seu uso dos Apócrifos. Ela
foi um livro contestado em algumas partes da Igreja, mas, finalmente, ganhou o
reconhecimento universal.
10.6.1
O tempo de Judas
Por causa do silêncio do
Novo Testamento e da tradição a respeito dos últimos dias de Judas, não podemos
saber onde a epístola foi escrita. Nem há qualquer forma de saber a data exata:
Partindo do princípio de que 2 Pedro veio primeiro. (64-66 d.C.), a época
provável é 66-80 d.C. (O silêncio de Judas em relação à Jerusalém não prova que
ele escreveu essa epístola antes de 70 d.C.).
10.7
O Livro do Apocalipse (Profecia)
O Apocalipse é o último
livro do Novo Testamento e singular entre os demais. Ele é, ao mesmo tempo, uma
revelação do futuro (1.1,19), uma profecia (1.3; 22.7, 10, 18, 19) e um
conjunto de sete cartas (1.4,11; 2.1-3.22). (“Apocalipse” deriva da palavra
grega apokalupsis, traduzida por “revelação” em 1.1). O livro é uma revelação
divina quanto à natureza do seu conteúdo, uma profecia quanto à sua mensagem e
uma epístola quanto aos seus destinatários.
Cinco fatos importantes no
tocante ao contexto deste livro são revelados no capítulo 1.
1)a
“revelação de Jesus Cristo” (1.1).
2)Essa
revelação fo’i comunicada ao autor, de modo sobrenatural, por Cristo glorificado,
por anjos e visões que ele teve (1.1, 10-18).
3)A
comunicação foi concedida ao servo de Deus, João (1.1, 4, 9; cf. 22.8).
4)João
teve as visões e recebeu a mensagem apocalíptica quando exilado na ilha de
Patmos (80
quilômetros a sudoeste de Éfeso), por causa da Palavra
de Deus e do testemunho do próprio João (1.9).
5)Os
destinatários iniciais foram sete igrejas da província da Ásia (1.4, 11).
As evidências históricas e
internas do livro indicam o apóstolo João como o seu autor. Irineu verifica que
Policarpo (Irineu conheceu a Policarpo, e este conheceu o apóstolo João)
referiu-se a João, escrevendo o Apocalipse perto do fim do reinado de
Domiciano, imperador romano (81-96 d.C.).
O livro retrata as
circunstâncias históricas do reinado de Domiciano, o qual exigiu que todos os
seus súditos lhe chamassem de “Senhor e Deus”. Sem dúvida, o decreto do
imperador originou um confronto entre os que se dispunham a adorá-lo e os
crentes fiéis que confessavam que somente Jesus era “Senhor e Deus”. Destarte,
o livro foi escrito num período em que os crentes enfrentavam intensa
perseguição por causa de seu testemunho. A tribulação aparece através do
contexto do livro de Apocalipse (1.19; 2.10, 13; 7.14-17; 11.7; 12.11, 17;
17.6; 18.24; 19.2; 20.4).
11 - O CÂNON BÍBLICO
11.1
O Cânon Bíblico do Antigo Testamento
A
palavra "cânon" é de origem cristã e derivada do vocábulo grego
"kanon" que por sua vez provavelmente veio emprestado do hebraico
"kaneh", que significa “junco” ou “vara de medir”; (Ez 40.5) daí
tomou o sentido de norma ou regra. Mais tarde veio a significar regra de fé e,
finalmente, catálogo ou lista (Gl 6.16)
A palavra cânon, usada para designar a coleção
dos livros que integram as Sagradas Escrituras, não aparece até o século IV,
com Atanásio. Dão-se à palavra dois usos distintos, mas de certo modo
relacionados: “Em primeiro lugar, ela é usada para indicar uma coleção daqueles
livros aos quais se tenha aplicado determinada prova e que foram reconhecidos
como autênticos e 'canônicos'. Logo, aplica-se o termo a toda a coleção de
escritos, posto que ela constitui o cânon ou 'regra de fé' mediante a qual toda
doutrina deve ser provada" (HAMMOND, 1978, p. 36).
O cânon do Antigo Testamento
ainda não havia sido fixado no tempo do Novo Testamento, mas quando os judeus
da Palestina, em fins do século I, fixaram o cânon de suas Escrituras, este
incluía todos os livros que atualmente temos em nossas versões. O uso que se
fez desses livros nos tempos do Novo Testamento permaneceu testemunhado em cada
página deste último livro; e uma rápida olhada nas referências de nossas
Bíblias nos dará uma idéia de quão profundo e sistemático foi esse uso. Mas
essas Escrituras não eram suficientes "para o bem-estar da Igreja, para a
pureza do evangelho e para a direção do crente; por isso, aprouve a Deus chamar
à existência uma graphé cristã,
o cânon do Novo Testamento que a Igreja acrescentou à graphé do Antigo Testamento" (RAMM, 1967, p. 177).
11.2
Divisões do Antigo Testamento
O
próprio Senhor Jesus Cristo deu seu apoio de legitimidade a todo o Antigo
Testamento; fez citações de cada uma de suas divisões; porém, nunca citou
qualquer outro livro, nem deu a entender que existam outros livros inspirados.
Sabemos que existiam muitos outros livros escritos na língua hebraica, dos quais
cerca de 15 ou mais são mencionados no Antigo Testamento mesmo (o livro dos
Justos, em Js 10.13; 2Sm 1.18; o livro das Guerras do Senhor, em Nm 21.14).
Como foram escolhidos os 39
livros do meio de tantos outros? A verdadeira prova é sua inspiração. Se Deus
falou pelo Espírito por intermédio de algum escritor humano, então o tal livro
é inspirado e útil para os propósitos de Deus. Os livros que têm esse selo
divino foram reconhecidos como divinos tanto pelo povo comum como pelos líderes
e sacerdotes, e o tempo mostrou gradualmente que a seleção fora bem feita.
Tais
livros foram escritos entre 2000 e 400 a .C. O livro de Jó, com muita
probabilidade, data do tempo dos próprios patriarcas, e o livro de Malaquias
foi escrito entre 425 a
400 a .C.
Muitos outros escreveram depois de Malaquias, mas os judeus consideravam esses
escritos tão somente como histórias humanas.
Entre
os judeus, o Antigo Testamento tem três divisões, as quais Jesus citou em Lc
24.44 – Leis, Profetas, Escritos -, algumas traduções trazem Salmos por ser o
primeiro livro dos Escritos. O cânon hebraico apresenta unificação de alguns
livros: 1,2 Samuel; os dois dos Reis; os dois Crônicas; Esdras e Neemias; os
doze profetas menores, são um livro cada.
A
ordem dos livros no cânon hebraico é também diferente da nossa. Há uma tríplice
divisão como já mencionamos (Lei, Profetas e Escritos). Lei: Gênesis, Êxodo,
Levítico, Números e Deuteronômio. Profetas: Primeiros Profetas - Josué, Juízes,
Samuel e Reis; últimos Profetas - Isaías, Jeremias, os Doze. Escritos:
Divididos em Livros
Poéticos - Salmos, Provérbios e Jó; os Cinco Rolos -
Cantares, Rute, Lamentações, Eclesiastes, Ester. Livros Históricos:
Daniel, Esdras, Neemias e Crônicas.
Os Cinco Rolos eram assim
chamados porque eram rolos separados, lidos anualmente em festas distintas:
Cantares, na Páscoa, em alusão ao Êxodo.
Rute, no Pentecoste, na celebração da colheita, em seu início
(Primícias). Ester, na festa do Purim,
comemorando o livramento de Israel da mão do mau Hamã. Eclesiastes, na Festa
dos Tabernáculos – festa de gratidão pela colheita. Lamentações, no mês de
Abibe, relembrando a destruição de Jerusalém pelos babilônicos.
No cânon hebraico os livros não estão em ordem cronológica. Os
judeus não se preocupavam com um sistema cronológico.
Já a nossa divisão do Antigo
Testamento em 39 livros vem da Septuaginta oriunda da Vulgata Latina. A
Septuaginta foi à primeira tradução das Escrituras, feita do hebraico para o
grego, cerca de 290 a .C.
Nela a ordem dos livros está por assunto: Pentateuco, Históricos, Poéticos e
Proféticos.
O Cânon do Antigo Testamento
foi formado num espaço de um pouco mais de mil anos e corresponde o período de
Moisés a Esdras. Moisés escreveu as primeiras palavras do Pentateuco por volta
de 1491 a .C.
Esdras entrou em cena em 445 a .C.
Esdras não foi o último escritor na formação do cânon do Antigo Testamento. Os
últimos escritores foram Neemias e Malaquias, no entanto, de acordo com os
escritos históricos, foi Esdras que, na qualidade de escriba e sacerdote,
reuniu os rolos canônicos, ficando também o cânon encerrado em seu tempo
(GILBERTO, 1986, p. 52).
A doutrina da inspiração da
Bíblia foi completamente desenvolvida apenas nas páginas do Novo Testamento.
Mas, muito antes disso, já encontramos na história de Israel certos escritos
reconhecidos como autoridade divina e como regra escrita de fé e conduta para o
povo de Deus. Identificamos isso na resposta do povo, quando Moisés leu para
eles o livro do concerto (Êx 24.7), ou quando o Livro da Lei, achado por
Hilquias, foi lido primeiro para o rei e depois para a congregação (2Rs 22-23;
2Cr 34), ou ainda quando Esdras leu o Livro da Lei para o povo (Ne 8.9, 14-17;
10.28-39; 13.1-3). O Pentateuco é
tratado com a mesma reverência em Josué 1.7, 8, 8.31 e 23.6-8; 1 Reis 2.3, 2
Reis 14.6 e 17.37, Oséias 8.12, Daniel 9.11,13, Esdras 3.2, 4, 1 Crônicas
16.40, 2 Crônicas 17.9, 23.18, 30.5,18, 31.3 e 35.26. Apresenta-se basicamente
como obra de Moisés, um dos primeiros e certamente o maior profeta do Antigo
Testamento (Nm 12.6-8; Dt 34.10-12). Deus comumente falava por Moisés de viva
voz, como também fez mais tarde com os profetas, mas a atividade de Moisés como
escritor também é mencionada muitas vezes (Êx 17.14; 24.4, 7; 34.27; Nm 33.2;
Dt 28.58, 61; 29.20-27; 30.10; 31.9-13, 19, 22, 24-26).
A razão de Moisés e os
profetas registrarem por escrito a mensagem de Deus, não se contentando apenas
em entregá-Ia oralmente, era que às vezes a enviavam a outros lugares (Jr
29.1; 36.1-8; 51.60, 61; 2Cr 21.12). Mas, na maioria das vezes, era para
preservá-Ia para o futuro, como um memorial (Êx 17.14) ou uma testemunha (Dt
31.24-26), a fim de que ficasse escrita para o tempo vindouro (Is 30.8).
Portanto a forma permanente e durável da
mensagem de Deus não era sua forma falada, mas sua forma escrita, e isso
explica o surgimento do cânon do Antigo Testamento.
Vemos conforme o caso do
livro do concerto, cuja alusão reporta-se a Êxodo 24.7, que foi possível um documento
pequeno, como Êxodo 20-23, tornar-se canônico antes que toda a obra estivesse
concluída. Deuteronômio também já era considerado canônico mesmo no tempo em que Moisés vivia (Dt
31.24-26), pois foi colocado ao lado da arca do concerto. Contudo, a parte
final de Deuteronômio foi escrita depois da morte de Moisés. Notamos também
numerosas referências ao Pentateuco (no todo ou em parte) como canônico, em
outros livros do Antigo Testamento, que continuaram a ocorrer na literatura
existente entre os dois Testamentos. Sem dúvida, a causa disto, deve-se à sua
importância fundamental. Entretanto, outra possível razão para tantas
referências ao Pentateuco, é o fato de ter sido a primeira seção do Antigo
Testamento a ser escrita e reconhecida como canônica.
Ninguém duvida que, pela
época de Esdras e Neemias (século V a.C.), o Pentateuco já estava completo,
como também já era canônico, sendo há muito considerado como tal. Foi
traduzido para o grego no século III a.C.,
tornando-se desse modo na primeira porção da Septuaginta. Desde meados do
século II a.C., temos evidências que comprovam que todos os cinco livros, já
eram atribuídos a Moisés.
11.3.1 O Desenvolvimento da Segunda e Terceira
Seções do Cânon - Profetas e Escritos
O restante da Bíblia
hebraica tem uma estrutura diferente em relação à Bíblia em português. Está
dividida em duas seções: os Profetas e os Hagiógrafos (gr. escritos sagrados).
Os Profetas abrangem oito livros: os livros históricos de Josué, Juízes, Samuel
e Reis (encontram-se nesta divisão porque segundo uma antiga tradição foram
escritos por alguns profetas), os livros proféticos de Jeremias, Ezequiel,
Isaías e os Doze (os Profetas Menores). Os Hagiógrafos compreendem 11 livros:
os livros líricos e sapienciais de Salmos, Jó, Provérbios, Eclesiastes,
Cantares de Salomão e Lamentações de Jeremias, e os livros históricos de
Daniel, Ester, Esdras-Neemias e Crônicas. Esta é a ordem tradicional, segundo a
qual o remanescente livro hagiógrafo, Rute, vem antes de Salmos, visto que
termina com a genealogia do salmista Davi. Na Idade Média, esse livro foi
colocado em uma posição mais adiante, ao lado de outros quatro livros de
brevidade similar (Cantares de Salomão, Eclesiastes, Lamentações de Jeremias e
Ester). É digno de nota que na tradição judaica Samuel, Reis, os Profetas
Menores, Esdras-Neemias e Crônicas sejam computados cada um como um único
livro. Isso pode ser uma indicação da capacidade média de um rolo de pergaminho
hebraico no período em que os livros canônicos foram pela primeira vez
alistados e contados.
O agrupamento dos livros não
é arbitrário, mas segue o padrão das características literárias. Metade do
livro de Daniel compõe-se de narrativa, e nos Hagiógrafos (segundo a ordem
tradicional) é colocado junto com as histórias. Visto que há histórias na Lei
(cobrindo o período da criação até Moisés) e nos Profetas (abrangendo o
período de Josué até o fim da monarquia), então por que também não poderia
haver histórias nos Hagiógrafos, que tratam do terceiro período, da ida e volta
do exílio babilônico? Crônicas é posto por último entre as histórias, como um
sumário de toda a narrativa bíblica, de Adão até a volta do exílio. É evidente
que quando Crônicas foi escrito, o cânon dos Profetas não estava completamente concluído, pois as fontes citadas ali
não são de Samuel e Reis, mas provêm de histórias proféticas mais completas, as
quais também parecem ter servido de fontes para Samuel e Reis. Os elementos
mais antigos nos Profetas, incluídos em livros como Josué e Samuel, são certamente
antiqüíssimos, como também são os elementos mais antigos nos Hagiógrafos, inseridos
em livros como Salmos, Provérbios e Crônicas. Tais elementos podem ter sido
reconhecidos como canônicos antes mesmo do complemento da primeira seção do
cânon. Os últimos elementos dos Hagiógrafos, como Daniel, Ester e
Esdras-Neemias, pertencem ao final da história do Antigo Testamento.
11.3.2 A Conclusão da Segunda e Terceira Seções do
Cânon
A data em que os Profetas e
os Hagiógrafos foram organizados em seções distintas foi provavelmente 165 a .C. A tradição de 2
Macabeus, fala sobre uma grande crise na história do cânon: Da mesma forma,
também Judas [Macabeu] recolheu todos os livros que tinham sido dispersos por
causa da guerra que nos foi feita, e eles estão em nossas mãos (2 Macabeus
2.14). A "guerra" mencionada aqui é a dos macabeus pela libertação
do perseguidor sírio Antíoco Epifânio. A hostilidade de Antíoco contra as
Escrituras está registrada em 1 Macabeus 1.56, 57, e é bem provável que, finda
a perseguição, Judas tenha precisado reunir cópias delas. Judas sabia que fazia
longo tempo que o dom profético havia cessado (1 Macabeus 9.27), assim é verossímil
supor que, ao reunir as Escrituras que haviam sido dispersas, ele organizou e
relacionou a coleção completa na ordem tradicional. Visto que os livros ainda
se apresentavam em rolos separados, os quais tinham de ser "recolhidos",
o que Judas produziu não foi um volume, mas uma coleção e uma lista de livros
na coleção, dividida em três.
Ao preparar a lista, Judas
provavelmente definiu não apenas a divisão estável entre Profetas e Escritos,
mas também a ordem tradicional dos livros e o número tradicional de livros
dentro de cada divisão. Uma lista de livros precisa ter uma ordem e um número.
A ordem tradicional dos livros traz Crônicas como o último dos Hagiógrafos.
Essa posição para Crônicas pode ser remontada ao século I d.C., visto estar
refletida nos ditos de Jesus em Mateus 23.35 e Lucas 11.51, onde a frase
"desde o sangue de Abel até ao sangue de Zacarias" provavelmente
significa todos os profetas martirizados do início ao fim do cânon, de Gênesis
4.3-15 a
2 Crônicas 24.19-22.
11.3.3 Do Cânon Judaico ao Cristão
No Novo Testamento, encontramos
Jesus reconhecendo as Escrituras judaicas pelos seus diversos títulos
conhecidos e aceitando as três seções do cânon judaico e a ordem tradicional de
seus livros. Descobrimos também que para a maioria dos livros é individualmente
imputada autoridade divina - mas não para qualquer um dos livros apócrifos. A única
exceção evidente encontra-se em Judas 9 (que cita a obra apócrifa a Assunção de Moisés) e 14 (que cita
o Livro de Enoque). As citações
que Judas faz dessas obras não significa que cria serem elas divinamente
inspiradas, assim como a citação de Paulo de diversos poetas gregos (vide At 17.28; 1Co 15.33; Tt 1.12)
não atribui inspiração divina à poesia deles. O que evidentemente aconteceu
nos primeiros séculos do Cristianismo foi isto: Jesus passou para seus seguidores,
como Escrituras Sagradas, a Bíblia que Ele havia recebido, contendo os mesmos
livros da Bíblia hebraica dos dias atuais. Os primeiros cristãos compartilharam
com seus contemporâneos judeus um conhecimento completo da identidade dos
livros canônicos. Entretanto, a Bíblia ainda não estava entre duas capas: era
uma lista memorizada de rolos. A ruptura com a tradição oral judaica (em
alguns casos, uma ruptura muito necessária), a alienação entre judeus e
cristãos e a ignorância geral das línguas semíticas nas igrejas fora da
Palestina e da Síria fizeram com que surgisse dúvida no que dizia respeito ao
cânon entre os cristãos, o que foi acentuado pelo preparo de novas listas de
livros bíblicos, organizadas de acordo com outros princípios, e pela introdução
de novos lecionários. Essa dúvida acerca do cânon somente pode ser resolvida
como na reforma por um retorno aos ensinamentos do Novo Testamento e ao pano de
fundo judaico, sobre o qual tais ensinamentos devem ser compreendidos.
11.3.4 Data do Reconhecimento e Fixação do Cânon do
Antigo Testamento
Em 90 d.C. Em Jâmnia, perto
da moderna Jope, em Israel, os rabinos, num concílio sob a presidência de Johanan
Ben Zakai, reconheceram e fixaram o cânon do Antigo Testamento. Houve muitos
debates acerca da aprovação de certos livros, especialmente dos
"Escritos". Note-se, porém que o trabalho desse concílio foi apenas
ratificar aquilo que já era aceito por todos os judeus através de séculos.
11.4
O Cânon do Novo Testamento
Há consenso entre teólogos
que o Novo Testamento foi escrito dentro de um período de cinqüenta anos,
vários séculos depois que o Antigo Testamento foi completado. Em relação ao
tempo, o Antigo Testamento está tão distante de nós que sua formação como
corpo escriturístico poderia ser considerado longínquo demais para a atestação
de seu conteúdo. Tal não é o caso. Em certo sentido, temos atestações muito
maiores para o cânon do Antigo Testamento do que para o cânon do Novo
Testamento. Referimo-nos ao fato do próprio imprimátur (do lat. imprimatur,
'imprima-se') de nosso Senhor Jesus Cristo, pela maneira como fez uso das
Escrituras hebraicas como a Palavra autoritária de Deus.
Não obstante, há um sentido
no qual Jesus Cristo realmente oficializou o conteúdo ou cânon do Novo
Testamento: pela via da antecipação. Foi Ele quem nos fez essas promessas: o
“Consolador, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, vos ensinará
todas as coisas e vos fará lembrar de tudo quanto vos tenho dito e ele vos
guiará em toda a verdade” (Jo 14.26; 16.13).
A partir disto podemos
inferir, ao mesmo tempo, o princípio básico da canonicidade para o Novo
Testamento. É idêntico ao do Antigo Testamento, visto que se restringe à
questão da inspiração divina. Quer pensemos nos profetas dos tempos do Antigo
Testamento ou nos apóstolos e seus companheiros dados por Deus nos dias do
Novo Testamento, o reconhecimento na própria época de seus escritos de que
eram autênticos porta-vozes de Deus é o que determina a canonicidade intrínseca
de seus registros. Podemos estar certos
de que os livros em questão foram recebidos pela Igreja dos tempos apostólicos,
precisamente no momento em que foram atestados por um apóstolo como sendo dessa
maneira inspirados. A variação evidente relativa à área geográfica, no
reconhecimento de algumas das epístolas do Novo Testamento, pode muito bem ser
o reflexo do simples fato de que, em princípio, essa atestação era por sua
própria natureza localizada. De maneira inversa, o fato de cada um dos 27
livros do Novo Testamento hoje universalmente aceitos ter recebido aprovação
definitiva é prova de que a atestação apropriada era dada somente depois de
rigorosa investigação.
Tertuliano, notável escritor
cristão das primeiras duas décadas do século lll, foi um dos primeiros a
chamar as Escrituras cristãs de "Novo Testamento". Esse título havia
aparecido antes (c. 190) em uma composição feita contra o montanismo, de autor
desconhecido. Esse fato é significativo. Seu uso colocou as Escrituras do Novo
Testamento em um nível de inspiração e autoridade igual ao do Antigo Testamento.
O processo gradual que
conduziu ao completo e formal reconhecimento público de um cânon estabelecido
em 27 livros, formando o Novo Testamento, leva-nos ao século IV de nossa era.
Isso não significa necessariamente que antes desse período estivesse faltando
reconhecimento para a integridade destas Escrituras, mas que a necessidade de
uma definição oficial do cânon não foi premente até então.
Em relação ao Antigo
Testamento um período de tempo muito mais curto esteja envolvido nos escritos
do Novo Testamento, o alcance geográfico de sua origem é muito mais amplo.
Essa circunstância já é suficiente para justificar a falta de reconhecimento
espontâneo ou simultâneo da extensão precisa do cânon do Novo Testamento. Por
causa do isolamento geográfico dos vários destinatários das porções do Novo
Testamento, houve espaço para algum atraso e incerteza de uma região para
outra no reconhecimento de alguns dos livros.
O princípio que determina o
reconhecimento da autoridade dos escritos canônicos do Novo Testamento foi
estabelecido dentro do próprio conteúdo desses escritos. Há repetidas
exortações para a leitura pública das mensagens apostólicas. No fim da
Primeira Epístola aos Tessalonicenses, possivelmente o primeiro livro do Novo
Testamento a ser escrito, Paulo diz: "Pelo Senhor vos conjuro que esta
epístola seja lida a todos os santos irmãos" (1Ts 5.27). Três capítulos
antes, na mesma epístola, Paulo os recomenda a aceitarem suas palavras faladas
como "palavra de Deus" (1Ts 2.13) e, em 1 Coríntios 14.37, o apóstolo
fala de modo semelhante acerca de seus "escritos" (COMFORT, 1998, p.
97).
12 - APÓCRIFOS, PSEUDOPÍGRAFOS E PERGAMINHOS
12.1
Escritos Apócrifos
Nas Bíblias de edição da
Igreja Católica Romana, o total de livros é de 73, porque essa igreja, desde o
Concílio de Trento, em 1546, incluiu no cânon do Antigo Testamento 7 livros
apócrifos, além de 4 acréscimos ou apêndices a livros canônicos,
acrescentando, assim, ao todo, 11 escritos apócrifos.
A palavra apócrifo significa, literalmente, escondido, oculto, isto em referência a livros que tratavam de coisas
secretas, misteriosas, ocultas. No sentido religioso, o termo significa
"não genuíno", "espúrio", desde sua aplicação por
Jerônimo. Os apócrifos foram escritos entre Malaquias e Mateus, ou seja, entre
o Antigo e o Novo Testamento, numa época em que cessara por completo a revelação
divina; isto basta para tirar-Ihes qualquer pretensão de canonicidade. O
Historiador Flávio Josefo rejeitou-os totalmente. Nunca foram reconhecidos
pelos judeus como parte do cânon hebraico. Jamais foram citados por Jesus nem
foram reconhecidos pela igreja primitiva.
Jerônimo, Agostinho,
Atanásio, Júlio Africano e outros homens de valor dos primitivos cristãos,
opuseram-se a eles na qualidade de livros inspirados. Apareceram pela primeira
vez na Septuaginta - tradução do Antigo Testamento feita do hebraico para o
grego. Quando a Bíblia foi traduzida para o latim, em 170 d.C., seu Antigo
Testamento foi traduzido do grego da Septuaginta e não do hebraico.
Quando Jerônimo traduziu a
Vulgata, no início do Século V (405 d.C.), incluiu os apócrifos oriundos da
Septuaginta, através da Antiga Versão Latina, de 170 d.C., porque isso lhe foi
ordenado, mas recomendou que esses livros não poderiam servir como base doutrinária.
12.1.1 Livros Apócrifos do Antigo Testamento
Os 7 livros apócrifos
constantes das Bíblias de edição católico-romana são: TOBIAS (Após o livro canônico de Esdras),
JUDITE (após o livro de Tobias) SABEDORIA DE SALOMÃO (após o livro canônico de
Cantares), ECLESIÁSTICO (após o livro de Sabedoria), BARUQUE (após o livro
canônico de Jeremias), 1 MACABEUS, 2 MACABEUS (ambos, após o livro canônico de
Malaquias). Os 4 acréscimos ou apêndices são: ESTER (a Ester, 10.4 -16.24),
CÂNTICO DOS TRÊS SANTOS FILHOS (a Daniel, 3.24-90), HISTÓRIA DE SUZANA
(Daniel, cap.13), BEL E O DRAGÃO (a Daniel, capo 14). Os livros rejeitados
são: 3 ESDRAS, 4 ESDRAS, A ORAÇÃO DE MANASSÉS. A Igreja Católica Romana aprovou
os apócrifos em 18 de abril de 1546, para combater o movimento da Reforma
Protestante, então recente. Nessa época, os protestantes combatiam
violentamente as novas doutrinas romanistas: a doutrina do Purgatório, a
doutrina da oração pelos mortos, a doutrina da salvação mediante obras etc. A
Igreja Católica Romana via nos apócrifos base para essas doutrinas, e, apelou
para eles, aprovando-os como canônicos.
12.1.2 Razões
da Rejeição dos
Livros Apócrifos
A razão porque 66 livros da
Bíblia se harmonizam entre si é que a mesma mente divina inspirou a cada
escritor. Se, por exemplo, João tivesse escrito algo que não concordasse com as
obras de Moisés, seríamos obrigados a rejeitar seu Evangelho, as Epístolas e o
livro do Apocalipse. Os primeiros livros constituem o critério para todos os
outros chamados inspirados. Se as doutrinas dos livros apócrifos não concordam
em cada ocasião com aquilo que Moisés escreveu, não devem achar-se no Cânon da
Palavra Inspirada. Os livros apócrifos ensinam doutrinas que são contrárias ao
que Moisés e outros profetas escreveram. Por essa razão não foram colocados
entre os outros livros do Velho Testamento, nos dias de Esdras. Nem Cristo nem
os apóstolos citaram os livros apócrifos. S. Jerônimo os rejeitou da Bíblia
Latina, por não estarem escritos em hebraico.
12.1.2.1 Ensino da Arte Mágica
Tobias 6.5-8. "Então, o anjo lhe disse: toma as
entranhas deste peixe e guarde para ti seu coração, o fel e seu fígado. Pois
são necessários para medicinas úteis [...] Logo, Tobias perguntou ao anjo e lhe
disse: Eu te rogo, irmão Azarias, para quais remédios são boas essas coisas,
que tu pediste separar do peixe. E o anjo, respondendo, lhe disse: Se puseres
um pedacinho do seu coração sobre as brasas, seu fumo há de espantar toda a
espécie de demônios, seja de um homem ou de uma mulher, de modo que não possam
mais voltar a eles."
12.1.2.2 Dar Esmolas
Purifica do Pecado
Tobias 12.8,9. "A
oração é boa como o jejum e esmolas; é melhor do que guardar tesouros de ouro,
pois, esmolas livram da morte, e é o mesmo que espia os pecados e conduz à
misericórdia e vida eterna". Se ofertas caridosas pudessem expiar os
nossos pecados, não teríamos necessidade do sangue de Jesus Cristo.
12.11.2.3 Pecados Perdoados pela Oração
Eclesiástico 3.4. "Quem
amar a Deus, receberá perdão de Seus pecados pela oração". Os pecados não
se perdoam pela oração. Se fosse assim, não teríamos necessidade de Jesus.
Todos os povos pagãos fazem orações, mas os pecados não se perdoam somente pela
oração. Pv 28.1; 1Jo 1.9. Só Cristo, nosso Advogado, pode perdoar o pecado.
12.1.2.4 Orações pelos Mortos
2 Macabeus 12.42-46,
"E, fazendo uma arrecadação, mandou doze mil dracmas de prata a Jerusalém
para ser oferecido um sacrifício pelos pecados dos mortos, e fez bem em pensar
religiosamente na ressurreição, (pois, se não tivesse esperança que os que
haviam sido mortos ressuscitassem novamente, haveria de ser supérfluo e em vão
orar pelos mortos). E considerava que, os que haviam adormecido no temor de
Deus, alcançaram para si muita graça." A Igreja Católica afirma que estes
versículos lhe autorizam a doutrina do purgatório. Orações e missas pelos
mortos são aceitas e o devoto católico crê nelas. Excede a imaginação a
quantidade de dinheiro que aflui todos os anos aos cofres da igreja pelas
missas em favor dos mortos.
12.1.2.5 O Ensino do Purgatório
Sabedoria 3.1-4. "Mas,
as almas dos justos estão na mão de Deus; e o tormento da morte não as tocará.
Aos olhos dos ignorantes pareciam eles morrer e sua partida foi considerada
desgraça. E, sua separação de nós, por uma extrema perda. Mas, eles estão em paz. E , embora aos olhos
dos homens sofram tormentos, sua esperança está plenamente na
imortalidade." A Igreja Católica baseia a sua crença da doutrina do
purgatório nestes versículos citados: "Embora aos olhos dos homens sofram
tormentos, sua esperança está plenamente na imortalidade". "Os
tormentos" nos quais se acham os "justos", diz a Igreja,
referem-se ao fogo do purgatório, onde os pecados estão sendo expiados.
"Sua esperança está plenamente na imortalidade", pois a igreja
interpreta isso, declarando que após suficiente tempo de sofrimento no meio do
fogo, poderão passar para o céu. 1Jo 1.7. Esse ensino aniquila completamente a
expiação de Cristo. Se o pecado pudesse ser extinto pelo fogo, não teríamos
necessidade do nosso Salvador.
12.1.2.6 O Anjo Relata uma Falsidade
Tobias 5.15-19. "O anjo
disse-lhe (a Tobias): Guiá-lo-ei para lá (o filho de Tobias) e o farei voltar a
ti. E Tobias lhe disse (ao anjo): Eu te rogo, dize-me, de que família ou de que
tribo és tu? E Rafael, o anjo, respondeu: [...] Eu sou Azarias, o filho do
grande Ananias. Respondeu-lhe Tobias: Tu és de uma grande família". Se um
anjo de Deus mentisse acerca de sua identidade, tornar-se-ia culpado de
violação do nono mandamento. Lc 1.19. Confrontando esta declaração com o que
está registrado no livro de Tobias, compreenderemos logo porque Cristo nunca Se
referiu aos livros apócrifos.
12.1.2.7 Uma Mulher Jejuando Toda Sua Vida
Judith 8.5,6. "E ela
fez para si um aposento separado no andar superior de sua casa no qual vivia
com suas servas. Seu vestido era de cabelo de crina e ela jejuava todos os dias
de sua vida, com exceção dos sábados, das luas novas e demais festas da casa de
Israel." Esta passagem é parecida a outras lendas católicas romanas, com respeito
a seus santos canonizados. Uma mulher dificilmente jejuaria toda sua vida, com
exceção de um dia da semana e algumas outras ocasiões durante o ano. Cristo
jejuou quarenta dias, porém não toda a Sua vida.
A igreja católica apega-se a
estes livros não inspirados porque eles sancionam alguns de seus falsos
ensinos, como: oração pelos mortos, salvação pelas obras, a doutrina do
purgatório, dar esmolas para libertar as pessoas do pecado e da morte.
12.1.3 Apócrifos
do Novo Testamento
Trata-se de Evangelhos, Atos
de Apóstolos e Epístolas, todos lendários e espúrios, que começaram a aparecer
no século II. Foram forjados, na maior parte, e assim reconhecidos desde o
princípio. São tão cheios de estórias ridículas e indignas a respeito de Cristo
e dos apóstolos, que nunca foram reconhecidos como divinos, nem incorporados à
Bíblia. São tentativas deliberadas de preencher lacunas na história de Jesus,
como é apresentada no Novo Testamento, com o fim de fomentar idéias heróicas
através de falsas afirmações. Sabe-se que houve uns 50 "Evangelhos"
espúrios, além de muitos "Atos" e "Epístolas". A grande
quantidade desses escritos forjados fez a Igreja Primitiva ver quanto era
importante distinguir entre os falsos e os verdadeiros. Dizem que Maomé tirou
largamente desses livros as idéias que tinha acerca do cristianismo. Neles está
a origem de alguns dogmas da Igreja Romana. Não devem ser confundidos com os
escritos dos “Pais Apostólicos". Vai, aqui, uma lista de alguns dos livros
apócrifos mais conhecidos:
Evangelho
de Nicodemos. Inclui os "Atos de Pilatos",
pretenso relatório oficial do julgamento de Jesus ao imperador Tibério. Foi
produzido entre os séculos II e V. Puramente imaginário.
Proto
Evangelho de Tiago. Narrativa que vai do nascimento de Maria ao
massacre dos inocentes. Contos que começaram a circular no século II. Foi
completado século V.
O
Passamento de Maria. Repleto de milagres ridículos culmina com a
remoção do "seu corpo imaculado e precioso" ao Paraíso. Escrito no
século IV, com o aparecimento do culto à Virgem.
Evangelho
Segundo os Hebreus. Adições aos Evangelhos canônicos, com
algumas frases atribuídas a Jesus. Meados de 100 d.C.
Evangelho
dos Ebionitas. Compilado dos Ev. Sinópticos, no interesse
da doutrina ebionita.
Evangelho
dos Egípcios. Conversas imaginárias entre Jesus e Salomé.
Entre 130 e 150 d.C. Usados pelos sabelianos.
Evangelho de Pedro. Meados
do Século II. Buscado em Evangelhos canônicos. Escrito no interesse de
doutrinas docetistas e anti-judaicas.
Evangelho
de um Pseudo-Mateus. Século V. Falsa tradução de Mateus, repleta
de milagres da infância de Jesus.
Evangelho
de Tomé. Século II. Vida de Jesus, dos 1 aos 12 anos.
Apresenta-o operando milagres para satisfação de seus caprichos infantis.
Natividade
de Maria. Obra de ficção Século VI, premeditada, para fomentar o
culto à Virgem. Histórias de visitas diárias de anjos a Maria. Com o surto do
papado, tornou-se imensamente popular.
Evangelho
Arábico da Infância. Século VII. História de Milagres operados
durante a estada no Egito.
Evangelho
do Carpinteiro José. Século IV. Originou-se no Egito.
Dedicado à glorificação de José.
Apocalipse
de Pedro. Pretensas visões do céu e do inferno concedidas a
Pedro. Eusébio chamou-o "espúrio".
Atos
de Paulo. Meados do Século II. Romance que aconselha a
continência. Contém a suposta Epístola aos Coríntios que se perdeu.
Atos
de Pedro. Fim do século II. Um caso de amor com a filha de Pedro.
Conflito com Simão, o Mago. Contém a história do "Quo Vadis".
Atos de João. Fim do século
II. História de uma visita à Roma. Puramente imaginária. Contém um quadro
revoltante de sensualismo.
Atos
de André. História de André, que persuade Maximila a evitar
relações com o marido, o que resultou no martírio dele.
Atos
de Tomé. Fim do século II. Como os Atos de André, foi criado com
interesse da abstinência de relações sexuais.
Carta
de Pedro a Tiago. Fim do século II. Ataca violentamente
Paulo. Pura invenção no interesse dos ebionitas.
Epístola
de Laodicéia. Diz ser a que é referida em Colossenses 4.16.
Um aglomerado de frases de Paulo.
Cartas
de Paulo á Sêneca. E outras deste àquele. Invenção século IV.
Objetivo: ou recomendar o cristianismo aos seguidores de Sêneca, ou recomendar
este aos cristãos. A principal característica destes escritos é o fato de serem
obras de ficção, que se apresentam como história, mas em sua maior parte são
absurdos por tal forma que a falsidade deles evidencia-se por si mesma.
Cartas
de Abgar. Estas podem ter alguma base, Eusébio assim pensava.
Conta que Abgar, rei de Edessa, estando enfermo, ouviu falar do poder de Jesus.
Escreveu-lhe uma carta pedindo que fosse curá-lo, ao que Jesus respondeu por
escrito: "...é necessário completar aquilo para o que fui enviado; depois
disso serei recebido em cima, por aquele que Me enviou. Quando, pois, Eu for
recebido no céu, enviarei um dos Meus discípulos que te curará". Contam
que foi Tadeu o enviado, a quem mostraram as Cartas a que ficaram arquivadas em Edessa. Possivelmente ,
Jesus mandou um recado verbal, que eles registraram.
12.2
Os Pseudopígrafos
São os livros escritos sob
um nome fictício. Para outros são os escritos judaicos, extra bíblicos, não
inspirados do Antigo Testamento. São considerados de valor no estudo do cânon,
e alguns estudiosos os incluem no mesmo grupo dos apócrifos. Dentre os
pseudopígrafos destacam-se:
O
Livro de Enoque. A crítica textual não tem condições de
localizá-lo exatamente em determinada época, mas deve pertencer ao período de 200 a .C. e as primeiras
décadas do primeiro século da nossa era.
A
Assunção de Moisés. Deve ter sido publicado no tempo de Cristo
e procura narrar a história do mundo, em forma de profecia, desde Moisés até ao
tempo do autor.
Os
Oráculos Sibilinos. São obras judaicas que, à imitação das
profecias pagãs de Sibila, pretendem divulgar o pensamento hebraico entre os
gentios.
O
Livro dos Jubileus. É um comentário sobre Gênesis, frisando que
a Lei foi observada desde os mais remotos tempos. Recebe este nome pelo fato de
dividir a história em períodos jubileus, isto é, quarenta e nove anos (sete
semanas de anos).
O
livro dos Segredos de Enoque (2 Enoque). Descreve pormenorizadamente
os sete céus e antecipa em mil anos o reinado de Deus na terra.
O
Apocalipse de Baruque. Alguns o atribuem ao escriba de Jeremias.
Foi escrito, segundo os críticos, nas últimas décadas do primeiro século da
nossa era.
O
Apocalipse de Abraão. É uma obra judaica com passos de literatura
do cristianismo. Pertence ao século I da nossa era.
Os
Salmos de Salomão. Coletânea de dezoito salmos, escrita por um
fariseu, que viveu na segunda metade do primeiro século da era cristã. O estilo
é bastante semelhante ao dos Salmos que temos na Bíblia.
A
Carta de Aristéias. É interessante por informar-nos das
supostas circunstâncias em que foi feita a tradução do Velho Testamento
hebraico para o grego.
Macabeus, 3 e 4. No III encontramos uma
tentativa de massacre dos judeus no reinado de Ptolomeu Filopator. O 4 é um
tratado filosófico ilustrando a tese do autor no caso dos mártires macabeus.
Embora haja referências a estes livros na Bíblia (2Tm 3.8; Jd 9 e 14) não
necessitamos aceitá-los como canônicos.
A literatura pseudopígrafa
foi produzida entre 200 a .C.,
e 200 a .D.
com o objetivo de encorajar e consolar a nação judaica durante as invasões dos
sírios e romanos.
12.3
Os Rolos do Mar Morto
No verão de 1947, tiveram
início na Palestina, por obra de casual descoberta de um jovem beduíno, chamado
Moâmede ad-Dib, encontros arqueológicos de excepcional importância: os chamados
manuscritos do Deserto da Judéia, do Mar Morto ou ainda Manuscritos de Qunran.
Ele tinha perdido uma cabra, por isso subiu penosamente a encosta, chamando
pelo animal que continuava a elevar-se, a procura de alimento. Nesta sua busca
ele deparou com uma cavidade, atirou para dentro dela uma pedra, apurando o
ouvido para escutar a queda, a fim de determinar a sua profundidade. Qual não
foi a sua surpresa, quando em vez do esperado ruído, seu ouvido percebeu um
típico som de louça. Com esforço conseguiu olhar para dentro, notando com surpresa
a existência de vários objetos cilíndricos, de grande tamanho. Amedrontado pela
superstição, o moço fugiu rapidamente daquele sítio, e, à noite, comentou com
um amigo a inusitada descoberta da caverna. No dia seguinte os dois se dirigem
à gruta, e ao entrarem nela, encontram sete rolos. Levaram alguns para a tenda
e ao desenrolarem ficaram surpresos com a sua extensão e por não entenderem
nada do que neles estava escrito.
Os beduínos, indo
regularmente a Belém para vender leite e queijo, certo dia, levaram também os
pergaminhos, vendendo-os a um cristão sírio, dono de um armazém, conhecida pelo
nome de Kando, que também por ignorar totalmente o valor deste achado,
abandonou-os no chão da loja por vários dias, sendo estes pisados pelos que
nela entravam. Certo dia, atentando melhor para aqueles pergaminhos,
ocorreu-lhe a idéia de levá-los a Jerusalém para os vender no Convento Sírio de
São Marcos. O superior do convento procura pessoas entendidas que estudassem os
manuscritos, a fim de que ele pudesse ter uma idéia de seu real valor, assim
sendo, um dos pergaminhos foi enviado ao Professor E. L. Sukenik, da
Universidade Hebraica. Sukenik analisando-o, em profundidade, concluiu que o
documento apresentava grande valor pelo seu conteúdo e considerável antigüidade.
A caverna na qual foram
encontrados os manuscritos fica na região desolada e quente do Deserto de Judá
dos dias bíblicos, cerca de doze quilômetros ao sul de Jericó, na altura do
Uadi Qunran.
Os sete rolos retirados
desta gruta eram bem diferentes, pois dois eram manuscritos do livro de Isaías,
um completo e outro incompleto, um manual de Disciplina da Seita, uma coleção
de Salmos e Ações de Graça, uma ordem de batalha para uma guerra apocalíptica
entre os Filhos da Luz e os Filhos das Trevas, um Comentário ao livro de
Habacuque. Todo este material foi publicado por Sukenik e pelos americanos.
Além dos manuscritos já citados ainda foram encontrados documentos os mais
diversos conto contratos de casamento, cartas do líder judeu Bar Cocheba, um
hinário de mais ou menos quarenta salmos, cópias dos apócrifos de Eclesiástico
e Tobias, além de trechos de pseudepígrafos como o de Enoque.
A gruta em que aqueles
pastores entraram, e que marcou o início de uma fase histórica da arqueologia,
recebeu o n.º 1. Não longe dela, encontrou-se, em fins de 1951, a gruta a que se deu
o n.º 2. Continha fragmentos dos Salmos, os livros de Isaías, do Êxodo, de
Rute, um documento litúrgico e o livro apócrifo dos Jubileus, que é uma
paráfrase do Gênesis, recompilada pelos fariseus. Descobriu-se, depois, a gruta
n.º 3, onde se encontraram 2 rolos de chapas de cobre, com textos gravados.
A gruta que deu colheita
mais rica foi a de n.º 4. Continha 380 manuscritos, dos quais mais ou menos uma
centena são de ordem bíblica. Seguiram-se as de n.º 5 e 6, que deram
manuscritos de pouca importância bíblica e histórica. Em fins de 1955,
revistaram-se as grutas que receberam os nos 7, 8, 9 e 10, todas contendo ora
pergaminhos, ora papiros, tudo de pouca importância. Logo após, nos últimos
dias de 1955, encontram-se outras duas séries de grutas, uma à margem do Uadi
Murabaat, e outra à margem do Uadi Mird, sempre nos arredores do Mar Morto.
Os dois rolos de chapa de
cobre mediam mais ou menos 2
metros de comprimento e uns 30 centímetros de
largura. Durante 3 anos estudos foram feitos para que os rolos fossem abertos
sem se estragar a escrita. Foi preparada uma máquina especial pelo Departamento
de Tecnologia de Manchester, Inglaterra, para cortar o rolo, trabalho este
levado a efeito no dia 16 de janeiro de 1956. Estes rolos podem ser vistos no
Museu de Amã. Na escrita de um deles estava a relação de uns 60 esconderijos,
nos quais, se encontrariam depósitos de ouro, prata ou caixas de incenso.
Três sociedades científicas:
Departamento Arqueológico da Jordânia, Escola Bíblica e Arqueológica Francesa
de Jerusalém (Santo Estêvão) e o Museu Arqueológico Palestinense têm
inventariado as riquezas destas grutas. Os fragmentos de manuscritos
descobertos nas onze cavernas de Qunran são cerca de 600 e um quarto destes
fragmentos contém textos bíblicos; com exceção do livro de Ester, todos os
livros do Velho Testamento se acham ali representados. Os mais numerosos são
dos livros de Isaías, de Deuteronômio e dos Salmos.
12.3.1 Quem
Guardou Estes Manuscritos
Uma pergunta que vem à mente
de todos é esta: quem foram as pessoas que moravam nesta região e copiaram os
manuscritos encontrados nas grutas? Segundo a opinião dos eruditos seus
habitantes pertenciam à seita judaica dos essênios, os quais ocuparam esta
região entre 185 a .C.
e 68 a .D.
Havia entre os judeus no
tempo de Cristo as seguintes seitas: Os fariseus – legalistas e separados,
observadores de tradições antigas, eram muito religiosos; os saduceus –
conhecidos por sua oposição aos fariseus e por negarem a ressurreição. Eram
incrédulos e livres pensadores; os essênios – muitas etimologias têm sido
apresentadas para explicar a origem deste nome. The Interpreter's Dictionary of
the Bible, cita pelo menos dez entre palavras gregas e hebraicas, salientando
que os eruditos não têm nenhuma uniformidade em seus pontos de vista. Os
essênios eram pessoas que estavam decepcionadas com a corrupção reinante em
seus dias, por isso abandonaram a sociedade e se refugiaram em mosteiros para
se dedicarem a uma vida de oração e ao estudo da palavra de Deus.
12.3.2 Origem da Comunidade Essênica de Khirbet
Qumran
Para o mosteiro de Khirbet
Qumran podemos indicar diversos períodos de construção, como atestam as
escavações realizadas entre 1951 e 1956. A primeira construção monástica,
edificada em pedra, data do tempo do sumo sacerdote João Hircano (134-104 a .C.), da dinastia
macabeu - asmonéia. Antes dessa época, os hassideus (essênios) tiveram que
contentar-se com abrigos encontrados ao acaso. Uma figura característica que se
encontra sempre de novo nos textos de Qumran, é o anônimo 'mestre de nossa
justiça', a quem a comunidade de Qumran deve a sua clara diferenciação dos
outros grupos religiosos, antes de mais nada do culto e da hierarquia de Jerusalém,
e que de várias maneiras, deu também impulso às normas de vida de Qumran.
Antes da primeira revolta
judaica, por causa do avanço da décima legião sob o comando de Vespasiano, os
manuscritos da biblioteca do mosteiro foram colocados a salvo (por volta do ano
68 d.C.). O próprio mosteiro foi destruído pelos romanos. Durante a segunda
revolta judaica (132-135), o lugar das ruínas e arredores constituíram um ponto
de apoio para os combatentes da resistência judaica que se encontraram em torno
de Bar Kokba, Com efeito, numa gruta ao sul de Qumran, foram encontrados, além
de apetrechos sacrificais, vestes e moedas, também manuscritos da época entre
88 e 135 d.C., entre os quais uma carta de Bar Kokba."
12.3.3 Valor
dos Rolos do
Mar Morto
Embora o valor desta
descoberta ainda não possa ser avaliado em toda a sua plenitude, há certos
fatos já conhecidos que são os seguintes: Estes manuscritos são pelo menos 1000
anos mais velhos do que o mais antigo manuscrito hebraico que possuímos – O
Códice Petropolitano escrito em 912
a .D; os manuscritos de Qumran são mais antigos do que os
mais velhos fragmentos da Septuaginta existentes, quanto à história da evolução
da escrita, fornecendo, portanto precioso material à Paleografia. Estes
manuscritos foram copiados entre os séculos III a.C. e o primeiro século a.D.;
antes desta descoberta pouco se sabia a respeito do judaísmo pré-cristão.
Através do Manual de Disciplina conhecemos hoje muito dos seus costumes e
maneira de viver; estes manuscritos, vieram desfazer afirmações infundadas,
concernentes ao trabalho dos copistas pré-massoréticos e ainda de que a Bíblia
Hebraica de hoje fora organizada e emendada pelos massoretas.
Os estudantes da Bíblia não
puseram tanto em dúvida as mudanças no texto quando foram acrescentadas as
vogais e a pontuação para formar o texto Massorético, séculos depois de Cristo,
pois sabiam que os copistas depois daquele tempo, preservaram com cuidado
extremo cada jota e til do texto. Alguns críticos opinavam que os mais antigos
copistas por não serem tão escrupulosos trataram o texto com mais liberdade,
portanto havia diferenças consideráveis em nossa Bíblia.
Quando o texto hebraico de
hoje foi comparado com os manuscritos de Qumran verificou-se surpreendente
identidade de conteúdo. Os rolos do Mar Morto comprovam a validade do texto
hebraico, tão cuidadosamente transmitido através dos séculos. O descobrimento
destes rolos e de outros manuscritos mostrou a fragilidade dos argumentos da
Alta Crítica, comprovando que o trabalho dos copistas e tradutores por dois mil
anos não mudou a Palavra de Deus. Eles comprovaram que a maioria das variações
de um manuscrito para outro são simplesmente questões de letras, palavras ou
frases que não modificam suficientemente o sentido para influenciar alguma doutrina
importante.
12.3.4 Fragmentos
de Papiros em
Qumran
Numa das cavernas de Qumran
foram encontrados muitos fragmentos de papiros e entre estes, o papirólogo
espanhol, José O'Callaghn descobriu um trecho do Evangelho de São Marcos –
correspondente aos versículos 52 e 53, do capítulo 6. Após este encontro, em
março de 1972, o erudito espanhol, recorrendo a métodos técnicos, conclui que
se trata de um manuscrito do ano 50
a .D. A história nos confirma que o General Vespasiano,
no ano 68 a .D,
tomou posse do mosteiro essênio de Qumran, ocasião em que seus habitantes
esconderam os rolos nas cavernas, pensando em regressar mais tarde para
recuperá-los.
12.3.5 Conclusões
Todo o cuidado e todos os
avanços feitos pela ciência têm sido utilizados, quer na determinação das datas
deste valioso material, quer na sua leitura e conservação. Assim foi descoberto
um método com base na ciência atômica, para determinar a idade do material
orgânico. Foi usando esse método, com o isótopo, "Carbono 14", que o
Instituto Nuclear da Universidade de Chicago pode confirmar com precisão a
opinião dos arqueólogos, segundo a qual o pano que envolvia os rolos,
descobertos em 1947, datava do I século da era cristã. No Museu de Jerusalém,
onde se encontra boa parte do material descoberto, documentos, à primeira vista
ilegíveis, são decifrados graças à fotografia infravermelha que traz à luz,
letras que normalmente não podem ser distinguidas pelos olhos humanos.
Inegavelmente, esta foi a descoberta arqueológica mais sensacional dos últimos
tempos, porque veio provar a autenticidade da Bíblia e a sua maravilhosa
conservação através dos séculos.
13 - VERSÕES, TRADUÇÕES E REVISÕES
13.1
Conceituação
Tradução é
simplesmente a transposição de uma composição literária de uma língua para
outra. Por exemplo, se a Bíblia fosse transcrita dos originais hebraico e grego
para o latim, ou do latim para o português, chamaríamos esse trabalho tradução.
Se esses textos traduzidos fossem vertidos de volta para as línguas originais,
também chamaríamos isso tradução.
A tradução literal é uma tentativa de expressar, com toda a fidelidade possível e o máximo
de exatidão, o sentido das palavras originais do texto que está sendo
traduzido. Trata-se de uma transcrição textual, palavra por palavra. O resultado
é um texto um tanto rígido.
A transliteração é a versão das letras de um texto em certa língua para as letras
correspondentes de outra língua. É claro que uma tradução literal da Bíblia
fica sem sentido para uma pessoa de pouca cultura.
Versão, tecnicamente falando é uma
tradução da língua original (ou com consulta direta a ela) para outra língua,
ainda que comumente se negligencie essa distinção. O segredo para a compreensão
é que a versão envolve a língua original de determinado manuscrito.
Revisão, ou versão revista, é termo
usado para descrever certas traduções, em geral feitas a partir das línguas
originais, que foram cuidadosa e sistematicamente revistas, cujo texto foi
examinado de forma crítica, com vistas em corrigir erros ou introduzir emendas
ou substituições.
Paráfrase é uma tradução
"livre" ou "solta". O objetivo é que se traduza a idéia, e
não as palavras. Daí que a paráfrase é mais uma interpretação que uma tradução
literal do texto. O comentário é simplesmente uma explicação das Escrituras. O
exemplo mais antigo desse tipo de trabalho é o “Midrash”, ou comentário judaico
do Antigo Testamento.
13.2
Versões e Traduções mais Antigas
As
traduções mais antigas apareceram antes do período dos Concílios da Igreja (350
d.C.), abarcando obras como Pentateuco
Samaritano, os Targuns Aramaicos,
o Talmude, o Midrash e a Septuaginta
(LXX).
13.2.1 O Pentateuco Samaritano
Segundo Norman Geisler e
William Nix (1997, p. 187), “o Pentateuco samaritano pode ter-se
originado no período de Neemias, em que se reedificou Jerusalém. Não sendo na
verdade uma tradução, nem versão, mostra a necessidade do estudo cuidadoso para
que se chegue ao verdadeiro texto das Escrituras”. Essa obra foi, de fato, uma
porção manuscrita do texto do próprio Pentateuco. Contém os cinco
livros de Moisés, tendo sido escrito num tipo paleo-hebraico, muito semelhante
ao que se encontrou na pedra moabita, na inscrição de Siloé, nas Cartas de
Laquis e em alguns manuscritos bíblicos mais antigos de Qumran. A tradição
textual do Pentateuco samaritano é independente do Texto massorético.
Não foi descoberto pelos estudiosos cristãos senão em 1616, embora fosse
conhecido dos pais da igreja, como Eusébio de Cesaréia e Jerônimo, tendo sido
publicado pela primeira vez na obra Poliglota de Paris (1645) e, depois,
na Poliglota de Londres (1657).
O manuscrito mais antigo do Pentateuco
samaritano data de meados do século XIV e trata-se de um fragmento de um
pergaminho o rolo chamado Abisa. O códice do Pentateuco samaritano mais
antigo traz uma nota sobre ter sido vendido em 1149-1150 d.C, embora fosse
muito mais velho. A Biblioteca Pública de Nova Iorque abriga outro exemplar que
data de cerca de 1232. Imediatamente após a descoberta desse exemplar, em 1616,
o Pentateuco samaritano foi aclamado como superior ao Texto
massorético. No entanto, depois de cuidadoso estudo, foi relegado a posição
inferior. Só recentemente esse documento reobteve um pouco de sua antiga
importância, ainda que seja considerado até hoje de menor importância do que o
texto massorético da lei. Os méritos do texto do Pentateuco samaritano podem
ser avaliados pelo fato de apresentar apenas 6 000 variantes em relação ao Texto
massorético, e em sua maior parte constituem diferenças ortográficas que se
considerariam insignificantes. Há ali a afirmativa de que o monte Gerizim é o
centro de adoração, e não a cidade de Jerusalém, com acréscimos aos relatos de
Êxodo 20.2-17 e Deuteronômio 5.6-21. (GEISLER; NIX, 1997, p. 188).
13.2.2 Os Targuns
Segundo Norman Geisler e
William Nix (1997, p. 188), “há evidências de que os escribas, já nos tempos de
Esdras (Ne 8.1-8), estavam escrevendo paráfrases das Escrituras hebraicas em aramaico. Não
estavam produzindo traduções, mas textos explicativos da linguagem arcaica da
Tora”. Antes do nascimento de Cristo, quase todos os livros do Antigo
Testamento tinham suas paráfrases ou interpretações (targuns). Ao longo dos
séculos seguintes o targum foi sendo redigido até surgir um texto oficial.
Os mais antigos targuns
aramaicos provavelmente foram escritos na Palestina, durante o século II d.C,
embora haja evidências de alguns textos amaraicos de um período pré-cristão.
Esses textos primitivos, oficiais, do targum, continham a lei e os profetas,
embora targuns de épocas posteriores também incluíssem outros escritos do
Antigo Testamento.
Durante o século III d.C.,
surgiu na Babilônia um targum aramaico sobre a Tora. Possivelmente se
tratasse de uma versão corrigida de texto palestino antigo; mas também poderia
ter-se originado na Babilônia, tendo sido tradicionalmente atribuído a
Onquelos (Ongelos), ainda que tal nome provavelmente resultasse de confusão com
Áqüila.
O Targum de Jônatas
ben Uzziel é outro targum babilônico em aramaico, que acompanhava os profetas
(os primeiros e os últimos). Data do século IV, sendo uma tradução mais livre
do texto que a tradução de Onquelos. Esses targuns eram lidos nas sinagogas: o
texto de Onquelos ao lado da Tora, que se liam em sua inteireza; Jônatas
era lido ao lado de seleções dos profetas (haphtaroth, pl.). Visto que
as demais partes do Antigo Testamento (escritos) não eram lidas nas sinagogas,
não se produziu nenhum targum oficial, mas havia cópias não-oficiais usadas
pelas pessoas de modo particular.
Pelos meados do século VII
surgiu o Targum do pseudo-Jônatas, sobre o Pentateuco. Trata-se
de uma mistura do Targum de Onquelos e alguns textos do Midrash. Outro
targum apareceu ao redor do ano 700, o Targum de Jerusalém, do qual
sobreviveu apenas um fragmento.
13.2.3 O Talmude
O Talmude basicamente
representa as opiniões e as decisões de professores judeus de cerca de 300 a 500 d.C., consistindo
em duas principais divisões: o Midrash e a Gemara. A Mishna (repetição,
explicação) completou-se perto de 200 d.C., como se fora um digesto –
publicação composta de artigos, livros condensados - hebraico de todas as leis
orais, desde o tempo de Moisés. Era altamente considerada como a segunda lei,
sendo a Tora a primeira. A Gemara (término, finalização) era um
comentário ampliado, em aramaico, da Mishna. Foi transmitida em duas
tradições: a Gemara palestina (c. 200) e a Gemara babilônica, maior,
dotada de mais autoridade (c. 500).
13.2.4 O Midrash
O Midrash (lit.,
estudo textual) na verdade era uma exposição formal, doutrinária e homilética
das Sagradas Escrituras, redigida em hebraico ou em aramaico. De mais ou
menos 100 até 300 d.C., esses escritos foram reunidos num corpo textual a que
se deu o nome de Halaka (procedimento), que era uma expansão adicional
da Tora, e Hagada (declaração, explicação), ou comentários de
todo o Antigo Testamento. O Midrash de fato diferia do Targum neste
ponto: o Midrash eram comentários, em vez de paráfrases. O Midrash contém
algumas das mais antigas hornilias do Antigo Testamento, bem corno alguns
provérbios e parábolas, textos usados nas sinagogas.
13.2.5 Septuaginta (LXX)
Bastante conhecida através
da sigla LXX, é a mais importante tradução grega do Velho Testamento. Seria
interessante pensar por alguns instantes qual a razão de um livro hebraico ser
traduzido para o grego numa cidade do Egito? A História nos confirma que
Alexandre Magno, com suas extraordinárias conquistas levou o grego a quase
todas as partes do mundo conhecido. Sua morte prematura em 323 a .C. fez com que seu
império fosse dividido. Cabendo a Ptolomeu I (323-285) governar o Egito,
iniciando assim a dinastia dos reis gregos no Egito. Calcula-se que no tempo de
Ptolomeu II, a cidade de Alexandria era composta por um terço de judeus. Como
era de se esperar esses imigrantes judeus facilmente adotaram a língua dos
gregos.
Dias Gomes citando Flávio
Josefo, fornece-nos pormenores úteis sobre a origem desta antiga tradução. Eis
uma síntese de suas palavras:
Demétrio Palério,
bibliotecário de Ptolomeu Filadelfo, trabalhava com extremo cuidado e grande
curiosidade para reunir de todas as partes do mundo os livros de mérito e que
julgava serem agradáveis ao príncipe. Certo dia o príncipe perguntou-lhe
quantos livros já havia na Biblioteca e soube que mais ou menos 200.000.
Notificou também ao rei a existência entre os judeus de livros dignos de
figurarem na soberba biblioteca, mas dariam muito trabalho traduzi-los para o
grego. Acrescentou que este trabalho poderia ser feito porque sua majestade não
olhava a gastos. O rei, persuadido pelo ilustre bibliotecário, fez um apelo ao
sumo-sacerdote de Jerusalém para que lhe enviasse os livros e pessoas
capacitadas para os traduzir. O pedido foi imediatamente atendido, talvez,
porque acompanhando-o havia grande soma de dinheiro e pedras preciosas.
Ptolomeu, recebeu através de uma carta a seguinte notificação:
"Escolhemos, Senhor, seis homens de cada tribo para vos levar as santas
leis e esperamos da vossa bondade, quando não tenhais mais necessidade deles,
que vos dignareis remetê-los com os que vão em sua companhia." Eleazar.
Quando a obra foi acabada (segundo alguns em 72 dias), Demétrio reuniu todos os
judeus para que ouvissem a leitura da tradução, na presença dos 72 tradutores.
A tradução foi aprovada e Demétrio elogiado por ter concebido um desígnio que
lhes era tão vantajoso. (JOSEFO, Flávio. Apud.
GOMES, Dias. Bíblia Poliglota Portuguesa, p. 26-28).
Para alguns esta história é
lendária, sendo a verdadeira razão para a origem da Septuaginta a seguinte:
Havendo em Alexandria muitos judeus que não podiam ler o Velho Testamento no
original hebraico, uma tradução em grego lhes foi preparada. Por causa do
número de tradutores essa extraordinária tradução se tornou conhecida (um tanto
inexatamente) como Septuaginta.
A Septuaginta é comumente
designada por LXX. O nome vem do latim Septuaginta, que quer dizer 70.
Aristeas, escritor da corte de Ptolomeu Filadelfo, que reinou de 285-246 a .C., escrevendo a seu
irmão Filócrates, conta que o referido monarca, por proposta de seu
bibliotecário, Demétrio de Falero, solicitou ao sumo sacerdote judaico,
Eleazar, que lhe enviasse doutores versados nas Sagradas Escrituras para
preparar-lhe uma versão delas, em
grego. Ele muito ouvia falar das Escrituras e queria uma
versão delas, para enriquecer sua vasta biblioteca, em Alexandria. O sumo
sacerdote escolheu 72 eruditos (6 de cada tribo) e enviou-os a Alexandria, os
quais completaram a versão em 72 dias. De 72 derivou-se o nome Septuaginta.
(Gilberto, Antonio, 1986, p. 84)
A tradução foi feita na ilha
de Faros, situada no porto da cidade. Essa Bíblia teve a mais ampla difusão
entre as nações, especialmente naquelas onde estavam os judeus da dispersão
oriunda do cativeiro. Foi a Septuaginta a primeira tradução completa do Antigo
Testamento, do original hebraico. Foi também ela que situou e dividiu os
livros por assuntos como os temos hoje: Lei, História, Poesia, Profecia. Não
há um só exemplar original da Versão dos Setenta; somente cópias, a mais antiga
das quais data de 325 d.C. É ela a mais antiga tradução da Bíblia hebraica. A
Septuaginta é usada ainda hoje na Igreja Grega. Sua primeira aparição impressa
é a constante da Complutensiana Poliglota publicada em Alcalá, província de
Madri, em 1514-1517, e distribuída em 1522 pelo Cardeal Ximenes.
13.2.6 A versão de Áqüila
A versão de Áqüila, natural
de Sínope, cidade do Ponto. É uma tradução puramente literal. Contém só o
Antigo Testamento. Foi feita em 138 d.C., no reinado de Adriano. Existe em
fragmentos.
13.2.7 A versão de Teodocião
A versão de Teodocião, natural
de Éfeso, coevo de Justino Mártir, que o menciona em seus escritos. Foi feita
em 160 d.C., no tempo do Imperador Cômodo. Não é mais que uma revisão dos LXX.
Contém só o Antigo Testamento. Teodocião era ebionita.
13.2.8 A versão de Símaco
A versão de Símaco, feita
em 218. Só do Antigo Testamento. Símaco era também ebionita. Existe em
fragmentos.
13.2.9 A Héxapla, de Orígenes
A Héxapla, de Orígenes. Não
é propriamente uma versão; é obra compendiada. Devido a falhas na tradução da
Septuaginta, Orígenes, grande erudito da igreja primitiva, compôs, em
Cesaréia, a Héxapla, ou versão de 6 colunas, em 228 d.C.
As seis colunas estão
dispostas da direita para a esquerda, assim: 1ª O texto hebraico; 2ª O texto grego traduzido do hebraico; 3ª A versão de Áquila; 4ª A versão de Símaco; 5ª A Septuaginta; 6ª A versão de Teodocião.
13.2.10 Revisões
Depois da Hexapla
Fizeram ainda revisões na
Septuaginta Luciano – fez seu trabalho mais ou menos pelo ano 300, pois foi
martirizado em 311. Para esta revisão usou manuscritos hebraicos superiores aos
usados por Orígenes e Hesíquio – sua revisão se processou na cidade de
Alexandria e foi somente aceita no Egito.
13.2.11 Versões
Siríacas
É provável que a primeira
versão do Novo Testamento tenha sido feita na língua siríaca. Dentre as versões
siríacas são dignas de nota as seguintes:
Siríaca
Antiga. É uma versão dos quatro Evangelhos, conservada hoje com
grandes lacunas nestes dois manuscritos. Embora estes manuscritos fossem
copiados no 5º e 4º séculos respectivamente, a forma de texto que eles
preservam data do fim do segundo século ou início do terceiro. O texto dos
Evangelhos sofreu influências do Diatessaron de Taciano. Seu tipo de texto
pertence ao grupo Ocidental.
Versão
Peshita. Em siríaco a palavra peshita significa simples, comum,
vulgar. Crêem alguns que a tradução foi feita por Rabbula, bispo de Edessa
(411-432), cognominado o São Jerônimo da Igreja Síria. Outros afirmam que o
autor é desconhecido, mas que a tradução foi feita para que o cristianismo
pudesse propagar-se entre aquele povo. Por ser um trabalho muito bem feito, foi
chamada "a rainha das versões". Contém todo o Velho Testamento sem os
livros apócrifos. Do Novo Testamento não foram traduzidos II e III João, II
Pedro, Judas e Apocalipse. Mais de 350 manuscritos da Peshita são conhecidos
hoje, diversos dos quais datam do 5º e 6º séculos.
Versão
Filoxênia. Esta é outra tradução bastante difícil de ser explicada
pela Crítica Textual. Crê-se que Filóxeno, bispo de Mabugue, comissionou a
tradução da Bíblia inteira baseada no grego, em 508 a .D.
Versão
Siríaca da Palestina. É conhecida principalmente por um
dicionário dos Evangelhos. Crêem os entendidos que seja uma tradução do quinto
século.
14 - VERSÕES LATINAS E INGLESAS
14.1
Versões Latinas
O latim era um idioma
dominante nas regiões ocidentais do Império Romano desde muito antes dos dias
de Jesus. Foram nas regiões ocidentais ao sul da Gália e na África do Norte que
apareceram as primeiras traduções da Bíblia em latim. Segundo Philip
W. Confort (1998, p. 235) “em cerca de 160 d.C., Tertuliano notoriamente usou
uma versão das Escrituras em
latim. Não muito tempo depois, o texto em latim antigo parece
ter estado em circulação, o que nos é evidenciado pelo uso de Cipriano antes de
sua morte, em 258 d.C.”. A versão em latim antigo era uma tradução da
Septuaginta. Manuscritos completos do texto em latim antigo não subsistiram.
Depois que a versão latina, a Vulgata, foi completada por Jerônimo, o texto
mais primitivo caiu em desuso.
14.1.1 A Vulgata latina
Segundo Philip W. Confort
(1998, p. 236) “por volta do século III d.C., o latim começou a
substituir o grego como língua de ensino no vasto mundo romano. Um texto
uniforme e confiável era extremamente necessário para uso teológico e
litúrgico”. Para preencher essa necessidade, o papa Dâmaso I (336-384 d.C.)
encarregou Jerônimo, eminente erudito no latim, grego e hebraico, de fazer a
tradução. Jerônimo começou o seu trabalho com uma tradução da Septuaginta em
grego, considerada inspirada por muitas autoridades da Igreja, inclusive
Agostinho. Contudo, mais tarde, e sob risco de grande crítica, voltou-se para
o texto hebraico que então estava em uso na Palestina, como texto base para sua
tradução. Durante o período de 390
a 405, Jerônimo fez sua tradução latina do Antigo
Testamento hebraico. Não obstante, a despeito de ter se voltado para o
original hebraico, Jerônimo dependia grandemente das diversas versões gregas
como auxílio à tradução. Por conseguinte, a Vulgata espelha as outras
traduções gregas e latinas tanto quanto o texto hebraico fundamental.
14.1.1.1
Autor da Vulgata
Sofrônio
Eusébio Jerônimo (c. 340-420) nascera de pais cristãos, em Estridão, na
Dalmácia. Havia sido educado na escola local até sua ida a Roma, com a idade de
doze anos. Durante os oito anos seguintes, Jerônimo estudou latim, grego e
autores pagãos, antes de tornar-se cristão, com a idade de dezenove anos. Logo
após sua conversão e batismo, Jerônimo devotou-se a uma vida de rígida
abstinência e de serviço ao Senhor. Passou muitos anos perseguindo uma vida
semi-ascética de eremita. De 374
a 379, empregara um rabino judeu para que lhe ensinasse
o hebraico, enquanto estivesse residindo no Oriente, perto de Antioquia. Foi
ordenado presbítero em Antioquia antes de partir para Constantinopla, onde
passou a estudar sob a orientação de Gregório de Nazianzo. Em 382, foi
convocado por Roma para ser secretário de Dâmaso, bispo de Roma, e nomeado
membro de uma comissão para revisar a Bíblia latina.
14.1.1.2 A Data e o Lugar da Tradução da Vulgata
Latina
Jerônimo
recebeu a incumbência em 382 e iniciou seu trabalho quase imediatamente. A
pedido de Dâmaso introduziu uma ligeira revisão nos evangelhos, completada em
383. Logo após ter terminado a revisão dos evangelhos, morre-lhe o mecenas (384),
tendo sido eleito novo bispo de Roma.
Jerônimo, que aspirava a esse cargo, já havia terminado uma revisão
rápida do chamado Saltério romano quando
regressou ao Oriente e se estabeleceu em Belém. De volta a Belém, Jerônimo voltou sua
atenção a uma revisão mais cuidadosa do Saltérío romano, que completou em 387.
Essa revisão é conhecida como Saltério galileu, empregado atualmente no Antigo
Testamento da Vulgata. Baseou-se de fato nos Héxapla de Orígenes, a quinta
coluna, sendo mera tradução dos Salmos. Tão logo havia terminado sua revisão
dos Salmos, Jerônimo iniciou a revisão da LXX, embora esse trabalho não fizesse
parte de seus objetivos iniciais. Estando em Belém, Jerônimo havia iniciado seu
trabalho de aperfeiçoar seus conhecimentos do hebraico, de modo que pudesse
executar uma nova tradução do Antigo Testamento diretamente das línguas
originais. Os amigos ao redor aplaudiram seus esforços, mas outros, muito
longe, começaram a suspeitar que Jerônimo estaria judaizando; alguns se
enfureceram quando Jerônimo lançou dúvidas sobre a “inspiração da Septuaginta”.
Traduziu o Saltério hebraico com base no texto hebraico usado na época, na
Palestina. Finalmente, em 405, completou sua tradução latina do Antigo
Testamento hebraico. Nos últimos quinze anos de vida, Jerônimo continuou
escrevendo, traduzindo e revisando sua tradução do Antigo Testamento.
Jerônimo
pouca atenção deu aos apócrifos; só com grande relutância produziu uma tradução
apressada de algumas passagens de Judite, de Tobias e do resto de Ester, mais
as adições de Daniel - antes de morrer. O resultado foi que a versão dos livros
apócrifos, pertencente à Antiga latina, foi adicionada à Bíblia chamada Vulgata
latina na Idade Média, sobre o cadáver de Jerônimo.
14.1.2 Versões, Traduções e Paráfrase em Inglês
Segundo Philip W. Confort
(1998, p. 361), “no século VI, o Evangelho foi levado para a Inglaterra pelos
missionários de Roma. A Bíblia que levaram foi a Vulgata Latina. Nessa época,
os cristãos que viviam na Inglaterra dependiam dos monges para qualquer tipo de
instrução relacionada à Bíblia. Os monges liam e ensinavam a Bíblia latina”.
Depois de alguns séculos, quando mais mosteiros foram fundados, surgiu a
necessidade de traduções da Bíblia em inglês. A mais antiga tradução em inglês, até
onde sabemos, é a que foi feita por um monge do século VII, chamado Cedmon, que
fez uma versão métrica de partes do Antigo e do Novo Testamento. Acredita-se
que outro clérigo inglês, chamado Bede, traduziu os evangelhos para o inglês.
Diz a tradição que, em 735, esse clérigo estava traduzindo o Evangelho de João
em seus últimos momentos de vida. Outro tradutor foi Alfredo, o Grande (que
reinou de 871 a
899), considerado por todos como um rei muito letrado. Incluiu em suas leis
trechos dos Dez Mandamentos traduzidos para o inglês e também traduziu os
Salmos.
14.1.2.1
Desenvolvimento da Língua
Inglesa
Segundo Norman Geisler
(1997, p. 219), “não se sabe com certeza como a língua inglesa se desenvolveu,
mas a maioria dos estudiosos segue a orientação de Beda, o Venerável (c. 673-735),
que data seu início em cerca de 450 da era cristã”. O período de 450 a 1100 é denominado
anglo-saxônico, ou do antigo inglês, por ter sido dominado pela influência dos
anglos, dos saxões e dos jutos em seus vários dialetos. Após a invasão normanda
de 1066, a
língua sofreu a influência de dialetos escandinavos, e o período do médio
inglês apareceu de 1100 a
1500. Esse foi o período de Geoffrey Chaucer (1340-1400) e de John Wycliffe.
Após a invenção da prensa móvel por Johann Gutenberg (c. 1454), o inglês entrou
em seu terceiro período de desenvolvimento: o do inglês moderno (1500 até o
presente). Esse período de desenvolvimento foi precipitado pela grande mudança
vocálica no século que se seguiu à morte de Chaucer e precedeu ao nascimento de
William Shakespeare.
14.1.2.2 As
Traduções Parciais para o Antigo
Inglês (450-1100)
Segundo Norman Geisler
(1997, p. 220), “as primeiras traduções de partes das Escrituras basearam-se
nas traduções da Antiga latina e da Vulgata, e não nas línguas originais,
o hebraico e o grego, e nenhuma delas continha o texto da Bíblia toda. Não
obstante, elas ilustram a maneira pela qual a Bíblia entrou para a língua
inglesa”.
Aldhelm (640-709). Aldhelm foi o primeiro bispo de
Sherborne em Dorset. Logo
depois do ano 700, ele traduziu o Saltério para o antigo inglês. Foi a
primeira tradução direta de qualquer parte da Bíblia para a língua inglesa.
Egberto (700). Egberto da Nortúmbria tomou-se arcebispo
de Iorque pouco depois da morte de Beda. Ele foi também o mestre de Alcuíno de
Iorque, que foi mais tarde chamado por Carlos Magno para estabelecer uma escola
na corte de Aix-Ia-Chapelle (Aachen). Por volta de 705, Egberto traduziu os
evangelhos para o antigo inglês pela primeira vez.
Beda, o Venerável (674-735). Maior estudioso da Inglaterra e um dos
maiores de toda a Europa dos seus dias, Beda residiu em Jarrow-on-the-Tyne, na
Nortúmbria. De lá, ele escreveu sua famosa História eclesiástica e
outras obras. Entre essas obras encontrava-se uma tradução do evangelho de
João, cujo propósito foi provavelmente o de suplementar os três outros
traduzidos por Egberto. Segundo relatos tradicionais, Beda terminou a tradução
na hora da morte.
Alfredo, o Grande (849-901).
Alfredo
foi um estudioso de primeira, além de ter sido rei da Inglaterra (870-901).
Durante seu reinado, a Lei Danesa foi estabelecida sob o Tratado de Wedmore
(878). O tratado continha somente duas estipulações para os novos súditos:
batismo cristão e fidelidade ao rei. Juntamente com sua tradução da História
eclesiástica de Beda do latim para o anglo-saxão, ele também traduziu os Dez
mandamentos, excertos do Êxodo, 21-23, de Atos, 15.23-29, e uma forma
negativa da Regra áurea. Foi durante o seu reinado que a Inglaterra
experimentou um reavivamento do cristianismo.
Aldred (950). Outro
elemento foi introduzido na história da Bíblia inglesa quando Aldred escreveu
um comentário nortumbriano entre as linhas de uma cópia dos evangelhos escrita
no latim do final do século VII. É da cópia latina de Eadfrid, bispo de
Lindisfarne (698-721), que a obra de Aldred recebe seu nome, os Evangelhos
de Lindisfarne.
Aelfric (1000). Aelfric
foi bispo de Eynsham, em Oxfordshire, Wessex, quando traduziu partes dos sete
primeiros livros do Antigo Testamento. Essa tradução e outras partes do Antigo
Testamento que ele traduziu e citou em suas homilias basearam-se no texto
latino. Mesmo antes da época de Aelfric, os Evangelhos de Wessex foram
traduzidos para o mesmo dialeto. Esses elementos constituem a primeira tradução
existente dos evangelhos para o antigo inglês.
14.1.2.3. As reduções parciais para o médio inglês
(1100-1400)
Segundo Norman Geisler
(1997, p. 221), “a conquista normanda (1066) deu-se graças à disputa em torno
do trono de Eduardo, o Confessor. Com ela, o período do domínio saxônico na
Inglaterra chegou ao fim, e um período de influência normando-francesa se fez
sentir sobre a língua dos povos conquistados. Durante esse período de domínio
normando foram feitas outras tentativas de traduzir a Bíblia para o inglês”.
Orm ou Ormin (1200). Orm foi um monge agostiniano que escreveu
uma paráfrase poética dos evangelhos e de Atos acompanhada de comentário. Essa
obra, o Ormulum, é preservada em um único manuscrito de 20.000
palavras. Embora o vocabulário seja puramente teutônico, a cadência e a sintaxe
mostram a influência normanda.
Guilherme de Shoreham (1320). Shoreham freqüentemente recebe o crédito
de ter produzido a primeira tradução em prosa de uma parte da Bíblia para um
dialeto sulista do inglês, embora exista alguma dúvida quanto a ele ter sido
realmente o tradutor dessa obra de 1320.
Ricardo Rolle (1320-1340). Rolle é conhecido como o "Eremita
de Hampole". Foi responsável pela segunda tradução literal das Escrituras
para o inglês. Vivendo perto de Doncaster, em Yorkshire, fez sua tradução da Vulgata
latina para o dialeto inglês do norte. Sua tradução do Saltério foi
amplamente divulgada e reflete o desenvolvimento da tradução da Bíblia inglesa
até a época de John Wycliffe.
14.1.2.4 As Traduções Completas para o Médio Inglês
e para o Inglês Moderno em
Fase Inicial
Embora não houvesse nenhuma
Bíblia completa em inglês antes do século XIV, diversos indícios apontavam para
o aparecimento iminente de uma. A ampla circulação do Saltério literal
de Rolle na exata época em que a corte papal passava por lutas se associou ao
chamado cativeiro babilônico (1309-1377). Esse acontecimento e suas
conseqüências formaram o pano de fundo para a obra de outros tradutores
bíblicos.
A Bíblia de Wycliffe. João Wycliffe (c. 1329-1384) - O mais
eminente teólogo oxfordiano de seus dias - e seus associados foram os primeiros
a traduzir a Bíblia inteira do latim para o inglês. Segundo Philip W. Confort
(1998, p. 363), “Wycliffe foi chamado de a Estrela
da Manhã da Reforma", porque audaciosamente questionou a autoridade
papal, criticou a venda de indulgências, negou a realidade da
transubstanciação (doutrina que diz que a substância do pão e do vinho é mudada
em corpo e sangue de Jesus Cristo durante a missa) e falou abertamente contra
as hierarquias eclesiásticas. O papa condenou Wycliffe por seus ensinamentos
"heréticos" e pediu que a Universidade de Oxford o demitisse. Mas
Oxford e muitos líderes governistas permaneceram ao lado de Wycliffe, de modo
que conseguiu sobreviver aos ataques do papa.
Wycliffe acreditava que o
caminho para prevalecer em sua luta contra a autoridade abusiva da Igreja
Católica era tornar a Bíblia acessível às pessoas em sua própria língua. Desse
modo, poderiam ler por si mesmas acerca da forma como cada uma poderia ter um
relacionamento pessoal com Deus através de Jesus Cristo - independente de
qualquer autoridade eclesiástica. Wycliffe, com seus associados, completaram
o Novo Testamento por volta de 1380 e o Antigo Testamento em 1382. Enquanto
Wycliffe concentrava seus esforços no Novo Testamento, um de seus associados,
Nicolau de Hereford, fazia uma parte importante do Antigo Testamento. Wycliffe
e seus companheiros, desconhecedores do hebraico e do grego originais,
traduziram o texto do latim para o inglês. Depois de Wycliffe ter terminado seu
trabalho de tradução, organizou um grupo de paroquianos pobres, conhecido como
lolardos, para irem por toda a Inglaterra pregando as verdades cristãs e lendo
as Escrituras na língua materna a todos os que ouvissem a Palavra de Deus. O
resultado desse empreendimento foi que a Palavra de Deus, através da tradução
de Wycliffe, tornou-se acessível a muitos ingleses.
Um dos associados mais
chegados de Wycliffe, João Purvey (c. 1353-1428), continuou a obra de Wycliffe,
lançando, em 1388, uma revisão de sua tradução. Purvey era um excelente
erudito. Seu trabalho foi muito bem recebido por sua geração e pelas que se
seguiram. Menos de um século depois, a edição revista de Purvey havia
substituído a Bíblia inicial de Wycliffe.
William Tyndale (1492-1536). Após tentativas malfadadas de fazer sua
tradução na Inglaterra, William Tyndale embarcou para o Continente em 1524.
Após outras dificuldades, finalmente imprimiu o Novo Testamento em Colônia, no
fim de fevereiro de 1526. Seguiu-se uma tradução do Pentateuco, em
Marburgo (1530), e de Jonas, na Antuérpia (1531). Conforme Norman Geisler
(1997, p. 224) “as influências de Wycliffe e de Lutero eram evidentes no
trabalho de Tyndale e o mantiveram sob constantes ameaças. Além disso, essas
ameaças eram tantas, que as traduções de Tyndale tiveram de ser contrabandeadas
para a Inglaterra. Tendo chegado lá, exemplares foram comprados por Cuthbert
Tunstall, bispo de Londres, que as fez queimar publicamente em St. Paul's Cross ”.
Conforme Norman Geisler (1997, p. 224) “em 1534, Tyndale publicou sua revisão
do Gênesis e começou a trabalhar numa revisão do Novo Testamento. Pouco depois
de completar essa revisão, foi seqüestrado na Antuérpia e levado à fortaleza de
Vilvorde, em Flandres.
Ali continuou a traduzir o Antigo Testamento”.
A Bíblia de Coverdale. Miles Coverdale era graduado de
Cambridge e, como Tyndale, havia sido forçado a fugir da Inglaterra, porque
fora grandemente influenciado por Lutero, à medida que audaciosamente pregava
contra a doutrina católica. Enquanto estava no exterior, Coverdale encontrou-se
com Tyndale e então passou a servi-lo de assistente - sobretudo ajudando-o na
tradução do Pentateuco. Pela época em que Coverdale publicava uma tradução completa (1537),
o rei da Inglaterra, Henrique VIII, rompia todas as relações com o papa e
estava pronto para aceitar a publicação de uma Bíblia em Inglês.
A Bíblia de Rogers e a Bíblia Grande (1537). No mesmo ano em que a Bíblia
de Coverdale foi endossada pelo rei (1537), outra Bíblia foi publicada na
Inglaterra. Tratava-se do trabalho de alguém chamado Thomas Matthew,
pseudônimo de João Rogers (c. 1500-1555), amigo de Tyndale. Obviamente,
Rogers usou a tradução inédita dos livros históricos do Antigo Testamento feita
por Tyndale, outras porções traduzidas por Tyndale e ainda outras porções da
tradução de Coverdale para formar uma Bíblia inteira. Esta Bíblia também
recebeu a aprovação do rei. A Bíblia de Rogers foi revisada em 1538 e impressa
para distribuição nas igrejas de toda a Inglaterra. Conhecida como a Bíblia
Grande por causa do seu tamanho e preço elevado, tomou-se a primeira Bíblia em
inglês autorizada para uso público.
A Bíblia de Genebra (1524-1579). Os ingleses exilados em Genebra, Suíça,
escolheram William Whittingham (1524-1579) para lhes fazer uma tradução em
inglês do Novo Testamento. Whittingham usou a tradução latina de Teodoro Beza e
consultou o texto grego. Essa Bíblia tornou-se muito popular, porque era pequena
e de preço moderado. O prefácio e suas muitas anotações estavam impregnadas
por forte influência evangélica, bem como pelos ensinamentos de João Calvino.
Calvino foi um dos maiores pensadores da Reforma, renomado comentarista
bíblico e o principal líder em Genebra durante essa época.
A Bíblia do rei Tiago – A King James Version (1611). Em janeiro de 1604, Tiago I foi
convocado a comparecer à Conferência de Hampton Court. Na ocasião John
Reynolds, presidente puritano da Faculdade Corpus Christi, em Oxford, levantou
a questão de ser feita uma versão autorizada da Bíblia para todos os partidos
dentro da igreja. Foi nomeada uma junta. Seis grupos de tradutores foram
escolhidos: dois em Cambridge para revisar de 1Crônicas a Eclesiastes e os
livros apócrifos; dois em Oxford para revisar de Isaías a Malaquias, os
evangelhos, Atos e o Apocalipse; dois em Westminster para revisar de Gênesis a
2Reis e de Romanos a Judas. Apenas 47 dos 54 homens escolhidos trabalharam de
fato nessa revisão da Bíblia dos bispos.
As notas marginais
acompanharam a nova revisão, e a chamada Versão autorizada nunca chegou
a ser de fato autorizada, nem ser de fato uma versão. Ela substituiu a Bíblia
dos bispos nas igrejas porque nenhuma edição dessa Bíblia foi publicada
depois de 1606.
Três edições da nova tradução
apareceram em 1611. Outras edições foram publicadas em 1612. Durante o reinado
de Carlos I (1625-1649), o Parlamento Longo estabeleceu uma comissão para
deliberar sobre a revisão da chamada Versão autorizada ou produzir uma
tradução totalmente nova. Somente revisões insignificantes resultaram em 1629,
1638, 1653, 1701, 1762, 1769 e duas edições posteriores. Essas três últimas
revisões foram feitas pelo dr. Blayney de Oxford. Elas variaram em cerca de 75
mil pormenores do texto da edição de 1611. Pequenas mudanças continuaram a
surgir no texto até datas recentes como 1967 no texto da Versão autorizada que
acompanha a New Scofield reference edition [Nova edição de referência
de Scofield]. Entrementes, foram feitas tentativas de trazer amplas alterações
e correções às traduções inglesas da Bíblia em virtude de novas descobertas
textuais e por conta da natureza mutável da própria língua (GEISLER, 1997, p.
231).
15 - TRADUÇÕES E VERSÕES CASTELHANAS E
PORTUGUESAS
15.1
Traduções Castelhanas
A primeira tradução que se
fez em castelhano foi o Novo Testamento surgido em 1543. Foi obra do jovem
reformador Francisco de Enzinas. Filho de pais nobres e ricos foi enviado a
estudar nos Países Baixos, onde recebeu decisiva influência dos reformadores.
Dirigiu-se posteriormente à Alemanha para conhecer Melanchton, em cuja casa se
hospedou. Estudando na Universidade de Wittenberg e encorajado por Melanchton
dedicou-se à sublime tarefa de traduzir o Novo Testamento do original grego
para a sua língua nativa.
A segunda tradução para o
espanhol é a conhecida "Bíblia de Ferrara" que em realidade não
contém senão o Antigo Testamento. Esta versão foi obra de certos eruditos
judeus, que por questões religiosas foram desterrados da Península Ibérica.
Radicaram-se na Itália, onde havia maior liberdade em questões religiosas.
Reunidos em Ferrara quatro bons conhecedores do hebraico e do espanhol, com
manuscritos originais a sua disposição não lhes foi muito difícil concluir a
tarefa a que se propuseram.
A primeira tradução completa
da Bíblia para a língua castelhana foi obra de Casiodoro de Reina, que nascera
ao sul da Espanha em 1520.
Após ter estudado para
sacerdote, tornou-se pregador evangélico, razão porque teve de fugir da
Espanha. Trabalhou 12 anos nesta tradução, que foi publicada em Basiléia no ano
de 1569. Baseou seu trabalho em manuscritos originais, mas teve auxílio de
traduções anteriores, como a grande versão de Ferrara (1533).
15.2
Traduções Portuguesas
Neste
capítulo apresentaremos um breve histórico da tradução da Bíblia em português,
tanto em Portugal quanto no Brasil.
15.2.1 Período das Traduções
Parciais
D. Diniz (1279-1325) foi a
primeira pessoa a traduzir para a língua portuguesa o texto bíblico. Grande
conhecedor do latim clássico, e leitor da Vulgata, D. Diniz resolveu enriquecer
o português traduzindo as Sagradas Escrituras para o nosso idioma, tomando como
base a Vulgata Latina. Embora lhe faltasse perseverança e só conseguisse
traduzir os vinte primeiros capítulos do livro de Gênesis, esse seu esforço
o colocou em uma posição historicamente anterior a alguns dos primeiros
tradutores da Bíblia para outros idiomas, como João Wycliff, por exemplo, que
só em 1380 traduziu as Escrituras para o inglês.
Fernão Lopes disse em seu
curioso estilo de cronista do século XV, que D. João I (1385-1433), um dos
sucessores de D. Diniz no trono português, “fez grandes letrados tirar em
linguagem os Evangelhos, os Atos dos Apóstolos e as epístolas de São Paulo,
para que aqueles que os ouvissem fossem mais devotos acerca da lei de Deus”.
(Crônica de D. João I, 2ª. Parte). Esses “grandes letrados” eram vários padres
que também se utilizaram da Vulgata Latina em seu trabalho de tradução.
Enquanto esses padres
trabalhavam, D. João I, também conhecedor do latim, traduziu o livro de Salmos,
que foi reunido aos livros do Novo Testamento traduzidos pelos
padres. Seu sucessor, D. João lI, outro grande apoiador das traduções do texto
bíblico, mandou gravar no seu cetro a parte final do versículo 31 de Romanos 8:
“Se Deus é por nós, quem será contra nós?”.
Como nessa época a imprensa
ainda não havia sido inventada, os livros eram produzidos em forma manuscrita,
fazendo-se uso de folhas de pergaminho. Isso tornava sua circulação
extremamente reduzida. Por ser um trabalho lento e caro, era necessário que ou
a Igreja Romana ou alguém muito rico assumisse os custos do projeto. Ninguém
mais indicado para isto do que os nobres e os reis.
Outras figuras da monarquia
de Portugal também realizaram traduções parciais da Bíblia. A neta do rei D.
João I e filha do Infante D. Pedro, a Infanta D. Filipa, traduziu do francês os
Evangelhos. No século XV surgiram publicados em Lisboa o Evangelho de
Mateus e porções dos demais Evangelhos, um trabalho realizado pelo
frei Bernardo de Alcobaça, que pertenceu à grande escola de tradutores
portugueses da Real Abadia de Alcobaça. Ele baseou suas traduções na Vulgata
Latina.
A primeira harmonia dos Evangelhos
em língua portuguesa, preparada em 1495 pelo cronista Valentim Fernandes,
e intitulada De Vita Christi,
teve os seus custos de publicação pagos pela rainha Dona Leonora, esposa de D.
João II. Cinco anos após o descobrimento do Brasil, D. Lenora mandou também
imprimir o livro de Atos dos Apóstolos e as epístolas universais de
Tiago, Pedro, João e Judas, que haviam sido traduzidos do latim vários anos
antes por frei Bernardo de Brinega.
Em 1566 foi publicada em
Lisboa uma gramática hebraica para estudantes portugueses. Ela trazia em
português, como texto básico, o livro de Obadias.
15.2.1.1 Outras Traduções
Outras traduções em língua
portuguesa, realizadas em Portugal, são dignas de menção: Os quatro
Evangelhos, traduzidos em elegante português pelo padre jesuíta Luiz Brandão.
No início do século XIX, o padre Antônio Ribeiro dos Santos traduziu os
Evangelhos de Mateus e Marcos, ainda hoje inéditos.
É fundamental salientar que
todas essas obras sofreram, ao longo dos séculos, implacável perseguição da
Igreja Romana, e de muitas delas só escaparam um ou dois exemplares, hoje
raríssimos. A Igreja Romana também amaldiçoou a todos os que conservassem
consigo essas traduções da Bíblia em idioma vulgar (BÍBLIA THOMPSON, 1992, p.
1379).
15.2.2
Tradução de João Ferreira de Almeida
A Edição Comemorativa do
Terceiro Centenário da Tradução da Bíblia em língua portuguesa, apresentou para
João Ferreira de Almeida as seguintes informações: "Nascido em Torres de
Tavares, Conselho de Mangualde, Portugal, em 1628, faleceu, João Ferreira de
Almeida, em 1691” .
Temos aqui 63 anos que se dignificaram na vida do consagrado servo de Deus. É
consagrado no campo da cultura secular, versado na lingüística, incansável na
comparação das línguas que aprendeu e usou, valeu-se de sua língua nativa, a
portuguesa, para a expressão geral e ampla de suas obras principais, destacando-se,
dentre elas, a tradução que fez da Bíblia, dos originais hebraico e grego para
a língua portuguesa.
João Ferreira de Almeida foi
quem primeiro traduziu a Bíblia para o nosso vernáculo. Português ele, de três
séculos idos, é certo que ainda falando e escrevendo corretamente, com segura
inteligência das proposições, das frases e das palavras teve linguagem que hoje
seria distante e até, não raro, diferente para as sucessivas edições da Bíblia,
segundo ele a traduziu, porque a evolução semântica da linguagem, por vezes,
impõe mudanças de palavras para que se não mude o sentido das mensagens.
Há 300 anos (1681) João
Ferreira de Almeida traduziu o Novo Testamento, em Amsterdã; e daí avante, sua
publicação (Batávia, 1693), novamente em Amsterdã (1712); em Trangambar,1760; e
outra vez em Batávia, 1773.
Incansável no trabalho,
traduziu também o Antigo Testamento, mas até o versículo 12 do capítulo 48 de
Ezequiel.
Em 1656, Almeida foi
ordenado pastor da Igreja Reformada, mas sempre desejoso de promover a Reforma em Portugal. De 1656 até
1658 foi missionário no Ceilão, depois na Índia, e foi o primeiro ordenado a
pregar em português. De
volta a Batávia, pastoreou a comunidade portuguesa ali existente.
Faleceu, dissemos, em 1691,
todavia João Ferreira de Almeida até hoje influi com as traduções que deixou da
Bíblia. A mais antiga versão usual no Brasil, entre os evangélicos, mereceu da
Sociedade Bíblica do Brasil certa atualização na linguagem, pois dista três
séculos a tradução do Almeida.
Na seção de Livros Raros da
Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, há um exemplar do Novo Testamento
impresso em Amsterdã (1712).
15.2.2.1
A Tradução de
Almeida Revisada
Duas entidades – Comissão
Revisora e Comissão Consultiva – foram organizadas entre nós, sob os auspícios
das Sociedades Bíblicas Unidas para se desincumbirem da sagrada
responsabilidade de rever a Tradução de Almeida e atualizar a sua linguagem.
Estas duas comissões em sua reunião inaugural, no dia 14 de abril de 1943, sob
a presidência do destacado Pastor César Dacorso Filho, tratavam das
"Razões por que necessitamos de uma revisão das atuais versões da Bíblia
em Português". Os brasileiros contaram com o apoio irrestrito e a sábia
experiência dos Secretários Executivos das Sociedades Bíblicas Unidas nesta
primeira reunião, mas posteriormente o Secretário de Tradução da Sociedade
Bíblica Americana, Dr. Eugene A. Nida visitou o nosso país com a finalidade
precípua de orientar os trabalhos de tradução e revisão.
Depois de ponderados e
minuciosos estudos das três traduções mais divulgadas no Brasil, ou sejam:
Almeida, Figueiredo e da Tradução Brasileira de 1917, a comissão decidiu
pela revisão da tradução Almeida, observando os seguintes tópicos: fidelidade
ao texto original; tradução e não interpretação; clareza, correção e elegância
de linguagem; cunho espiritual da linguagem; aproveitamento de outras versões e
acesso às línguas originais.
De acordo com a Sociedade
Bíblica do Brasil, o trabalho feito não foi uma nova tradução, mas uma revisão
da tradução de João Ferreira de Almeida. Os textos originais foram Nestle, para
o Novo Testamento e Letteris para o Velho Testamento.
As modificações feitas em
Almeida se basearam, especialmente, nestes aspectos: infidelidade ao original,
ou em desacordo com o melhor texto; palavra ou frase antiquada demais; palavra
ou frase que apresentasse alguma impropriedade; construção gramatical inferior.
Nesta revisão, talvez tenha
permanecido, no máximo, 30% da linguagem de Almeida, não sendo de admirar este
corte se levarmos em consideração que a linguagem de Almeida, que estava sendo
atualizada, tinha quase 200 anos.
O renomado vernaculista,
Antônio de Campos Gonçalves, secretário e relator da Comissão nos científica de
que a Sociedade Bíblica do Brasil desejou conservar o mais possível a linguagem
de Almeida, mas este objetivo era difícil de ser alcançado, por ser muito
antiga a sua linguagem e por serem diferentes os originais seguidos por Almeida
(Textus Receptus) e pela Comissão Revisora (Letteris e Nestle).
Outros aspectos contestado
por entendidos na arte de traduzir sobre a Almeida Atualizada são os termos
eruditos e rebuscados, desconhecidos até por pessoas cultas. Preciosismos
literários idênticos aos seguintes deveriam ser evitados: coudelaria (Et 8.10),
excogitar (Sl 64.6), acrisolar (Sl 66.10), espelta (Is 28.25), sachar (Is 5.2),
prevaricações (Ez 33.0), gazofiláceo (Mc 12.41), recalcitrar (At 2614),
inculcando-se (Rm 1.22), adágio (2Pe 2.22). Não nos esqueçamos de que a
linguagem é correta e o estilo agradável de se ler.
Como bem destacou o Dr.
Bittencourt, no livro O Novo Testamento, páginas 244 e 245: "Nenhuma
tradução é perfeita, nem quanto ao presente, nem futuro. E a última revisão de
Almeida não poderia escapar a este destino.
A crítica aponta-lhe sérios
lapsos de tradução, que seria cansativo enumerar. E, ao comentar o fato sobre o
Antigo Testamento o ilustre professor de línguas da Universidade de São Paulo,
disse que os Salmos, especialmente, poderiam ser bem melhorados, quer quanto à tradução
propriamente dita, quer quanto à métrica.
Embora a espaços largos no
correr do tempo, a semântica de alguns vocábulos varia. Novos vocábulos vão
sendo criados e outros abandonados, tornando-se arcaicos.
E para que determinada
tradução não envelheça, ela deve ser revista, não só quanto à língua, mas
quanto à tradução propriamente dita, levando-se em conta as descobertas no
campo da crítica textual que sempre trazem novo material para o aperfeiçoamento
do texto sagrado nas línguas originais. E esta revisão, tão recente, já pede
outros labores que a tornem bem melhor.
15.2.3
Tradução de Figueiredo
Por um decreto de 1757, no
tempo do Papa Bento XIV, a Bíblia era reconhecida como útil para robustecer a
fé. Esta nova atitude da Igreja Católica Romana deu impulso à tradução da
Bíblia com a Vulgata como base. Entre estes se encontrava o Padre Antônio
Pereira de Figueiredo, nascido perto de Lisboa em 1725. Por ser exímio
latinista, e como ele mesmo confessa: "Não sendo eu nem ainda medianamente
instruído nas línguas originais, hebraica e grega, em que foram escritos,
respectivamente, o Velho Testamento e os Evangelhos, mal poderia sair exata e
perfeita esta minha tradução."
A
sua tradução se baseou na Vulgata. Por 18 anos ocupou-se
deste trabalho, que foi submetido a duas revisões cuidadosas antes de ser
publicado. A primeira edição do Novo Testamento saiu em 1778 em seis volumes e
o Velho Testamento foi publicado em 17 volumes, seguidamente, desde 1783 a 1790.
A edição de sete volumes
completada em 1819 é considerada o padrão das versões de Figueiredo. A tradução
de Figueiredo em um só volume foi publicada pela primeira vez em 1821.
A principal objeção que se
faz à Bíblia de Figueiredo é esta: apresenta deficiências que se verificam numa
tradução de tradução.
Dr. Benedito P. Bittencourt
apresentou ainda as seguintes falhas nesta tradução:
O uso de algumas palavras em
Português demonstra como foi tendenciosa a tradução de Figueiredo. Em 1 Pedro
5.5 ele traduz: 'apoiando a honra dos padres'. Nas revisões feitas pelas
sociedades Bíblicas esta tradução foi mudada para 'obedecei aos mais velhos' em
harmonia com o original. Em João 11.57 ele traduz 'pontífice' em lugar de
'sumo-sacerdote', bem como na maioria dos lugares em que o termo aparece na
carta aos Hebreus. A palavra padre, no sentido usado pela Igreja Romana, é
usada, como no exemplo dado, para traduzir a palavra grega presbíteros em
muitos lugares, o que não representa o sentido original. Figueiredo foi acusado
de tradução perifrástica e livre. Em 2Co 4.8b ele traduz: 'Somos cercados de
dificuldades insuperáveis e a nenhuma sucumbimos', que Almeida revista traduz:
'perplexos, porém não desanimados'. Não é somente tradução perifrástica, mas a
segunda parte não guarda o significado original. Ele faz duas pequenas
sentenças coordenadas em vez de adversativas. Não foi influência da Vulgata que
ele tinha diante de si, pois esta traz: aporiamur, sed non destituimur, mas seu
próprio modo de traduzir [...] Dezenas de exemplos se poderiam citar, mas estes
poucos dão idéia de como Figueiredo fez sua tradução: melhor linguagem que a de
Almeida, mas pior tradução." (O Novo Testamento. Cânon – Língua – Texto,
p. 220).
A tradução de Figueiredo foi
a primeira a verter a expressão "kuriakê hemera" de Ap 1.10 para
domingo.
15.2.4
Edição Trinitária de
1883
Tão logo se fundou a
Trinitarian Bible Society, em Londres, cuidou de verter o Livro Santo em vários
idiomas, inclusive em português, que saiu a lume em 1883. Esta primeira edição
da Trinitária é muito disputada pelos adventistas da fala portuguesa, ao ponto
de se pagarem somas fabulosas por um exemplar, hoje raríssimo. E por quê?
Porque ela registra assim Lc 23.43: 'E Jesus lhe disse: Na verdade te digo
hoje, que estarás comigo no Paraíso'. E Ap 22.14: 'Bem-aventurados aqueles que
guardam os seus Mandamentos, para que tenham acesso à árvore da vida, e para
que entrem na cidade pelas portas'. E assim Jo 3.4: '... pecado é
quebrantamento da Lei'. Estes três textos, assim traduzidos, casam-se
maravilhosamente com certos aspectos da doutrina adventista. Também Is 42.21:
'... engrandecerá Ele a Lei, e a fará ilustre'.
Entretanto, tirando esta
aparente vantagem para os adventistas, a tradução, nos demais, do ponto de
vista técnico e diante de novas descobertas da Crítica Textual, deixa muito a
desejar, não é recomendável como um todo. A crítica especialmente aponta-lhe
sérios deslizes tradutórios no Velho Testamento, principalmente em alguns Salmos. A
parte do Novo Testamento baseou-se no texto Receptus de 1624, que não é bom, e
foi superado pelo trabalho de Tischendorf e posteriormente por Westcott and
Hort, pelos papiros de Beatty, e mais recentemente pelo famoso e atualíssimo
texto de Ebberard Nestle. Ora, os textos gregos modernos estão escoimados de
interpolações e inexatidão dos textos antigos, pois o trabalho da Crítica
Textual consiste em restaurar, tanto quanto possível o texto original.
O português desta primeira
edição da Trinitária é simplesmente horroroso, arcaicíssimo e deselegante. É
freqüente o emprego de termos obsoletos e desusados, como, 'capros' (Lv 16.8),
'hum', 'humo' (em vários passos), 'olíbano' (Is 66.3), 'graça' (Sl 1.4)... e
sobretudo a inadmissível grafia dos verbos no futuro ('virão', por exemplo).
Cacófatos dos piores
encontram-se, por exemplo, em 2Sm 1.3; Gn 25.30; Ez 45.24; 46.11; Sl 102.6; Is
62.8; 2Co 11.33; Hb 11.27. E um verbo de sentido chulo em Lc 2.6 e 7. A Versão Trinitária em 1883
jamais é referida pelos eruditos, que a consideram destituída de valor crítico.
15.2.5
Trinitária Revisada
Circula em Portugal, há
algum tempo, uma edição revista da Trinitária, com a linguagem melhorada e
atualizada, de acordo com a reforma ortográfica oficializada pela Academia de
Ciências de Lisboa. Mas não melhorou o conteúdo, e foram alteradas certas
redações, inclusive de Lc 23.43, que agora está como as demais versões:
"na verdade te digo: hoje estarás comigo no Paraíso". E ainda
conserva boa parte dos cacófatos, e incorreções tradutórias. Os próprios
evangélicos brasileiros não a apreciam.
15.2.6 Traduções parciais da Bíblia no
Brasil
Nazaré. Em
1847 publicou-se, em São Luís
do Maranhão, O Novo Testamento traduzido por frei Joaquim de Nossa
Senhora de Nazaré, que se baseou na Vulgata. Este foi, portanto, o primeiro
texto bíblico traduzido no Brasil. Essa tradução tornou-se famosa por trazer em
seu prefácio pesadas acusações contra as “Bíblias protestantes”, que, segundo
os acusadores, estariam “falsificadas” e falavam “contra Jesus Cristo e contra
tudo quanto há de bom”. Em 1879,
a Sociedade de Literatura Religiosa e Moral do Rio de
Janeiro publicou a que ficou conhecida como “A Primeira Edição Brasileira” do
Novo Testamento de Almeida. Essa versão foi revista por José Manoel Garcia,
lente (professor de escola superior ou secundária) do Colégio D. Pedro II; pelo
pastor M. P. B. de Carvalhosa, de Campos, RJ, e pelo primeiro agente da
Sociedade Bíblica Americana no Brasil, pastor Alexandre Blackford, ministro do
Evangelho no Rio de Janeiro.
“Harpa de Israel” foi o
título que o notável hebraísta F. R. dos Santos Saraiva deu à sua tradução do Livro
dos Salmos, publicada em 1898.
Em 1909, o padre Santana
publicou sua tradução do Evangelho de Mateus, vertida diretamente do
grego. Três anos depois Basílio Teles publicou a tradução do Livro de Jó, com
sangrias poéticas. Em 1917 foi a vez de J. L. Assunção publicar O Novo
Testamento, tradução baseada na Vulgata Latina.
Traduzido do velho idioma
etíope por Esteves Pereira, O Livro de Amós surgiu isoladamente no
Brasil em 1917. Seis anos depois, J. Basílio Pereira publicou a tradução do Novo
Testamento e do Livro dos Salmos, ambos baseados na Vulgata. Por
essa época surgiu no Brasil (infelizmente, sem indicação de data) a Lei de
Moisés (O Pentateuco), edição bilíngüe hebraico-português, preparada pelo
rabino Meir Masiah Melamed.
O padre Huberto Rohden foi o
primeiro católico a traduzir no Brasil o Novo Testamento diretamente do
grego. Publicada pela instituição católico-romana Cruzada Boa Esperança, em
1930, essa tradução, por estar baseada em textos considerados inferiores,
sofreu severas críticas.
15.2.6.1 Traduções completas
Em 1902, as sociedades
bíblicas empenhadas na disseminação da Bíblia no Brasil patrocinaram nova
tradução da Bíblia para o português, baseada em manuscritos melhores que os
utilizados por Almeida. A comissão constituída para tal fim, composta de
eruditos nas línguas originais e no vernáculo, entre eles o gramático Eduardo
Carlos Pereira, fez uso de ortografia correta e vocabulário erudito. Publicado
em 1917, esse trabalho ficou conhecido como Tradução Brasileira. Apesar de
ainda hoje apreciadíssima por grande número de leitores, essa Bíblia não
conseguiu se firmar-se no gosto do grande público.
Coube ao padre Matos Soares
realizar a tradução mais popular da Bíblia entre os católicos na atualidade.
Publicada em 1930 e baseada na Vulgata, essa tradução possui notas entre
parêntesis defendendo os dogmas da Igreja Romana. Por esse motivo recebeu apoio
papal em 1932.
Em 1943, as Sociedades
Bíblicas Unidas encomendaram a um grupo de hebraístas, helenistas e
vernaculistas competentes uma revisão da tradução de Almeida. A comissão
melhorou a linguagem, a grafia de nomes próprios e o estilo da Bíblia de
Almeida.
Em 1948 organizou-se a
Sociedade Bíblica do Brasil, destinada a “Dar a Bíblia à Pátria”. Esta entidade
fez duas revisões no texto de Almeida, uma mais aprofundada, que deu origem à
Edição Revista e Atualizada no Brasil, e uma menos profunda, que conservou o
antigo nome “Corrigida”.
Em 1967, a Imprensa Bíblica
Brasileira, criada em 1940, publicou a sua Edição Revisada de Almeida, cotejada
com os textos em hebraico e grego. Essa edição foi posteriormente reeditada
com ligeiras modificações.
Mais recentemente, a
Sociedade Bíblica do Brasil traduziu e publicou a Bíblia na Linguagem de Hoje
(1988). O propósito básico desta tradução tem sido o de apresentar o texto
bíblico numa linguagem comum e corrente.
Em 1990, a Editora Vida
publicou a sua Edição Contemporânea da Bíblia traduzida por Almeida. Essa
edição eliminou arcaísmos e ambigüidades do texto quase tricentenário de
Almeida, e preservou, sempre que possível, as excelências do texto que lhe
serviu de base.
Enquanto a edição da Bíblia
Thompson estava sendo preparada, uma comissão constituída de eruditos em grego,
hebraico, aramaico e português, coordenada pelo São. Luiz Sayão, trabalhava em
uma nova tradução das Escrituras para a língua portuguesa, sob o patrocínio da
Sociedade Bíblica Internacional.
São, também, dignas de
referência: A Bíblia traduzida pelos monges de Meredsous (1959); A Bíblia de
Jerusalém, traduzida pela Escola Bíblica de Jerusalém (padres dominicanos), e
editada no Brasil por Edições Paulinas em 1981, com notas, e a Edição Integral
da Bíblia, trabalho de diversos tradutores sob a coordenação de Ludovico
Garmus, editado por Editora Vozes e pelo Círculo do Livro, também com notas.
16 - ERROS NO TEXTO, CRÍTICA TEXTUAL E TEXTO
RECEPTUS
16.1
Causas dos Erros na Transmissão do Texto Bíblico
Antes da invenção da
imprensa, no século XV, a transmissão de qualquer escrito, apenas poderia ser
feita copiando, pacientemente, à mão, palavra por palavra. Podemos imaginar
quantas probabilidades de erro tal método comporta. Experimente-se pedir a 20
pessoas que copiem determinado trecho, copiando sucessivamente, cada uma da
outra cópia, no final ficaremos estupefatos diante do resultado obtido. Nos
manuscritos tiravam-se cópias e apesar do estrito cuidado, as variantes logo
apareciam.
16.1.1
Erros Involuntários
16.1.1.1
Erros provenientes de uma visão deficiente
O escriba atingido por
astigmatismo, achava difícil distinguir as letras gregas que se pareciam,
especialmente se o copista anterior não escreveu com cuidado. Assim num
manuscrito uncial, onde o sigma era feito como sigma lunar, era fácil confundi-lo
com o épsilon, o teta e o ómicron C E Y O. Se dois lâmbdas fossem escritos
muito juntos poderiam ser tomados pela letra Mi, como aconteceu em Romanos 6.5,
em muitos manuscritos está A L L A (mas), noutros está AMA (juntos). Há
divergência em alguns manuscritos com a parte final de 1Co 12.13. A maioria
traz: "E a todos nós foi dado beber de um só Espírito"; contudo em
alguns aparece: "E a todos nós foi dado beber de uma bebida". Esta
variante surgiu quando alguns copistas leram erradamente IMA (a contração comum
da palavra INEYMA – espírito, como IIOMA (bebida).
16.1.1.2
Erros provenientes de igual terminação
Tecnicamente, este erro
chama-se homoioteleuton = final igual de duas linhas. Pelo fato de duas linhas
seguidas terminarem com a mesma palavra ou sílabas, os olhos do copista podiam
pular da primeira para a segunda, omitindo acidentalmente várias palavras.
Assim é explicada a curiosa tradução de João 17.15 no Códice Vaticano, onde não
aparecem as palavras aqui colocadas entre parênteses: "Não peço que os
tires do (mundo mas que os livres do) mal". Algumas vezes, os olhos do
escriba, apanhavam a mesma palavra ou grupo de palavras uma segunda vez e como
resultado copiava duas vezes, o que deveria ter feito apenas uma. Em Atos 19.34 a expressão: Grande é
a Diana dos efésios, aparece duas vezes do Códice Vaticano. Chama-se ditografia
a repetição daquilo que ocorre apenas uma vez e haplografia a falta da
repetição de uma letra ou palavra.
16.1.1.3
Erros provenientes de audição deficiente
Era comum ditarem ao copista
e ele escrever uma outra palavra parecida, como as nossas imersão e emersão,
despercebido e desapercebido, comprimento e cumprimento. Outro problema com o
ditado encontrava-se nas homônimas não homógrafas, como ilustram as palavras portuguesas:
sinto e cinto, incipiente e insipiente, cocho e coxo. A confusão entre épsilon
e eta, ômega e ómicron era muito comum em ditados. Um problema
desta natureza está em Romanos 5.1, onde a variante tenhamos se alterna com
temos, em grego ecwnen e econen. Dr. Benedito de Paula Bittencourt, em seu
trabalho pioneiro de Crítica Textual em Língua Portuguesa
fez a análise crítica deste versículo e a quem pedimos vênia para citar algumas
de suas conclusões.
Crítica externa –
Quantitativamente e qualitativamente as evidências externas parecem favorecer o
subjuntivo. No entanto, descoberta recente, a do fragmento do MS 0220, vem
suprir o que falta a P. 46, que começa em 5.17. Este manuscrito, cuja leitura é
dificultada pelo estado em que se encontra, parece indicar que o verbo está
escrito com ómicron e não com ômega, sendo, no caso, um indicativo e não
subjuntivo, como indicam os escribas primários do Sinaítico e Vaticano. Crítica
interna – Se a Teologia de Romanos e dos escritos paulinos como um todo for examinada,
poderá o crítico chegar a uma conclusão final, na qual os elementos já
compulsados das evidências externas darão sua colaboração conclusiva. O
indicativo dá idéia de algo ativo no presente, enquanto o subjuntivo é modo
exortativo e que traz em si a idéia de ação volitiva no tempo futuro. Há no
subjuntivo também a idéia de ordem, imperativa. O subjuntivo coloca o Apóstolo
exortando o homem justificado pela fé em Cristo a alcançar por seus esforços
sua paz com Deus. Mas, isto é contra o pensamento paulino. Para Paulo não há
necessidade de esforços humanos para alcançar paz com Deus, pois o homem é
incapaz de realizar sua própria salvação e mesmo manter sua paz. Cristo, e
somente Cristo, é seu Salvador e só Ele é capaz de reconciliar o homem com seu
Deus e lhe dar paz. Esta é a idéia do indicativo (O Novo Testamento, p.
199-200).
No grego Coinê os ditongos
oi, ui, e as simples vogais h, i, u não apresentavam diferença de pronúncia
soando todos como o nosso "i" resultando daí trocas entre hmeiv = nós
e umeiv = vós; eieroiv = outros e eiairoiv = companheiros (Mt 11.16). Em
Hebreus 4.11 o escriba do Códice Claromontano escreveu aletheias = verdade, por
apeitheias (desobediência) com resultados desastrosos para o sentido. A
declaração de Paulo de 1Co 15.54: "tragada foi a morte na vitória (nicós
em Grego)" está no papiro 46 e Códice B: "tragada foi a morte no
conflito (neicós)".
16.1.1.4
Erros de Memória
Estes erros surgiram porque
a memória falhava enquanto o copista olhava para o manuscrito e procurava
escrever o que lá se encontrava. Este tipo de erro explica a origem de um
grande número de mudanças, especialmente nos evangelhos sinóticos, envolvendo a
substituição de sinônimos, variação na ordem das palavras, troca de palavras
por influência de outra passagem paralela, talvez conhecida do escriba. A
substituição de sinônimos aparece em exemplos como: eipen por efe, ec por apó,
etc. Um exemplo de troca de palavras temos em Mt 19.16-17, onde alguns copistas
alteraram o relato para que este concordasse com Mc 10.17 e Lc 18.18. À
declaração de Cl 1.14 copistas acrescentaram em alguns manuscritos,
"através do seu sangue", por influência da passagem paralela de Ef
1.7.
16.1.1.5
Erros de Julgamento
Encontramos alguns erros que
apenas podem ser explicados por culpa de copistas pouco inteligentes ou
descuidados. Palavras ou notas explicativas, encontradas na margem, eram muitas
vezes, incorporadas ao texto do Novo Testamento. Ao copista encontrar na
margem, notas explicativas como sinônimos de palavras difíceis, correções,
comentários pessoais, ficava perplexo sem saber o que fazer com elas. Alguns
resolveram o problema da seguinte maneira – colocaram a nota no texto que
estavam copiando. Há manuscritos que trazem acrescentadas a Rm 8.1 as seguintes
palavras: "que não andam segundo a carne, mas segundo o espírito".
Esta era uma nota explicativa na margem do primeiro versículo, talvez tirada do
verso quatro.
Somente descuido em alto
grau pode justificar alguns absurdos perpetrados por escribas pouco perspicazes.
Talvez um dos piores desatinos cometidos por um escriba se encontra no
manuscrito 109 do século XIV. Este manuscrito, dos quatro evangelhos, agora no
Museu Britânico, foi transcrito de uma cópia que deve ter tido a genealogia de
Jesus era duas colunas de 28 linhas cada uma. Em vez de transcrever o texto
seguindo as colunas em sucessão, o escriba do 109 copiou a genealogia seguindo
as linhas através das duas colunas, surgindo como era de se esperar um
resultado desastroso. Quase todos os filhos estão com os pais trocados; Deus é
dado como filho de Adão e Fares é a fonte de toda a raça e não Deus.
16.1.2
Erros Intencionais
Por estranho que pareça, os
escribas que pensavam, eram mais perigosos do que aqueles que se limitavam a
copiar o que tinham diante de si. Muitas das alterações, que podem ser
classificadas como intencionais foram, sem dúvida, introduzidas de boa fé por
copistas que criam estar corrigindo erros ou infelicidades de linguagem, que se
haviam introduzido no texto sagrado e precisavam ser retificados. A despeito da
vigilância de eclesiásticos zelosos, alguns escribas, chocados com erros reais
ou imaginários, de ortografia, gramática e fatos históricos, deliberadamente,
introduziram mudanças no que estavam copiando.
16.1.2.1
Correções na Ortografia, Gramática e Estilo
O livro de Apocalipse, com
seus freqüentes semitismos e solecismos, apresentava muitas tentações aos
escribas ciosos da correção gramatical.
Para melhorar a sintaxe do
nominativo depois da proposição apó (Ap 1.4), eles inseriram tou, Qeou ou
Kurivon. O escriba culto era tentado a melhorar a linguagem.
16.1.2.2
Correções Harmonizadoras
Intencionalmente ou não,
procurando harmonizar passagens paralelas ou relatos idênticos, os copistas
alteravam algumas passagens bíblicas.
Os exemplos são muitos, mas
aqui serão apresentados somente dois: Em João 19.20 encontra-se a expressão –
Jesus Nazareno, o Rei dos Judeus, estava escrito em hebraico, latim e grego. Em
muitos manuscritos, os copistas acrescentaram no texto de Lucas 23.38, isto foi
escrito em hebraico, latim e grego; a forma mais curta da Oração do Senhor em
Lc 11.2-4 foi alterada, em muitas cópias, para concordar com a forma mais
familiar e mais longa encontrada em Mateus 6.9-13.
16.1.2.3
Acréscimo de Complementos Naturais e Semelhantes
A obra dos copistas na
amplificação e arremate das frases é evidente em muitas passagens.
Vários escribas, supondo que
algo estava faltando na declaração de Mt 9:13 "Pois não vim chamar os
justos, mas os pecadores", acrescentavam "ao arrependimento".
Outros copistas achavam difícil deixar a palavra escriba, sem acrescentar
fariseu, como aconteceu em Mt 27.41. Em Cl 1.23 há um interessante exemplo
ilustrando como os copistas não resistiram à tentação de realçar a dignidade do
Apóstolo Paulo. Neste verso Paulo diz que ele se tornou ministro do Evangelho,
em grego está "diácono". Sendo que a palavra grega
"diácono" significa, literalmente, aquele que serve, ministro, passou
a designar uma ordem inferior do ministério, isto é, aqueles que executam
trabalhos mais simples na Igreja; os copistas dos manuscritos alefe a e P
mudaram diáconos para querix e apóstolos, por acharem que estes títulos eram
mais apropriados ao grande Apóstolo dos Gentios. O manuscrito A traz os três
títulos para Paulo – arauto, apóstolo e ministro.
16.1.2.4
Esclarecimento de Dificuldades Históricas e Geográficas
A citação de Mc 1.2 é
introduzida pela fórmula "Como está escrito no profeta Isaías".
Acontece que a citação é proveniente dos profetas Isaías e Malaquias: Isaías
40.3 e Malaquias 3.1. Alguns escribas sentindo esta dificuldade substituíram a
expressão "no profeta Isaías" por "nos profetas". Sendo que
Mateus 27.9 atribui ao profeta Jeremias o que na realidade veio de Zacarias
11.12; não é de admirar que alguns copistas procurassem corrigir o erro,
substituindo o nome, ou omitindo-o. Alguns copistas, tentaram harmonizar o
relato da cronologia da paixão com a de Marcos, pela mudança da "hora
sexta" de João 19.14 para "terceira hora", que aparece em Marcos
15.25. Porque a declaração de Marcos 8.31 - "depois de três dias
ressuscitará", parece envolver um problema cronológico, alguns copistas a
alteraram para "ao terceiro dia".
16.1.2.5
Duplicidade de Textos
O que faria um escriba
consciencioso quando descobria que a mesma passagem fora dada diferentemente em
dois ou mais manuscritos que tinha diante de si? Em vez de fazer uma escolha
entre as duas variantes (com a probabilidade de omitir a genuína) muitos
incorporaram as duas na mesma cópia que estavam transcrevendo. Isto produziu a
chamada duplicidade de textos ou de leituras, característica predominante da
família bizantina. Os dois exemplos seguintes confirmam este fato: A declaração
de Lucas de que os discípulos estavam continuamente no templo bendizendo a
Deus, aparece em alguns manuscritos, "estavam continuamente no templo
orando a Deus". Não poucos copistas concluíram que era mais seguro
transcrever as duas declarações, aparecendo assim: "estavam continuamente
no templo orando e bendizendo a Deus". Atos 20.28 aparece em alguns
manuscritos como: "Igreja de Deus", e em outros: "Igreja do
Senhor". Vários manuscritos posteriores trazem "Igreja do Senhor e
Deus".
16.1.2.6
Alterações Feitas por Questões Doutrinárias
Estas alterações são
difíceis de serem avaliadas.
Irineu, Clemente de
Alexandria, Tertuliano, Eusébio e muitos outros Pais da Igreja acusaram os
heréticos de corromperem as Escrituras para apoiarem suas opiniões pessoais.
Por exemplo, Márcion tirou do Evangelho de Lucas todas as referências judaicas relacionadas
com Jesus. A Harmonia dos Evangelhos de Taciano traz várias alterações textuais
para apoiar suas opiniões ascéticas. Os manuscritos do Novo Testamento
preservam traços de duas espécies de alterações dogmáticas: as que envolvem
eliminação ou alteração do que era considerado doutrinariamente inaceitável ou
inconveniente e as que introduziram dentro das Escrituras "provas"
para uma prática ou um dogma teológico. Os exemplos são muitos, como podem ser
vistos em The Text
of the New Testament, página 202 e 203, mas destes apenas um será transcrito:
Escribas que não podiam harmonizar a declaração de Jesus de Mt 24.36 e Mc 13.32
"que Ele não sabia o dia da sua vinda", com a sua divindade, omitiam
a expressão: "nem o Filho".
16.1.2.7
Acréscimo de Pormenores:
Acréscimos feitos na margem
ou em notas no rodapé, uma vez ou outra eram introduzidos para o texto. Sempre
houve e ainda há grande curiosidade em saber o nome de alguns personagens que
aparecem anonimamente no texto bíblico. Como a tradição dava nomes a estas
pessoas, copistas eram tentados a colocá-los no texto que estavam copiando.
Velhos Manuscritos latinos apresentam os seguintes nomes para os dois ladrões
crucificados com Cristo: Zoatan, Camma, Magatras. Entre nós é comum ouvirmos
que o nome do bom ladrão era Dimas. O nome do homem rico de Lucas 16.19 aparece
na versão saídica como Níneve ou Ninivita, nome comum para ricos dissolutos
naquele tempo. Uma adição apócrifa num antigo manuscrito latino declara que
quando Jesus foi batizado uma tremenda luz brilhou da água atemorizando a todos
os que estavam presentes. Os títulos dos livros apresentam curiosidades dos
amanuenses. O mais original neste aspecto é o título que o copista do
manuscrito 1775 deu ao Apocalipse: "Apocalipse do todo glorioso evangelista,
amigo do peito de (Jesus), virgem, amado de Cristo, João – o teólogo, filho de
Salomé e Zebedeu, mas filho adotivo de Maria, a mãe de Deus, e filho do
trovão".
Conclusões
Todos os estudiosos dos
problemas dos copistas estão bem cientes de que o estudo comparativo de vários
textos é de grande ajuda para a eliminação destes erros. Estes erros têm sido
denominados de periféricos, porque não abrangem a essência dos ensinamentos
divinos. Quem sabe pessoas iniciantes ou despreparadas em "Crítica Textual"
pensem da seguinte maneira: este estudo não deveria ser apresentado, porque
pode levar pessoas a descrerem da Palavra de Deus e a concluírem que os
escribas eram descuidados, caprichosos e tendenciosos. Verdades e realidades
não podem e não devem ser escondidas.
Todos devem ter em mente
esta verdade fundamental: o que foi apresentado neste capítulo aconteceu com
alguns manuscritos e com poucos copistas, o que vem mostrar a fragilidade da
natureza humana. Existem muitas evidências mostrando o trabalho dedicado,
cuidadoso, honesto e fidelíssimo da maioria dos copistas, bem como abundante
messe de manuscritos não alterados, que nos levam a crer firmemente na
fidelidade da transmissão das Santas Escrituras. A Crítica Textual não abate os
fundamentos da nossa crença, antes os solidifica.
A palavra crítica origina-se
do verbo grego "krino" que significa julgar. A crítica textual tem
como primeiro objetivo conhecer a exatidão de um texto. Muitos dignos cristãos,
bem intencionados, mas mal esclarecidos têm protestado energicamente contra
qualquer aplicação da crítica textual à Bíblia. Para eles é simplesmente
absurda a idéia de aplicar a crítica em relação à Bíblia. Perguntam eles: Como
submeter a Palavra de Deus, obra do Espírito Santo, aos critérios humanos? Esta
simples frase resolveria todos os problemas: O texto original (ou melhor o
autógrafo) da Bíblia é totalmente isento de erros, mas não as cópias feitas por
copistas susceptíveis às falhas humanas. Até à invenção da imprensa, no século
XV, os manuscritos eram produzidos por copistas, que freqüentemente cometiam
erros de transcrição. Quando sabemos que os manuscritos eram recopiados uns dos
outros, sem ser possível a conferência com o texto original é fácil concluir, que
os erros tendiam a multiplicar-se nas cópias posteriores.
A finalidade essencial da
crítica textual é restabelecer em toda a sua pureza o texto como saiu das mãos
do autor, escoimando-o de erros dos copistas, tais como adições indevidas,
notas marginais que foram inseridas no texto ou correções tendenciosas visando
atenuar, ou torcer o sentido de uma frase, modificar o estilo, transformar o
pensamento de um escritor. Os que atacam a crítica textual demonstram o seu
despreparo nesta ciência. Para que o trabalho da crítica textual seja efetivo é
necessário em primeiro lugar possuir razoável conhecimento das línguas
bíblicas; seguindo-se um inventário tão completo quanto possível dos
manuscritos, como a sua classificação em famílias; a judiciosa aplicação dos
métodos da crítica textual, até chegar às causas primordiais dos erros na
transmissão do texto bíblico.
Entende-se por crítica
textual toda pesquisa científica em busca da verdadeira forma de um documento
escrito no original, ou, pelo menos, no texto mais próximo do original. No que
diz respeito aos autores dos últimos quatro séculos, depois da genial invenção
de Gutenberg, podemos estar certos de possuirmos suas obras exatamente como
foram escritas, salvo raras exceções, particularmente quanto a erros
tipográficos de menor importância. Já não se pode dizer o mesmo a respeito das
obras que circularam em manuscrito, antes da invenção da imprensa. Não é de
admirar que os escritos copiados múltiplas vezes, umas cuidadosamente, mas
outras sem maiores cuidados, e isto durante séculos, sofressem múltiplas e
variadas alterações. Isto constitui, nos diferentes documentos conhecidos da
mesma obra, o que se chama de variantes ou textos divergentes. E a crítica
textual, particularmente a do Novo Testamento, tem por objetivo a escolha do
texto, entre todos os encontrados nos vários manuscritos, que possua a maior
soma de probabilidades de ser o original ou a forma primitiva do autógrafo, já
que não possuímos nenhum dos autógrafos do Novo Testamento, mas apenas cópias e
algumas delas distantes mais de dois séculos do original. Esta busca científica
dos originais ou dos textos que lhes sejam mais próximos é de extrema
dificuldade, cheia de problemas de vasta complexidade. A regra geral nos leva a
concluir que, quanto mais distante dos autógrafos, tanto quanto ao tempo como
quanto ao número de cópias, maior a corrupção do texto, maior a soma de erros.
No entanto, esta regra não é absoluta. Há obras, e o Novo Testamento é deste
tipo, onde a matéria em si leva o copista a correções intencionais, e a
corrupção, neste caso, não estaria em função da distância que separa a cópia de
seu original, nem quanto ao número de cópias, nem mesmo quanto ao tempo, mas em
função direta e inequívoca a matéria a ser copiada. Entretanto, o maior número
de cópias torna os labores do crítico mais suaves, pois o pequeno número de
manuscritos conduz à probabilidade de perda, nalguns lugares, da verdade
original, que só pode ser alcançada mediante conjetura, processo deveras
precário. Dr. Benedito P. Bittencourt, já várias vezes citado,
inquestionavelmente, uma das maiores autoridades em crítica textual no Brasil,
assim escreveu no capítulo “A Tarefa da Crítica Textual”.
O Novo Testamento leva,
quanto ao tempo que separa os mais antigos manuscritos de seus originais,
grande vantagem sobre os clássicos. Possui o Novo Testamento cópias completas
dentro do quarto século. Há partes, como as do Papiro Chester Beatty, por
exemplo, que se situam na primeira metade do século terceiro e até mesmo no
último quartel do segundo, como o caso do Papiro de Bodmer. Há mesmo um
fragmento bem perto de seu autógrafo: é o fragmento de papiro P52, situado na
primeira metade do século segundo, e mesmo no seu primeiro quartel por alguns
paleógrafos, distando, assim, menos de cinqüenta anos de seu original, se
colocarmos o Evangelho de João, que P52 representa, na última década do
primeiro século. A tarefa do crítico é reagir contra os erros dos copistas.
Ninguém deve recear a tarefa, nem mesmo menosprezá-la, quando se pode afirmar,
com os entendidos do assunto, que não só os grandes manuscritos, mas também os
mais antigos papiros, atestam a integridade geral do texto sagrado. E, todavia,
a insofismável autoridade da Lagrange diz que entre esta pureza substancial e
um texto absolutamente igual aos originais há distância apreciável. Se nos
lembrarmos de que os manuscritos e citações diferem entre si entre 150.000 e
250.000 vezes e que um estudo só do Evangelho de Lucas revelou mais de 30.000
passagens diferentes e que, como afirma a autoridade de M. M. Parvis, "não
há uma só sentença do Novo Testamento na qual a tradição seja uniforme",
sentiremos a grandeza e a responsabilidade da tarefa. Há uma afirmação do mesmo
prof. Parvis, da Universidade de Chicago, que surge aos olhos do leigo como um
choque' tremendo e que só pode ser avaliada pelos estudiosos da matéria, que o
presente Autor não pode deixar de transcrever: "Até que esta tarefa esteja
completa, a incerteza a respeito do texto do Novo Testamento permanece".
Note-se, todavia, que a elevada cifra de variantes, em sua maioria esmagadora,
diz respeito a questões que não afetam o sentido profundo do texto e que o
número de variantes que se revestem de importância, especialmente no que diz
respeito à doutrina, é assaz reduzido. A tarefa da crítica textual do Novo
Testamento é, diz Kenyon, "o mais importante ramo da ciência". Ela
trata com um livro cuja importância é imensurável e vital, mais importante que
qualquer outro livro do mundo, pois o Novo Testamento é único, nem mesmo comparação
pode sofrer. É tarefa básica, pois dela dependem as outras ciências bíblicas. A
crítica textual lança os fundamentos sobre o qual a estrutura da investigação
espiritual deve ser construída. Sem um bom texto grego, tão mais próximo dos
autógrafos quanto lhe permitam os labores da crítica textual, não é possível
fazer segura exegese, hermenêutica, crítica histórica ou literária, nem mesmo
teologia, para não falarmos em tradução. Embora seja chamada de baixa critica e
bem modestos os seus esforços, é fundamental e indispensável ao estudante do
Novo Testamento, desde o tradutor até o teólogo. O crítico textual tem por
função, primeiro, a coleta do material documentário, que encontra no exame de
vários manuscritos, versões e noutro elemento muito precioso, ainda não
mencionado, as citações dos chamados Padres Apostólicos. Depois se entregará ao
exame crítico desse material, pela estima de seu vaiar. Para que ele possa
realizar bem sua primeira função é necessário que esteja familiarizado com o
material, terreno onde realiza suas investigações. Deve conhecer não só os
vários manuscritos, versões e citações dos antigos escritores da Igreja Cristã,
como também o modo pelo qual foram produzidos, os usos da escrita literária e
não literária do tempo, o material usado, o destino e o objetivo final dessa
mesma produção [...] Para que possa realizar a segunda parte, mais profunda,
mais difícil e que requer mente bem educada e de grande acuidade intelectual,
deve conhecer a própria história do texto, os métodos da crítica textual,
teologia do autor cujo livro se examina, a história das doutrinas, a língua
original, particularmente sua gramática, e um conhecimento cultural da época do
autor e dos escritos cujas cópias considera. Por estas ligeiras indicações o
leitor pode ver, não só a extensão, mas as implicações desta ciência. Isto para
não falarmos em paleografia, arqueologia, conhecimento dos clássicos, como quer
a escola alemã, pois se pressupõe este trabalho já realizado pelos respectivos
especialistas e colocado ao alcance do crítico textual através da
caracterização dos vários documentos (O Novo Testamento, Cânon – Língua –
Texto, pp. 71-75).
16.3
O Textus Receptus - Seus Defensores e Opositores
Recebe o nome de
"Textus Receptus" o texto grego que dominou, no campo do estudo do
Novo Testamento por mais de 300 anos. Este texto é também conhecido pelos nomes
de Texto Recebido ou Texto Grego Vulgarizado.
No início do século XVI dois
grandes eruditos – o Cardeal Ximenes e Erasmo – lançaram-se à ingente tarefa de
publicar o Novo Testamento em grego, procurando unificar os vários textos
gregos existentes.
Para a boa compreensão da
história do "Textus Receptus" é preciso partir do famoso editor
francês Roberto Estéfano (1503-1559), que publicou quatro edições do texto
grego. Sua terceira edição (1549) é o primeiro texto onde aparece um aparato
crítico. Foi esta edição que se tornou o modelo para a King James Version de
1611 e até o século XIX foi o paradigma de todos os textos gregos publicados. A
sua quarta edição (1551) não pode ser olvidada na história do texto bíblico,
porque pela primeira vez aparece a divisão em versos numerados. Embora a
expressão "Textus Receptus" se refira à terceira edição de Estéfano,
esta não foi usada por ele.
Outro nome intimamente ligado
com o "Textus Receptus" é o de Teodoro Beza (1519-1605), que entre
1565 e 1604 publicou nove textos bíblicos. O texto de Beza pouco difere da
quarta edição de Estéfano. A importância do seu trabalho consiste no seguinte:
suas edições visavam popularizar o "Textus Receptus". Os tradutores
de King James fizeram largo uso das edições de Beza. Em 1624, os irmãos
Elzevirs, impressores alemães, lançaram uma edição do Novo Testamento Grego, em
cujo texto predominava o de Estéfano, mas havia também um pouco do texto de
Beza. No prefácio da segunda edição se encontravam as seguintes palavras:
"No texto que é agora recebido por todos, não apresentamos nada mudado ou
alterado." A expressão "Textus Receptus" nasceu desta mesma
frase em latim: "Textum ergo habes, nunc ab omnibus receptum: in quo nihil
immutatum aut corruptum damus." Os autores desta simples frase jamais
sonhariam que ela fosse o início de uma grande contenda na história do texto
bíblico.
16.3.1
Edições Posteriores ao
"Textus Receptus" – Edições Críticas
O próximo estágio na
história da Crítica Textual do Novo Testamento é caracterizado por assíduos
esforços para reunir manuscritos gregos, versões e citações patrísticas, que
diferissem do "Textus Receptus". Por quase dois séculos, eruditos
rebuscaram as bibliotecas e museus da Europa e Oriente Médio, procurando provas
para o texto do Novo Testamento. Durante este período, estudiosos publicaram
Novos Testamentos baseados em melhores manuscritos, Brian Walton, que publicou
a grande Bíblia Poliglota (1657) baseada no exame de 16 manuscritos. John Mill,
também de Oxford, trabalhou 30 anos no preparo de sua edição de 1707,
baseando-se em manuscritos, versões e Pais da Igreja. Bentley, empregando em
vários lugares pessoas capazes para confrontarem manuscritos e versões, reuniu
material para uma definitiva edição que suplantasse o "Textus
Receptus", mas, infelizmente, por questões alheias à sua vontade, não
chegou a completar sua edição do Novo Testamento.
Entre os colaboradores de
Bentley estava J. J. Wettstein de Basiléia, que após quarenta anos de pesquisas
publicou em Amsterdam (1751) uma edição do Novo Testamento. Sua obra tem grande
valor até hoje, não apenas pelas notas marginais e os seus prolegômenos
(prefácio longo a uma obra científica), mas também pelo aparato crítico, onde
pela primeira vez os manuscritos unciais são indicados pelas letras maiúsculas
e os manuscritos minúsculos pelos números arábicos. Pertencem ainda a esta fase
Semler (1725-1791) e Bengel (1687-1752), que individualmente publicaram uma
edição do Novo Testamento Grego. Estes Novos Testamentos estavam baseados em
manuscritos diferentes daqueles que foram usados para o "Textus
Receptus". Contudo eles divergiram daquele texto e os apresentados por
eles poucas variantes apresentavam relacionadas com o texto consagrado.
16.3.2
Declínio do "Textus
Receptus"
O primeiro erudito a se opor
frontalmente ao "Textus Receptus" foi o alemão Karl Lachmann
(1793-1851). Seu objetivo ao editar o Novo Testamento não era reproduzir o texto
original, pois ele cria ser isso uma tarefa impossível, mas procurar
reconstruir o texto corrente no fim do IV século. Para isso usou manuscritos
unciais primitivos, versões latinas, a Vulgata de São Jerônimo e o testemunho
de alguns Pais da Igreja. Após cinco anos de trabalho, publicou em Berlim
(1831) uma edição do texto grego, com uma lista de passagens nas quais diferia
do texto dos irmãos Elzevirs. Por esta divergência foi duramente atacado. No
prefácio de sua segunda edição Lachmann atacou seus críticos por preferirem,
cegamente, um texto familiar, mas inferior, a um primitivo muito mais exato.
Seu valor está em chamar a atenção dos estudiosos para a conveniência de
aceitarem um texto superior e não se contentarem com aquele, tradicionalmente
conhecido e aceito por todos.
16.3.3
Constantino Tischendorf
Ninguém conseguiu fazer mais
pelo texto bíblico do que este autor. Quando estudava teologia, seu professor
de grego, Winer (autor de uma famosa gramática) despertou nele um desejo
profundo para pesquisar manuscritos antigos, a fim de reconstruir a mais
perfeita forma do Novo Testamento Grego. Com este objetivo em mente, dedicou-se
de corpo e alma a esta sublime tarefa, pois escrevendo à sua noiva ele
declarou: "Resolvi dedicar-me a uma tarefa sagrada – a luta para conseguir
a forma original do Novo Testamento”. Sem receio de contestação pode-se afirmar
que ninguém fez mais do que Tischendorf para restaurar o texto original grego.
Basta ter em mente que foi a pessoa que publicou mais manuscritos e produziu
mais edições críticas da Bíblia Grega.
Entre 1941 e 1842 ele
preparou oito edições do Novo Testamento Grego. A edição mais importante é a
oitava, publicada em dois volumes, acompanhada por um rico Aparato Crítico, no
qual Tischendorf reunia tudo sobre variantes textuais que ele ou seus
predecessores tinham achado em manuscritos, versões e Pais da Igreja. Em
virtude do grande esforço despendido, seu estado de saúde não lhe permitiu
continuar o trabalho, por isso sua obra foi completada por seu discípulo –
Gaspar Renê Gregory. O texto de sua oitava edição, de acordo com Nestle difere
da sétima em 3.572 lugares. Foi acusado de dar excessivo valor à evidência do
Códice Sinaítico, que ele tinha descoberto entre o lançamento da sétima e da
oitava edição. Tischendorf deixou de lado o "Textus Receptus", não
levando também em conta a classificação dos manuscritos em famílias.
16.3.4
Samuel Tregelles
Na Inglaterra, o intelectual
mais bem sucedido em afastar-se do "Textus Receptus" foi Samuel
Tregelles. Desde menino, demonstrando grande talento e curiosidade intelectual,
já fazia planos para uma nova edição crítica do Novo Testamento. No intervalo
de 1857 e 1872 publicou um texto grego equipado com o mais completo aparato de
variantes das versões que já aparecera. Dotado de extraordinária força de
vontade, Tregelles conseguiu vencer a pobreza, a oposição e a saúde precária,
apresentando notável trabalho no terreno da Crítica Textual. Sua dedicação ao
trabalho era um ato de adoração, pois no prefácio de sua obra declarou "na
crença total de que esta deve ser para o serviço de Deus e para ser útil à Sua
Igreja”.
16.3.5
Westcott e Hort
Estes dois intelectuais
ingleses, após um dedicado trabalho de 28 anos publicaram dois volumes: O Novo
Testamento no Original Grego com Introdução e Apêndice, onde os princípios
críticos seguidos por ele são minuciosamente expostos. Depois de exaustivas
pesquisas na procura de manuscritos antigos, os estudiosos desejaram
classificá-los em grupos, assim várias tentativas foram feitas, mas quase todas
infrutíferas quanto aos seus resultados. Coube a B. F. Westcott e F. J. A.
Hort, dois renomados professores da Universidade de Cambridge, a classificação
dos manuscritos do Novo Testamento em quatro famílias, por eles denominadas: Siríaca,
Ocidental, Alexandrina e Neutra.
Para eles a mais importante
destas famílias era a neutra, por estar mais próxima dos autógrafos e por
contar com os dois mais famosos códices unciais – Sinaítico e Vaticano. A
preferência de Westcott e Hort por esta família é partilhada por insignes
vultos da Crítica Textual, mas, estudos posteriores têm indicado que eles foram
otimistas demais quanto à pureza do texto neutro. Pode-se notar ainda que o
texto Alexandrino não é distinto do texto neutro, por isso, hoje, aparece como
Alexandrino.
16.3.6
A Defesa
do "Textus Receptus"
Os defensores deste
discutido texto tornaram-se tão fanáticos, que não admitiam que ele fosse
alterado ou melhorado. Aqueles que ousaram divergir foram tachados de
irreverentes e sacrílegos. Sendo que Westcott e Hort rejeitaram totalmente o
texto tradicional, suas idéias não foram bem aceitas pelos conservadores. Em
breve, intelectuais se levantaram como denodados paladinos do texto aceito por
todos durante 300 anos. Dentre esses defensores destacam-se Scrivener, Edward
Miller e John Burgon. O argumento principal destes estudiosos em defesa do
"Textus Receptus" era este: "Se as palavras da Escritura tinham
sido ditadas pela inspiração do Espírito Santo, Deus não teria permitido que
elas fossem corrompidas no decurso de sua transmissão." Os argumentos
apresentados em defesa do "texto recebido" não tiveram a ressonância
que eles esperavam e após a morte deles esta polêmica foi para sempre
encerrada.
16.4
Edições Gregas após
Westcott e Hort
16.4.1
Herman Von Soden: (1852-1913)
Graças ao apoio financeiro
da Sra. Elise Koenigs, Von Soden, professor em Berlim, pôde enviar muitos
estudantes que tinham sido treinados por ele para examinarem manuscritos nas
bibliotecas e museus da Europa e do Oriente Médio. Ele identificou três grupos
de manuscritos, designando-os pelas letras gregas K, H, I. Estas letras são
inicias das seguintes palavras: K de koinê – comum, H de Hesíquio e I de
Siríaco de W. H.; O H incluiria o Neutro e o Alexandrino de W. H., enquanto o I
eqüivaleria ao Ocidental dos dois professores da Universidade da Universidade
de Cambridge. Discordando da classificação dos manuscritos em unciais e
minúsculos e do agrupamento em famílias de W. H., idealizou nova classificação
que indicasse a idade, conteúdo e tipo de cada manuscrito. Por ser um trabalho
complexo, difícil de ser aceito na prática, redundou num grande desapontamento
para a Crítica Textual, por isso foi totalmente posto de lado. Como resultado
de suas pesquisas e de seus muitos auxiliares, Von Soden publicou a História do
Texto Bíblico em 2.203 páginas de seus prolegômenos. Este trabalho, resultado
de prolongada investigação e intensivo estudo, tem sido descrito como um
magnífico fracasso.
16.4.2
Bernard Weiss (1827-1918)
Enquanto professor de
Exegese Grega, em Berlim, editou o Novo Testamento em três volumes. Sendo um
profundo exegeta tratou com eficiência de problemas teológicos e literários do
texto do Novo Testamento. Seu trabalho se caracteriza pela valorização das
evidências internas, discordando assim de Westcott e Hort, que se apoiavam em
evidências externas, concordando, porém, com eles em classificar o manuscrito
Vaticano como o melhor. Weiss discorda também dos defensores da teoria
genealógica na classificação dos manuscritos bíblicos.
16.4.3
Eberhard Nestle (1851-1913)
A edição do Novo Testamento
Grego mais amplamente usada, foi preparada por Nestle, através da Sociedade
Bíblica de Stutgart (1898). Seu texto é baseado em uma comparação dos textos
editados por Tischendorf, Westcott e Hort e Weiss. A obra de Nestle representa
o aperfeiçoamento do texto do fim do século XIX. Sendo notável pela síntese
maravilhosa do Aparato Crítico e pela precisão da grande soma de informações
textuais, sua edição tem sido muito apreciada. Uma nova edição do Novo
Testamento Grego de Nestle foi planejada, quando a Sociedade Bíblica Britânica
comemorou seu sesquicentenário (1954). O texto foi preparado por Kilpatrick,
com a ajuda de Erwin Nestle e Kurt Aland (Londres – 1958). Houve mudanças numas
20 passagens e diversas alterações na ortografia, acentuação e no uso de
parênteses.
16.5
Nova Edição para os Tradutores da Bíblia
Em 1966, após uma década de
trabalho por uma Comissão Internacional, cinco Sociedades Bíblicas publicaram
uma edição do Novo Testamento Grego com a finalidade de ser usada pelos
tradutores da Bíblia.
As edições do Novo
Testamento Grego, aqui apresentadas, são as mais importantes, mas o seu número
exato desde 1514 até nossos dias é difícil de ser avaliado. Bruce, cuja
autoridade em problemas de crítica textual ninguém discute, calcula que mais de
mil edições já apareceram.
Apêndice
|
|
O
Valor religioso da Bíblia. Bíblia é, sem dúvida, um dos mais
apreciados legados literários da humanidade. Contudo o seu valor não se firma
de maneira substancial no fato literário. A riqueza da Bíblia consiste no
caráter essencialmente religioso da sua mensagem, que a transforma no livro
sagrado por excelência, tanto para o povo de Israel quanto para a Igreja
cristã. Nessa coleção de livros, a Lei se apresenta como uma ordenação divina
(Êx 20; Sl 119), os Profetas têm a consciência de serem portadores de mensagens
da parte de Deus
(Is 6; Jr 1.2; Ez 2-3) o os Escritos ensinam que a verdadeira sabedoria
encontra em Deus a sua origem (Pv 8.22-31).
Esses valores religiosos
aparecem não só no título de Sagradas Escrituras, mas também na forma que Jesus
e, em geral, os autores do Novo Testamento se referem ao Antigo, isto é, aos
textos bíblicos escritos em épocas precedentes. Isso ocorre, por exemplo,
quando lemos que Deus fala por meio dos profetas ou por meio de algum dos
outros livros (Mt 1.22; 2.15; Rm 1.2; 1Co 9.9) ou quando os profetas aparecem
como aquelas pessoas mediante as quais “se diz” algo ou “se anuncia” algum
acontecimento, forma hebraica de expressar que é o próprio Deus quem diz ou
anuncia (Mt 2.17; 3.3; 4.14); também quando se afirma a permanente autoridade
das Escrituras (Mt 5.17-18; Jo 10.35; At 23.5), ou quando as relaciona
especialmente com a ação do Espírito Santo (At 1.16; 28.25). Formas magistrais
de expressar a convicção comum a todos os cristãos em relação ao valor das
Escrituras são encontradas em passagens como 2Tm 3.15-17 e 2Pe 1.19-21.
A Igreja cristã, desde as
suas origens, tem descoberto na mensagem do evangelho o mesmo valor da palavra
de Deus e a mesma autoridade do Antigo Testamento (Mc 16.15-16; Lc 1.1-4; Jo
20.31; 1Ts 2.13), Por isso, em 2 Pe 3.16, se equiparam as epístolas de “nosso
amado irmão Paulo” (v.15) às “demais Escrituras”. Gradativamente, a partir do
século II d.C., foram sendo reconhecidos os 27 livros que formam o Novo
Testamento a sua categoria de livros sagrados e, em conseqüência, a plenitude
da sua autoridade definitiva e o seu valor religioso.
Tal reconhecimento, que implica
o próprio tempo da presença, direção e inspiração do Espírito Santo na formação
das Escrituras, não descarta, em absoluto, a atividade física e criativa das
pessoas que redigiram os textos. Elas mesmas se referem a essa atividade em
diversas ocasiões (Ec 1.13; Lc 1.1-4; 1Co 15.1-3,11; Gl 6.11). A presença de
numerosos autores materiais é, precisamente, a causa da extraordinária riqueza
de línguas, estilos, gêneros literários, conceitos culturais o reflexões
teológicas que caracterizam a Bíblia.
A
natureza da Palavra de Deus. A expressão “a palavra de Deus”
(também “a palavra do Senhor”, ou simplesmente “a palavra”) possui várias
aplicações na Bíblia. Obviamente, refere-se, em primeiro lugar, a tudo quanto
Deus tem falado diretamente. Quando Deus falou a Adão e Eva (Gn 2.16,17; Gn
3.9-19), o que Ele lhes disse era, de fato, a palavra de Deus. De modo
semelhante, Ele se dirigiu a Abraão (Gn 12.1-3), a Isaque (Gn 26.1-5), a Jacó
(Gn 28.13-15) e a Moisés (Êx 3–4). Deus também falou à totalidade da nação de
Israel, no monte Sinai, ao proclamar-lhe os dez mandamentos (Êx 20.1-19). As
palavras que os israelitas ouviram eram palavras de Deus.
Além da fala direta, Deus
ainda falou através dos profetas. Quando eles se dirigiam ao povo de Deus,
assim introduziam as suas declarações: “Assim diz o Senhor”, ou “Veio a mim a
palavra do Senhor”. Quando, portanto, os israelitas ouviam as palavras do
profeta, ouviam, na verdade, a palavra de Deus.
A mesma coisa pode ser dita
a respeito do que os apóstolos falaram no Novo Testamento. Embora não
introduzissem suas palavras com a expressão “assim diz o Senhor”, o que falavam
e proclamavam era, verdadeiramente, a palavra de Deus. O sermão de Paulo ao
povo de Antioquia da Pisídia (At 13.14-41), por exemplo, criou tamanha comoção
que, “no sábado seguinte, ajuntou-se quase toda a cidade a ouvir a palavra de
Deus” (At 13.44). O próprio Paulo assegurou aos Tessalonicenses que, “havendo
recebido de nós a palavra da pregação de Deus, a recebestes, não como palavra
de homens, mas (segundo é, na verdade) como palavra de Deus” (1Ts 2.13; At
8.25).
Além disso, tudo quanto
Jesus falava era palavra de Deus, pois Ele, antes de tudo, é Deus (Jo 1.1,18;
10.30; 1Jo 5.20). Lucas, escritor do terceiro evangelho, declara explicitamente
que, quando as pessoas ouviam a Jesus, ouviam na verdade a palavra de Deus (Lc
5.1). Note como, em contraste com os profetas do AT, Jesus introduzia seus
ditos: Eu “vos digo...” (Mt 5.18,20,22,23,32,39; 11.22,24; Mc 9.1; 10.15; Lc
10.12; 12.4; Jo 5.19; 6.26; 8.34). Noutras palavras, Ele tinha dentro de si
mesmo a autoridade divina para falar a palavra de Deus. É tão importante ouvir
as palavras de Jesus, pois “quem ouve a minha palavra e crê naquele que me
enviou tem a vida eterna e não entrará em condenação” (Jo 5.24). Jesus, na
realidade, está tão estreitamente identificado com a palavra de Deus que é
chamado “o Verbo” [“a Palavra”] (Jo 1.1,14; 1Jo 1.1; Ap 19.13-16; Jo 1.1). A
palavra de Deus é o registro do que os profetas, apóstolos e Jesus falaram,
isto é, a própria Bíblia. No Novo Testamento, quer um escritor usasse a
expressão “Moisés disse”, “Davi disse”, “o Espírito Santo diz”, ou “Deus diz”,
nenhuma diferença fazia (At 3.22; Rm 10.5,19; Hb 3.7; 4.7); pois o que estava
escrito na Bíblia era, sem dúvida alguma, a palavra de Deus. Mesmo não estando
no mesmo nível das Escrituras, a proclamação feita pelos autênticos pregadores
ou profetas, na igreja de hoje, pode ser chamada a palavra de Deus. Pedro
indicou que, a palavra que seus leitores recebiam mediante a pregação, era
palavra de Deus (1Pe 1.25), e Paulo mandou Timóteo “pregar a Palavra” (2Tm
4.2). A pregação, porém, não pode existir independentemente da Palavra de Deus.
Na realidade, o teste para se determinar se a palavra de Deus está sendo
proclamada num sermão, ou mensagem, é se ela corresponde exatamente à Palavra
de Deus escrita.
O que se diz de uma pessoa
que recebe uma profecia, ou revelação, no âmbito do culto de adoração (1Co
14.26-32)? Ela está recebendo, ou não, a palavra de Deus? A resposta é um
“sim”. Paulo assevera que semelhantes mensagens estão sujeitas à avaliação por
outros profetas. Todavia, há a possibilidade de tais profecias não serem
palavra de Deus (1Co 14.29 “E falem dois ou três profetas, e os outros
julguem”).
É somente em sentido
secundário que os profetas, hoje, falam sob a inspiração do Espírito Santo; sua
revelação jamais deve ser elevada à categoria da inerrância (1Co 14.3).
O
Poder da Palavra de Deus. A palavra de Deus permanece firme nos
céus (Sl 119.89; Is 40.8; 1Pe 1.24,25). Não é, porém, estática; é A mesma coisa
pode ser dita a respeito do que os apóstolos falaram no Novo Testamento. Embora
não introduzissem suas palavras com a expressão “assim diz o Senhor”, o que
falavam e proclamavam era, verdadeiramente, a palavra de Deus. O sermão de
Paulo ao povo de Antioquia da Pisídia (At 13.14-41), por exemplo, criou tamanha
comoção que, “no sábado seguinte, ajuntou-se quase toda a cidade a ouvir a
palavra de Deus” (At 13.44). O próprio Paulo assegurou aos Tessalonicenses que,
“havendo recebido de nós a palavra da pregação de Deus, a recebestes, não como
palavra de homens, mas (segundo é, na verdade) como palavra de Deus” (1Ts 2.13;
At 8.25).
Além disso, tudo quanto
Jesus falava era palavra de Deus, pois Ele, antes de tudo, é Deus (Jo 1.1,18;
10.30; 1Jo 5.20). Lucas, escritor do terceiro evangelho, declara explicitamente
que, quando as pessoas ouviam a Jesus, ouviam na verdade a palavra de Deus (Lc
5.1). Note como, em contraste com os profetas do Antigo Testamento, Jesus introduzia
seus ditos: Eu “vos digo...” (Mt 5.18,20,22,23,32,39; 11.22,24; Mc 9.1; 10.15;
Lc 10.12; 12.4; Jo 5.19; 6.26; 8.34). Noutras palavras, Ele tinha dentro de si
mesmo a autoridade divina para falar a palavra de Deus. É tão importante ouvir
as palavras de Jesus, pois “quem ouve a minha palavra e crê naquele que me
enviou tem a vida eterna e não entrará em condenação” (Jo 5.24). Jesus, na
realidade, está tão estreitamente identificado com a palavra de Deus que é
chamado “o Verbo” [“a Palavra”] (Jo 1.1,14; 1Jo 1.1; Ap 19.13-16; Jo 1.1). A
palavra de Deus é o registro do que os profetas, apóstolos e Jesus falaram,
isto é, a própria Bíblia. No Novo Testamento, quer um escritor usasse a
expressão “Moisés disse”, “Davi disse”, “o Espírito Santo diz”, ou “Deus diz”,
nenhuma diferença fazia da palavra de Deus.
A palavra de Deus é a arma
que o Senhor nos proveu para lutarmos contra Satanás (Ef 6.17; Ap 19.13-15).
Jesus derrotou Satanás, pois fazia uso da Palavra de Deus: “Está escrito”
(“consta como a Palavra infalível de Deus”; Lc 4.1-11; Mt 4.1-11).
Finalmente, a palavra de
Deus tem o poder de nos julgar. Os profetas do Antigo Testamento e os apóstolos do Novo Testamento freqüentemente pronunciavam palavras de juízo
recebidas do Senhor. O próprio Jesus assegurou que a sua palavra condenará os
que o rejeitarem (Jo 12.48). E o autor aos Hebreus escreve que a poderosa
palavra de Deus julga “os pensamentos e intenções do coração” (Hb 4.12).
Noutras palavras: os que optam por desconsiderar a palavra de Deus acabarão por
experimentá-la como palavra de condenação.
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